Opinião
A “morte” do titular
É interessante comparar a dimensão do Governo português com outros, particularmente com a estrutura do Governo dos Países Baixos.
Causou surpresa a eliminação das pastas de ministro ou secretário de Estado para a investigação e ensino superior. Todavia, a primeira (maior?) surpresa surgiu da dimensão do atual Governo.
O primeiro Governo de António Costa começou com 59 membros (1 primeiro-ministro, 17 ministros e 41 secretários de estado) e acabou com 56 (1 primeiro-ministro, 15 ministros e 40 secretários de estado). Depois de 4 anos de experiência e com os ministros provavelmente já fatigados passou-se ao desdobramento de pastas alcançando-se o recorde de um Governo em Portugal composto por 70 membros (1 primeiro-ministro, 19 ministros e 50 secretários de estado)! Um ano e meio depois esse número estava reduzido a 68 e depois, com uma maioria absoluta, sem necessidade de tanta negociação, António Costa decidiu, finalmente, “secar” o elenco governativo para uns elegantes 58 membros, dos quais chegariam apenas 56 em funções, em abril deste ano.
É interessante comparar a dimensão do Governo português com outros, particularmente com a estrutura do Governo dos Países Baixos. Para 18 milhões de neerlandeses eles precisam de 29 elementos: 1 primeiro-ministro, 20 ministros e 8 secretários de Estado. Nós, para 10 milhões de portugueses precisamos no mínimo do dobro porque Luís Montenegro, desaproveitando a redução de pastas de António Costa, fez regredir o número passando de 56 para 59.
Por isso mesmo, quando olhamos para este crescimento, é legítimo perguntar quais as alterações e a sua justificação.
Uma das pastas que se perdeu foi a da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior independente do ministério da Educação e que contava com o secretário de estado do ensino superior. Como se costuma dizer, quando um manda num, um dos dois está a mais... Porém, aqui sempre se podia argumentar que o ensino superior ficaria sob a tutela do secretário de estado puxando a ministra, Elvira Fortunato, para si, os assuntos da investigação.
No atual Governo, o ministério da Educação avocou toda a respetiva área e conta com três secretarias de estado, uma delas dedicada à ciência e investigação, mas nenhuma ao ensino superior. Significa isto que o ensino superior ficará pior, desprotegido e sem apoio?
À crítica, o Professor Fernando Alexandre respondeu que essa pasta lhe compete e que o seu conhecimento do sistema e até da gestão conquistada pela sua experiência superam a austeridade na contagem dos lugares, o que é bem verdade. Porém, há reuniões de secretários de estado em que não estando presente poderá deixar mais desprotegido este ramo da responsabilidade governativa. Tendo isto em atenção, a chamada da pasta à responsabilidade do ministro não parece, à partida, errada e permitirá que à frente dos seus destinos esteja alguém que acumula uma carreira que acaba por trazer um perfil que não é fácil de obter em Portugal: conhece o ensino superior sendo seu docente, tem uma carreira de investigação que lhe permite avaliar o que está em causa, tem trabalhos empíricos aplicados à economia portuguesa e à decisão económica e acumula ainda uma experiência política por já ter desempenhado as funções de secretário de estado. Neste sentido, parece mais capacitado em termos de diversidade, do que a anterior ministra que apareceu com um perfil muito ligado exclusivamente à investigação. Mas será que isso vai ser suficiente para tomar as decisões que são necessárias? Terá o peso político e a liberdade para se impor às finanças na captação dos fundos ou na reestruturação do ensino? E o ensino secundário dar-lhe-á tempo e paz para se dedicar ao ensino superior?
A esperança é última coisa a morrer e este Governo está ainda a começar. Das ideias de Montenegro sobre o ensino superior durante a campanha eleitoral brotou muita esperança e arrojo. Veremos se o consegue, de modo a levar Portugal a aproveitar a formação superior para o desenvolvimento económico e social que desejamos.