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As finanças são solução para os desafios da sustentabilidade

A mais impressionante evolução dos últimos 15 anos no setor financeiro é a massiva adoção de preocupações e critérios de sustentabilidade nas decisões de investimento e na criação de produtos financeiros

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Está na moda atacar o sistema financeiro e as suas instituições e acusá-las de atingirem lucros excessivos. Um exemplo é a reação de alguns políticos aos lucros que a banca anunciou em 2023. Esse discurso ignora o papel fundamental que os sistemas financeiros têm nas economias desenvolvidas, incluindo a portuguesa.

O sistema financeiro é para a economia como o sistema circulatório é para os seres humanos - um sistema essencial que leva a todas as células o oxigénio e nutrientes necessários à vida. O sistema financeiro traz recursos e competências onde são necessários na economia, permitindo novos investimentos e realocação de atividades, resultado das decisões de milhares de organizações e milhões de agentes económicos, que respondem aos sinais e incentivos que recebem. Uma família que gera poupanças e as aplica em Certificados de Aforro permite ao Estado financiar-se e realizar mais investimentos públicos. Se canaliza as poupanças para um depósito bancário, esse banco pode conceder mais crédito a uma empresa ou particular. Os investidores reagem aos sinais e informação que recebem e aplicam os seus recursos financeiros em setores com forte potencial de crescimento, por responderem às necessidades da sociedade. A inteligência artificial, por exemplo, é um dos setores que está a receber muito novo investimento. Ou, não tendo conhecimentos especializados, os investidores colocam os seus recursos em fundos geridos por agentes especializados que os investem de forma profissional com os critérios de risco e horizonte temporal desejados. Em setores com menos potencial de crescimento, os investidores não apostam, ou então apostam nas empresas que estão a inovar e transformar esses setores. Dessa forma as economias ajustam-se mais rapidamente a mudanças estruturais e de contexto.

Naturalmente que os sistemas financeiros precisam de sólida regulação, dada a complexidade dos instrumentos financeiros, a importância da confiança, a fluidez do capital e a consequente rapidez das decisões, a qual não tem paralelo com o mundo físico. É por isso que um banco mal gerido pode falir em poucos dias ou a ação de uma empresa pode valorizar 100% numa semana sem que quase nada no mundo físico se tenha alterado. Felizmente, a regulação financeira tem-se tornado muito mais rigorosa, em particular no setor bancário europeu, e em particular desde a crise financeira de 2008. Hoje em dia, os bancos em Portugal estão bem capitalizados e a gerar lucros, o que são boas notícias para a saúde da economia e para a robustez das instituições face a crises imprevistas.

A mais impressionante evolução dos últimos 15 anos no setor financeiro é a massiva adoção de preocupações e critérios de sustentabilidade nas decisões de investimento e na criação de produtos financeiros. O sistema financeiro está em profunda transformação e será um veículo fundamental para vencermos os desafios da sustentabilidade.

Uma das transformações é o surgimento na última década de investidores e fundos especializados em financiar a inovação com impactos positivos diretos na sociedade em termos de sustentabilidade e inclusão. É o setor de investimento de impacto, segmento que complementa o capital de risco e a filantropia, financiando as soluções inovadoras nas áreas da educação, saúde, ambiente e inclusão social, propostas por empreendedores sociais. Hoje são milhares de milhões de euros que procuram as melhores startups de impacto, financiando a otimização e validação das suas inovações e o seu crescimento.

Nalguns casos, a perspetiva de retorno financeiro é inferior àquela que é a média do mercado devido aos fins sociais do projeto (que muitas vezes envolve trabalhar com públicos e clientes de menor capacidade económica ou em risco de exclusão social). Mas os investidores e os empreendedores estão alinhados nesses propósitos, partilham riscos de forma mais aberta e aceitam retornos mais baixos.

No mesmo período, o tema do investimento sustentável tornou-se um importante segmento do setor financeiro, pela vontade de muitos investidores em terem retornos financeiros alinhados com o impacto na sociedade, procurando apostar em empresas que demonstrem um forte compromisso com o ESG - preocupações ambientais, de impacto social e com boa governança. Hoje em dia, cerca de 1/3 de todos os ativos sob gestão profissional no mundo, cerca de 30 triliões de dólares, são afetos a investimentos que seguem critérios ESG, o que tem levado a uma grande evolução nos modelos de medição de impacto e uma adoção crescente destes critérios de sustentabilidade.

Um dos maiores desafios é a transição energética para um mundo com menores emissões de carbono. O crescimento fortíssimo das energias renováveis em todo o mundo só tem sido possível pelo papel que o setor financeiro tem no financiamento maciço de projetos e ativos de energia renovável. Através do setor da Cleantech, dos financiamentos verdes e de modelos de "project finance" com contratos rigorosos e tarifas garantidas é possível desenvolver projetos com um custo de capital mais baixo.

Por outro lado há um conjunto grande de desafios para os quais a inovação em instrumentos financeiros específicos é fundamental. Um exemplo popular desde os anos 80 a nível mundial foi o desenvolvimento do microcrédito como novo segmento formal do setor bancário, que contribuiu para a geração de autoempregos e criação de pequenos negócios, sendo um canal importante de inclusão financeira.

Os empréstimos para a compra de habitação foram outra inovação extraordinária que historicamente permitiu a muitas famílias comprarem a sua habitação, investindo num ativo de valorização segura no longo prazo e do qual podiam usufruir. Agora poderão ser necessárias outras inovações financeiras, devidamente reguladas, que permitam à população melhorar a rendibilidade das suas poupanças ou dar liquidez ao valor que está na sua habitação própria, como modelos de hipotecas invertidas. Dado que os cidadãos vivem até cada vez mais tarde, poderão não ter poupanças para viver com conforto e apoio na saúde, e poderão ter que libertar liquidez do principal ativo que têm que é a habitação.

Finalmente temos também o financiamento de inovações em políticas públicas, através de instrumentos como os títulos de impacto social, que permitem o investimento em projetos em áreas de intervenção de política pública, como a saúde, educação e o apoio social, com um modelo de pagamento pelos resultados do projeto ou iniciativa, modelo inovador, promovido pela Portugal Inovação Social.

Na Católica Lisbon, acreditamos no poder das finanças como instrumento essencial para a sustentabilidade e querermos contribuir para acelerar essa transformação. Assim, a Católica Lisbon em parceria com o Banco e Fundação Santander vai lançar este mês o Center for Sustainable Finance, um centro de investigação, formação e transferência de tecnologia que irá potenciar a interação entre o sistema financeiro e os desafios da sustentabilidade. Com um foco inicial na transição energética e adaptação às mudanças climáticas, o Centro vai-se também focar na literacia ESG e nos desafios da sustentabilidade das pensões, temas-chave para o bem-estar futuro das empresas e dos cidadãos.
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