Opinião
"Meu-Teu-Nosso": a ascensão da mobilidade partilhada
A economia de partilha tem vindo a estabelecer-se como um elemento relevante nos mercados em que surge, introduzindo um factor de disrupção face aos modelos de negócio dos "players" instalados.
Dos cinco segmentos em que a oferta de partilha está a liderar a mudança - bens, serviços, alojamento, instrumentos financeiros e mobilidade - esta última ganha relevância acrescida por uma dupla razão: por um lado é a que regista maior crescimento porque constrói inovação sobre uma infra-estrutura existente e desenvolvida; por outro, é neste domínio que os "players" instalados mais acompanham a mudança e nela querem tomar parte.
Entre os vários mercados em ascensão neste segmento, há um em particular que se tem distinguido, fruto da convergência de motivações geradas por desafios e tendências na vertente individual/pessoal: com mais de 600 sistemas em operação a nível global (e uma média superior a 1.000 bicicletas por cada um), a que acresce a expectativa de crescimento de 20/ano até 2020, o fenómeno de "bike sharing" tem atraído adeptos, utilizadores e investimento.
No seguimento da "Mobility Convention", organizada pela Roland Berger em Colónia em Novembro passado e em que a mobilidade urbana surgiu como tema forte, levámos a cabo um estudo alargado sobre sistemas de "bike sharing", tendo identificado um conjunto de melhores práticas na sua implementação e que reunimos em seis factores-chave de sucesso:
1) Utilização - a adesão inicial ao serviço será largamente impactada pela simplicidade do processo de compra de início ao fim - este deverá ser possível em várias plataformas (física e "mobile"), sem necessidade de registo prévio (mas sugerem-se benefícios para utilizadores registados) e permitir o pagamento com vários meios (numerário, cartões de débito, crédito, passe, etc.);
2) Qualidade de serviço - a qualidade das bicicletas deverá conjugar a facilidade de uso e o conforto - que permitirão uma boa experiência de consumo, incentivando a repetição e promovendo a reputação do serviço para crescer a procura - com a redução dos custos de manutenção - que afectam directamente a rentabilidade da operação se elevados e indirectamente a reputação e procura se forem descurados;
3) Apoio das autoridades locais - ciclovias, ligações a outros meios de transporte público, o licenciamento rápido de "estações", a disponibilidade de infra-estrutura (electricidade, comunicações, etc.), a deslocalização de estações para responder a picos de procura (estações móveis) são, entre outras, necessidades do sistema em que o apoio das autoridades locais facilitará o sucesso da iniciativa;
4) Tarifário - deve ser considerado um tarifário reduzido (possivelmente com tempo oferecido ou horários especiais) e estrategicamente definido para promover simultaneamente a aceitação e uso iniciais e a procura no longo prazo;
5) Densidade da rede - a acessibilidade do serviço é crítica, pelo que é necessária uma rede de "estações" extensa e concentrada e um número de bicicletas elevado para assegurar cobertura adequada;
5) Integração multimodal - para atribuir ao sistema um carácter utilitário e não meramente turístico, exige-se complementaridade com outros meios de transporte, situando "estações" ao longo das rotas destes. A possibilidade de utilização do sistema em conjunto com outros disponíveis (nos bilhetes e passes) pode e deve ser explorada;
Oportunidade em Portugal
O potencial de sistemas de "bike sharing" em Portugal está patente nas já mais de 20 iniciativas em fase de implementação de norte a sul do país.
Lisboa será porventura a cidade onde a oportunidade de mercado é mais relevante, não só pela densidade populacional (útil neste modelo de negócio), mas também pela provável maior utilidade percebida do serviço, particularmente na vertente turística - Lisboa tem excelentes condições naturais (p.e. eixo ribeirinho) para tornar um sistema de "bike sharing" um serviço de valor acrescentado na oferta da cidade para visitantes.
Posteriormente, poderá o modelo de negócio implementado ser alargado para abranger também um aspecto de transporte público, complementando a malha da capital com maior flexibilidade em curtas distâncias. Neste caso sai reforçada a necessidade de conjugação de uma mobilidade mais ecológica com a utilidade e propósito do modelo de "bike sharing", potencialmente explorando a sustentabilidade de um sistema eléctrico.
Roland Berger Strategy Consultants