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Opinião
11 de Junho de 2023 às 21:30

"Pedro Nuno Santos será o próximo líder do PS. Tenho sérias dúvidas que chegue a primeiro-ministro"

No seu espaço de opinião habitual na SIC, o comentador Marques Mendes fala sobre o custo de vida, os juros dos bancos, o 10 de Junho, o regresso de Pedro Nuno Santos, entre outros temas.

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O CUSTO DE VIDA

  1. O discurso de que a macroeconomia vai bem faz-nos esquecer os dramas do custo de vida para milhares de Portugueses. E eles não são pequenos. Vejamos:
  • Uma recente sondagem da Intercampus mostra que os portugueses se sentem pior, que tiveram de fazer cortes nas suas despesas e que têm baixas esperanças quanto ao seu futuro:
  • O Cabaz Alimentar da DECO Proteste, com 63 produtos, é certo que teve entre janeiro e junho uma redução de 1,2%. Mas desde o início da guerra o aumento é de 20,9%. E este é o valor que conta quando as pessoas vão às compras.
  • No plano dos medicamentos, um recente estudo científico de Pedro Pita Barros, da Universidade Nova," Acesso a Cuidados de Saúde", mostra que 50% das famílias com rendimentos até 800 Euros, não conseguem comprar os medicamentos de que precisam. Em 2019 eram apenas 10%. Um agravamento quase arrepiante.
  • No quadro do crédito à habitação, continuamos a ter juros mais altos do que os praticados na média da Zona Euro e mais altos que a maioria dos países europeus.
  1. Já agora, no domínio do arrendamento, uma boa e uma má notícia. A má é que os dramas sociais aumentam. A boa é que o Governo, por causa disso, resolveu reforçar os apoios: antes eram apenas 200 milhões de euros para subsídios de renda. Agora são 240 milhões. O objetivo passou a ser apoiar 186 mil famílias em dificuldades.

 

OS JUROS DOS BANCOS

  1. Passou relativamente ao lado da informação em Portugal o ranking atualizado dos juros dos depósitos na Zona Euro:
  • Primeiro, o país que pratica juros de depósitos mais altos já não é a França. É a Itália e os juros já são superiores a 3%.
  • Segundo, Portugal já não é o segundo país com juros mais baixos. Agora é o terceiro pior. Atrás de nós estão a Eslovénia e Chipre.
  • Terceiro, a banca nacional tem um juro médio que é equivalente a 1/3 da Itália e que é menos de metade da média praticada na Zona Euro.
  1. O que surpreende não é este continuado afastamento de Portugal da média da Zona Euro. Afinal, os bancos portugueses têm excesso de liquidez e agora até deixaram de ter a "pressão" dos certificados de aforro.
  • O que surpreende é a falta de um discurso firme das autoridades portuguesas – Governo e Banco de Portugal – perante os bancos. A situação é legal, mas é imoral. Os bancos portugueses pagam aos seus depositantes, em média, um juro de 1%. E depois recebem dos depósitos que fazem no BCE, três vezes mais: cerca de 3%. Não é justo.
  • Ao menos, era exigível que subissem os juros cá dentro para um valor equivalente ao que se pratica, em média, na Zona Euro.


O ESTADO DA SAÚDE

  1. O Director Executivo do SNS completou seis meses de mandato, deu uma entrevista ao Expresso e anunciou algumas orientações importantes. Desde logo, o não encerramento de blocos de partos.
  1. Em qualquer caso, há três situações que continuam a ser especialmente delicados para a atratividade do SNS: os salários dos médicos; a emigração de enfermeiros; e o envelhecimento dos profissionais de saúde.
  • Segundo o recente estudo "Recursos Humanos em Saúde, 2022", da autoria de Pedro Pitta Barros, os profissionais de saúde tiveram perdas brutais do poder de compra dos salários entre 2011 e 2022 – os médicos tiveram uma perda de 18%; e os enfermeiros tiveram uma perda de 3%. Entretanto, no mesmo período de tempo, os trabalhadores em geral tinham um ganho de 6%.
  • Segundo o mesmo relatório, a emigração de enfermeiros é um caso sério: saíram de Portugal, de 2011 até 2022, 25 mil enfermeiros (à média de 2.000 por ano), prioritariamente para o Reino Unido (55%), França e Suíça. Os salários são a causa principal da emigração.
  • Ainda segundo este estudo, há um conjunto grande de especialidades em que os médicos, com mais de 65 anos, estão próximos da reforma, o que pode suscitar problemas sérios. Entre as 8 especialidades mais "envelhecidas" estão a estomatologia, a cirurgia cardiotorácica, a cirurgia geral ou a cirurgia pediátrica, exemplo de áreas onde a falta de profissionais se tornará num pesadelo.
  • Nada disto deve suscitar pânico. Mas requer uma especial atenção.

 

A INSATISFAÇÃO DOS PORTUGUESES

  1. Uma sondagem da SIC e do Expresso mostra que os portugueses estão brutalmente insatisfeitos com o estado da nação. É um retrato preocupante. Mas não é assim tão surpreendente.
  • Primeiro, por uma razão cultural. O país tem uma grande tendência para este tipo de pessimismos e desconfianças. Basta reler Eça de Queirós e a descrição que ele fazia de Portugal há 150 anos.
  • Depois, por uma razão política. Há 20 anos que Portugal vive em crise. Crise financeira, crise económica, crise social, crise da inflação. Se uma sondagem destas fosse feita entre 1985 e 2000, com o país em alta, os resultados seriam provavelmente muito diferentes.
  • Terceiro, por uma razão estrutural: falta de ambição. Há vários anos que Portugal é um país sem ambição. Por isso, temos crescimentos medíocres e estamos todos os anos a caminho da cauda da Europa. Falta ambição no Governo, na oposição, nos partidos, nas instituições. Esta falta de ambição tinha que ter reflexos no espírito dos portugueses.
  1. Além destas razões mais de fundo, há uma outra que contribui para agravar a má disposição dos portugueses – a conjuntura política. Uma sondagem é ela própria e as suas circunstâncias. Ora, as circunstâncias do país nos últimos meses são muito deprimentes: uma imagem pública de desleixo e de degradação no exercício do poder; a perceção pública de que o Governo já tem poucas condições para governar; e a sensação de que a oposição ainda não tem condições para ser governo. Os Portugueses sentem-se bloqueados.

 

10 DE JUNHO

  1. O PR faz sempre bons discursos, quer no 25 de Abril, quer no 10 de Junho. Este não foi exceção. Foi um excelente discurso. Tem três partes: uma, mais estratégica, a puxar pela alma e pelas ambições da nação. Uma segunda, mais conjuntural, que parece a resposta ao cismo que a sondagem da SIC representa: "queremos mais riqueza e melhor distribuição da riqueza". Uma última, mais enigmática: "é preciso cortar os ramos mortos da árvore". É um pedido de remodelação? A insistência na saída de Galamba? Provavelmente, sim. O problema maior é outro: infelizmente, os bons discursos não têm seguimento em bons resultados. Não é um problema do PR. Mas é um problema do País.

  1. O Ministro João Galamba foi alvo de apupos. Nada que surpreenda. É o Ministro mais impopular. Um ativo tóxico. E um problema sério para o PM: se António Costa o tira do Governo nos próximos tempos, dá o dito pelo não dito e dá ao PR a vitória que lhe negou há um mês; se não o tira, continua com um peso morto no Governo. O PM meteu-se numa alhada e agora é preso por ter cão e preso por não ter.

 

  1. Entretanto, o PM, viu-se confrontado com manifestações de professores. Nada de estranhar. Estranha, sim, lamentável e censurável, foi a forma que alguns professores usaram nos cartazes para criticar António Costa, equiparando-o a um "animal". É de muito mau gosto. Pode discordar-se do PM; criticá-lo até com violência; mas impõe-se respeito. O que alguns professores fizeram é quase insultuoso. Subscrevo as suas reivindicações. Mas não estas formas de luta. Elas, além do mais, só desprestigiam a classe docente. De professores, a quem entregamos a educação dos nossos filhos e netos, exigem-se bons exemplos. Nunca más referências como estas.

 

O REGRESSO DE PEDRO NUNO

  1. Do ponto de vista dos seus interesses políticos, Pedro Nuno Santos regressou bem. A sua intervenção no Parlamento foi um passeio:
  • Primeiro, porque ele conseguiu exibir as suas maiores qualidades e evitar um dos seus maiores defeitos. As suas maiores qualidades são o carisma e a determinação. Ele "puxou" por elas. Um dos seus maiores defeitos é a tendência para um tom algo colérico e excitado. Ele evitou-o, com uma prestação serena e tranquila.
  • Depois, porque não teve oposição. Em especial do PSD. O Partido já deve estar a pensar: antes um PS mais à esquerda liderado por Pedro Nuno Santos que um PS mais ao centro dirigido por António Costa.
  • De qualquer modo, Pedro Nuno Santos ganharia se evitasse também o auto-elogio. Desde logo sobre os lucros da TAP e da CP. Se a TAP, com quase 3 mil milhões de euros do Estado e grandes cortes salarias, não tinha lucro, quando é que havia de ter? E o mesmo se diga da CP. Se não fosse o Estado transferir vários milhares de milhões, ao abrigo do contrato de serviço público, haveria prejuízos e não lucro, como no passado.
  1. Claro que a audição da próxima semana é mais difícil. Mas também é verdade que ele teve mais do que tempo para a preparar. Uma coisa para mim continua clara: ao contrário de muita gente, que já prognosticou a sua morte política, eu continuo a achar que Pedro Nuno Santos será o próximo líder do PS; tenho é sérias dúvidas que consiga chegar a Primeiro-Ministro.
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