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Perplexidades da Bolsa portuguesa

A implosão do BES foi um dos eventos mais tristes da bolsa, com milhares de pequenos acionistas a ficarem sem o que investiram.

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Continuo a ter um carinho especial pela Bolsa portuguesa e fico muito contente por a ver de novo a ganhar força, com os touros a dominarem. A esmagadora maioria dos meus artigos incide sobre ela e julgo que faço a minha parte para a visibilidade do nosso mercado e para cativar algum interesse por ele. No entanto, há uma série de situações que me deixam perplexo, indignado e que em nada ajudam a Bolsa portuguesa a credibilizar-se.

A implosão do BES foi um dos acontecimentos mais tristes da Bolsa portuguesa, com milhares de pequenos acionistas a ficarem sem tudo o que investiram. Foi um acontecimento quase dramático mas a história não termina ali. Apesar de o BES ter sido alvo de resolução, as ações ainda não foram extintas porque o processo de insolvência ainda está em curso. Aqueles pequenos investidores que apenas têm ações do BES em carteira, estão a pagar a comissão de guarda de títulos que, na maior parte dos Bancos, varia entre 30 e 50 euros por ano. É verdade que há uma ou outra exceção entre os Bancos para isentarem dessa comissão aqueles que apenas detêm ações do BES, mas a maioria dos pequenos investidores continua a pagar para deter em carteira ações que valem zero e que, salvo qualquer milagre mais improvável do que ganhar o Euromilhões, continuarão a valer zero. Os pequenos investidores nesta situação revoltam-se, indignam-se e duvido que alguma vez quererão ouvir falar de novo em Bolsa.

Os investidores continuam a ouvir todos os dias partidos que apoiam o Governo falar na reprivatização dos CTT. Curiosamente, nunca ouvi ninguém referir qual o preço a pagar para que isso aconteça. Se alguém disser que está a pensar lançar uma OPA sobre uma empresa, rapidamente a CMVM (e bem) questiona essa pessoa se isso vai acontecer e a que preço. Os políticos parecem viver num mundo só deles em que podem dizer o que querem, influenciando a cotação diária de uma ação sem prestar quaisquer esclarecimentos. A menos que quem sugere a reprivatização dos CTT acha que estamos na Venezuela e se nacionaliza a empresa a troco de uma mão cheia de nada.

Bolsa é uma palavra tabu para os políticos portugueses que estão no poder. Alguns dos partidos que apoiam o atual Governo veem o mercado de capitais como um demónio e quem investe na Bolsa portuguesa quase que é visto como um especulador a cometer o mais terrível dos pecados. Por isso, quando o Governo refere uma série de indicadores sobre a economia portuguesa, nunca se refere à Bolsa portuguesa. Porque a comparação com o resto da Europa não tem sido favorável e porque sabe que não têm sido tomadas quais medidas relevantes para revitalizar o mercado de capitais e estimular a que novas empresas acedam ao nosso mercado acionista. Faz-me confusão que não se entenda a importância que a Bolsa pode ter na Economia de um país. Em qualquer país desenvolvido, o desempenho do seu mercado acionista é sempre um indicador importante e entra na discussão político-económica.

Qual é o maior símbolo de uma Bolsa e que todos os dias é referenciado na Comunicação Social? O seu principal índice. O PSI-20, em teoria, é composto pelas 20 maiores ações da Bolsa portuguesa mas, neste momento, é constituído por apenas 18. Há mais de 3 anos escrevi um artigo sobre a bizarria de tal situação e, na altura, a entidade responsável dizia que era uma situação temporária. O tempo passou e 20 ações nem vê-las. Se acham que não faz sentido colocar no PSI-20 ações com uma liquidez muito baixa, que se tenha a coragem de mudar o nome de PSI-20 para "PSIqualquer coisa". Assim não.

O que há anos vai acontecendo ao Montepio é um processo no qual os incidentes se acumulam, em que se foi sempre tentando varrer o lixo para baixo do tapete. A dada altura, inclusivamente, houve a tentativa de fazer da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa a salvadora, investindo 200 milhões mas, felizmente, alguém teve bom senso de colocar um travão nesta ideia louca, fazendo com que a Santa Casa apenas investisse 75 mil euros, quase um valor simbólico. Incidentes, acidentes, enganos, omissões sucedem-se em todo este processo, sem final à vista. As audiências parlamentares que agora são pedidas são apenas mais um passo num caminho em que, infelizmente, há um enorme risco de tudo uma vez mais terminar com os contribuintes a pagarem a fatura de demasiados anos a assobiar-se para o lado.

Quando é que os responsáveis das empresas em Portugal sempre que cancela uma OPV em curso deixam de dizer que se deve às difíceis condições do mercado? Ainda recentemente tal aconteceu com a Science4you e com Sonae Modelo Continente. As OPVs falharam porque o mercado considerou que os preços pedidos eram altos. Dizer que a culpa é das difíceis condições do mercado é não querer admitir que, se não pedissem tanto dinheiro, as condições do mercado já seriam perfeitas.

Há muito para mudar na Bolsa portuguesa e na forma como quem decide olha para ela. Apesar dos seus defeitos, do número limitado de ações e de outros constrangimentos, continuo a escrever sobre ela e a mostrar que é possível ganhar dinheiro no mercado acionista português. Mas sonho com o dia em que ela vai começar a ser mais bem tratada, como ponto importante de desenvolvimento da economia portuguesa e não apenas como se fosse um parque de diversões.


Nem Ulisses Pereira, nem os seus clientes, nem a DIF Brokers detêm posição sobre os activos analisados. Deve ser consultado o disclaimer integral aqui


Analista Dif Brokers
ulisses.pereira@difbroker.com

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