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04 de Dezembro de 2014 às 20:00

A tempestade institucional perfeita

Era uma vez um mundo no qual as pessoas se dividiam entre aquelas que acreditavam que as coisas seriam melhores se as empresas fossem deixadas em liberdade e as outras que consideravam que a existência seria mais completa se o Estado estivesse no coração da organização da sociedade.

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Esse mundo concetual está hoje em ruínas e infelizmente não parece haver outro que o substitua.

 

A falência moral do capitalismo

 

No Expresso, Miguel Sousa Tavares escolheu este título para explicar a degradação do capitalismo como livre empresa balizada por regras morais e códigos de conduta auto-impostos. A organização da sociedade em torno da ideia da livre empresa implica preocupações com os resultados mas também com a maneira como os resultados são obtidos. Ou seja, não basta obter lucros, é necessário obtê-los de maneira defensável e moralmente correta. Por isso, é mais honroso perder na competição do mercado de forma honrosa do que ganhar de forma imoral. Se a honra e a virtude são ingredientes essenciais da sociedade capitalista, a sucessão de escândalos em Portugal, e por todo o mundo, mostra a face feia do sistema. Corrupção, perda da honradez, foco no ganho de uma forma cúpida, narcisismo gestionário, eis alguns dos ingredientes que levaram a ideia de capitalismo ao chão. A existência, no outro lado do espectro, de sindicatos politicamente capturados também não ajuda à revitalização do sistema.  

 

A falência moral do Estado

 

Mas as coisas não estão melhores para aqueles que acreditam que os problemas do capitalismo, e nomeadamente os seus excessos e contradições, se resolvem com maior regulação e intervenção estatal. Os Estados, em Portugal e na Europa, entraram em deliquescência. A honradez dos políticos é posta em causa com excessiva frequência. A corrupção é insuportável, como se tem visto repetidamente. O sistema fiscal adquire contornos autoritários, gerindo os cidadãos com base no medo, um traço distintamente ditatorial. Os responsáveis europeus mostram diferentes pesos e medidas, como no caso Lux Leaks com toda a sua carga de hipocrisia institucional agravada pela passagem de Juncker para o topo da nomenclatura europeia. O Norte aprofunda os preconceitos contra o Sul, como revelado nas insistências de Angela Merkel em relação às deficiências de Portugal. Numa ideia: o Estado já não oferece confiança a ninguém.

 

A tempestade perfeita

 

Enfrentamos portanto uma tempestade institucional perfeita. Face à dimensão da tormenta, a ausência de alternativas torna-se angustiante. De onde virá a solução? Não se sabe, mas espera-se que de dentro do sistema. Poder-se-á dizer que o capitalismo é o pior sistema excluindo  todos os outros. Mas a falta de confiança nas instituições, qualquer que seja a geometria do equilíbrio, arrisca-se a criar o caldo sociológico perfeito para a emergência de um carismático personalizado – como Marinho Pinto gostaria de ser – daqueles que vêm salvar o mundo até o fazerem em cacos, ou de uma ditadura institucional nascida no interior de alguma corporação. A única razão para ter esperança é a crença na capacidade de revitalização do capitalismo schumpeteriano face à adversidade. Confiemos, mas façamos o que tem de ser feito para a confiança não ser apenas um castelo no ar.    

 

 

Professor na Nova School of Business and Economics

 

Este artigo está em conformidade com o novo Acordo Ortográfico.

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