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Manuel Falcão - Jornalista 04 de Novembro de 2011 às 12:26

A esquina do Rio

Em relação à questão europeia o bom senso mandaria que existisse uma estratégia alternativa, um plano B.

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Alternativa
Em relação à questão europeia o bom senso mandaria que existisse uma estratégia alternativa, um plano B. A evolução mais recente mostra que o futuro é completamente imprevisível e o risco de Portugal ser apanhado numa onda de choque que reveja todo o funcionamento da Zona Euro é elevado. Persistir em colocar todos os ovos no euro é uma operação política bem comportada, mas com pouca tradução prática se as coisas correrem mal. Fico verdadeiramente inquieto quando, no nível máximo das responsabilidades, parece não existir ninguém a estudar o que fazer no caso de sermos forçados a sair da Zona Euro. No início do alargamento da Comunidade Europeia, o então chanceler Helmut Kohl sublinhou que a integração europeia asseguraria o futuro da Alemanha. Como todos sabemos, foi nesse sentido que a Alemanha trabalhou todos estes anos e o resultado está à vista. Prudentemente devemos estudar e analisar os cenários possíveis e preparar planos alternativos. É básico em situação de crise encontrar um recuo. Lamento dizer que não vislumbro quem o esteja a preparar.


Desnorte
Uma das coisas mais inquietantes dos últimos meses é sentir que muitas medidas são improvisadas, fruto de voluntarismo, de um desejo de querer mostrar que podemos ser cumpridores. Alguns ministros propõem medidas e avançam com decisões exactamente com o mesmo espírito com que um ilusionista tira coelhos da cartola. É um golpe de mágica que resulta bem no momento, mas ninguém a seguir se preocupa com o que acontece aos coelhos nem com o que ficou no fundo da cartola. Eu quero crer que os ministros ilusionistas são bem intencionados, mas também sei que é preciso começar a mostrar que nem tudo resulta de um passe de mágica. É que os passes de mágica não resolvem os problemas, apenas nos distraem momentaneamente.

O resultado desta forma de agir é que são anunciadas coisas que depois não se concretizam, provoca-se um desgaste na opinião pública, as medidas penalizadoras são lançadas a conta-gotas, como chicotadas diárias que se repetem em cima de feridas abertas. A teimosia é má conselheira e adiar a correcção dos erros é um disparate de custos elevados. Não conseguir comunicar de forma eficaz é um problema deste Governo - sempre à defensiva, sempre a justificar, sempre a anunciar medidas penosas, sem conseguir criar esperança nem optimismo - e sem isto não há mobilização, há apenas terreno para a oposição.


Ouvir
Se gostam de bandas sonoras de filmes hão-de recordar-se da música de "Goodbye Lenin!" ou de "O Fabuloso Destino de Amélie Poulain". Yann Tiersen, um compositor francês, é o autor de ambas. Traçam-lhe influências de Erik Satie, mas também de Philip Glass ou de Michael Nyman.
Tem colaborado com nomes como Jane Birkin, Stuart Staples (Tindersticks) ou Elisabeth Frazer (Cocteau Twins). "Skyline", o seu novo disco, o sétimo, explora novas sonoridades, na senda do que acontecera com o seu disco do ano passado, "Dust Lane", mas em "Skyline" destaca-se o trabalho de misturas realizado por Ken Thomas, que participou em projectos de Sigur Ros e David Bowie. Yann Tiersen gosta de navegar no experimentalismo, explorando sonoridades e utilizando, de forma muito própria, o timbre da voz. Os arranjos são muito sensoriais, o disco é envolvente e canções como "Monuments" ou "Hesitation Wound" ficam marcadas logo à primeira audição. CD Mute, na FNAC.


Ler
Os romances policiais contam histórias da resolução de mistérios, baseados em conflitos que envolvem pessoas - por isso são fascinantes, porque nos ajudam a ver a sociedade através de um filtro que não faz parte das nossas rotinas. "Ela Cantava Fados" é a história da investigação da morte de uma fadista, Maria de Lurdes, investigação feita pelo detective Manuel da Rosa, personagem habitual dos policiais de Fernando Sobral (Declaração de interesse: Fernando Sobral escreve nestas páginas e é um dos meus grandes amigos). Amizades à parte, o livro é um retrato da Lisboa contemporânea - entre o novo fado que se tornou moda, a crise que toca em todo o lado e tudo aquilo que contribui para a cidade se ter tornado numa placa giratória onde se cruzam negócios e interesses de diversas proveniências e onde a legalidade nem sempre é uma coisa importante. Quando o detective Manuel da Rosa, confesso adepto de "rock", começa a querer conhecer mais do fado, o dono de um café de fadistices faz-lhe o resumo da existência portuguesa: "Sabe, a miséria do presente pode ser salva pelas lembranças do passado ou por uma glória que o futuro há-de trazer. O futuro morreu quando deixámos de olhar para o mar. Sepultámos os nossos sonhos lá. Morremos quando pensámos que a Europa era o nosso destino. E agora falta-nos sangue nas veias". O livro cruza a investigação com a observação: "o poder não nasce da força, nasce das cumplicidades" - recorda uma apoiante de um político em ascensão. E, noutro momento do livro, um intermediário de interesses volta-se para o detective e diz-lhe: "Isto não é um país. É uma loja de porcelana. Parte-se à mínima contrariedade". O livro é recheado destes momentos, observações certeiras sobre o estado da nação em geral e de uma Lisboa onde o crime dá pouco castigo e o poder vive entre os dois. O final? Não conto - descubram o mistério, mas sempre vos digo qual é a última frase do livro: "Só há derrotas quando elas se aceitam". Nada podia ser mais actual.


Arco da velha
Na sequência da greve dos guardas prisionais, durante a qual se verificaram vários incidentes nas cadeias, o presidente do respectivo sindicato comentou o sucedido dizendo que "os presos reconheceram os motivos da nossa greve".


Semanada
Na sua coluna semanal no DN, Vasco Graça Moura sintetizou o momento: "Quando a Europa puxa o autoclismo, a independência e a soberania de Portugal vão pelo cano abaixo"; João Ferreira do Amaral chamou a atenção para o facto de estarem a ser anunciadas medidas sem que tenha sido feito um estudo do impacto que terão; notáveis do PS apelaram ao voto contra o orçamento, por acaso depois de Sócrates ter desmentido andar a pressionar tomadas de posição nesse sentido; o Governo não reagiu a apelos de insubordinação nas Forças Armadas; todos os dias 13 famílias abrem falência.


Provar
O Hotel da Estrela funciona como prova prática e centro de estágio da Escola de Hotelaria de Lisboa. O Hotel era o Palácio dos Condes de Paraty e a Escola funciona no edifício da antiga Escola Machado de Castro, e paredes meias com o histórico Pedro Nunes. O Hotel é pequeno (19 quartos) e inclui um restaurante - tudo foi recuperado de acordo com um projecto de interiores de Miguel Câncio Martins, que aproveitou o ambiente de uma escola antiga - dos quadros de ardósia até mesas ou mesmo cabides. O resultado é simples, confortável e despretensioso. A curiosidade é que em todo o Hotel e Restaurante trabalham alunos da Escola, em diversas fases de aprendizagem. Na cozinha isso também acontece, mas a mão vigilante do "chef" Luís Casinhas vela pela qualidade da ementa. Aberto há menos de um ano e apresentado como um restaurante de bairro, a ementa é diversificada e tem uma redacção bem humorada. O serviço é, às vezes, hesitante mas muito simpático e sente-se um verdadeiro esforço dos alunos em procurarem satisfazer os clientes. O polvo grelhado com batata doce (que se afirma como o prato mais vendido) e o salmão com sésamo e puré de chouriço estiveram muito bem. Ficou a curiosidade pelo "borreguinho que se desfaz na boca" e o cachaço de porco preto confitado com legumes no forno. Resta dizer que o preço é decidido pelos clientes - a lista indica para cada prato um valor mínimo e outro máximo e o cliente deve colocar o que pretende pagar em função da qualidade e do serviço. A escolha de vinhos é razoável, mas os preços deviam ser mais comedidos. A impressão geral é boa e ficou a vontade de voltar. É prudente marcar - a casa já tem fama. Telefone 21 190 01 00.




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