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12 de Janeiro de 2020 às 20:59

Marques Mendes: “Rio tem tudo para ganhar” as eleições

As habituais notas da semana de Marques Mendes, no seu espaço de comentário na SIC. O comentador fala sobre o conflito EUA/Irão, as eleições no PSD e o debate do Orçamento, entre outros temas.

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CONFLITO EUA/IRÃO

 

Do rescaldo deste conflito, há algumas conclusões a tirar:

 

  1. Primeira: ambas as partes agiram para consumo interno. Trump mandou matar o general iraniano para reforçar a sua popularidade e desviar atenções do impeachment. O Irão retaliou, mas sem matar ninguém, apenas para salvar a face perante a sua população e com o propósito de não agravar a situação. A verdade, porém, é que desta vez Trump saiu-se melhor. O Irão não sai humilhado mas sai maltratado.

 

  1. Segunda: os riscos absolutamente inaceitáveis destes conflitos. Trump matou um general. O Irão retaliou. No quadro da retaliação, um míssil disparado por engano desfez um avião civil e quase 200 inocentes morrerem. Agora, imagine-se que este erro humano era com arma nuclear! O desastre seria descomunal.

 

  1. Terceira: com a queda do avião civil, o Irão fica temporariamente mais frágil e mais limitado. Mas, atenção: a questão de fundo permanece. O Irão mantém a sua ambição nuclear. Deu agora um passo atrás para dar dois à frente, mais tarde. Daí o acerto da estratégia que em 2015 deu origem à assinatura do Acordo Nuclear entre o Ocidente e o Irão. Daí a necessidade de refazer o acordo ou de negociar um novo acordo.

 

  1. Finalmente, houve um desanuviamento. Uma inversão da escalada. Mas a situação continua vulnerável. E convém não esquecer que, naquele "barril de pólvora" que é o Médio Oriente, a UE tem, no Iraque, muitos militares. Só Portugal tem 35.

 

DEBATE DO ORÇAMENTO

 

Retiro cinco conclusões deste debate:

 

  1. Primeira: uma vitória com sabor a derrota. O OE foi aprovado, mas apenas com os votos a favor de um partido, o PS. Ao contrário dos últimos 4 orçamentos que tinham sido aprovados por 4 partidos. A geringonça oficial acabou e a geringonça oficiosa está quase a acabar.

 

  1. Segunda: ineficácia da oposição. A oposição passou ao lado deste debate. Não foi capaz de apresentar uma alternativa consistente e credível. É que para se ser credível não basta criticar. É preciso dizer como se faria de diferente.

 

  1. Terceira: acabou o papão Passos Coelho. Este é o primeiro grande debate político em que a esquerda já não fala da herança PSD/CDS. Agora as críticas são todas a António Costa. Isto é uma mudança de paradigma. O actual Governo de António Costa é comparado com o primeiro Governo de António Costa.

 

  1. Quarta: esta é provavelmente a última vez que PCP e BE viabilizam orçamentos do PS. Daqui a um ano é pouco provável que o façam. Daqui a dois anos é praticamente impossível. PCP e BE, mais mês, menos mês, serão oposição clara ao Governo. Não é de estranhar que o OE para 2021 seja viabilizado pelo PSD.

 

  1. Quinta: na relação com os seus ex-parceiros, ficaram agora ainda mais claras as prioridades do PM: o PCP é o parceiro privilegiado. O BE é menosprezado. O sonho de o Bloco ir para o Governo, na era António Costa, não passou disso mesmo – um sonho. Um sonho que, com este PM, dificilmente será concretizado.

 

 

ABERTURA DO ANO JUDICIAL

 

  1. Tivemos esta semana a cerimónia de abertura do ano judicial. O que dizer?
  2. Primeiro: esta cerimónia é uma completa inutilidade. Já era tempo de acabar com ela ou de a reformular profundamente.
  3. Segundo: tal como existe, esta sessão é uma espécie de passa-culpas: os operadores da justiça aliviam as consciências, queixando-se todos os anos dos políticos porque não lhes dão meios e instrumentos legais de actuação; os políticos, por sua vez, queixam-se da lentidão da justiça, dando a entender que a culpa é dos operadores judiciários.
  4. Terceiro: os cidadãos, estupefactos, perguntam: por que é que eles, em vez de passarem uma tarde a mandarem recados uns aos outros, não se reúnem à volta de uma mesa para tentarem encontrar soluções para os problemas que existem na justiça?

 

  1. Dois exemplos concretos:
  2. Tribunais Administrativos e Fiscais – Os processos demoram uma eternidade. Um cidadão que litigue contra o Fisco é um desgraçado. Perde tudo – perde dinheiro, tempo e paciência.
  3. Megaprocessos – São um pesadelo. BPN – começou há mais de 10 anos e ainda não acabou; Operação Marquês – já passou meia década e ainda há mais uma década pela frente; caso BES – a caminho da eternidade ou da prescrição.

Por que é que não se sentam todos – operadores e políticos – à volta de uma mesa e tentam resolver a situação?

 

 

 

 

CONDENAÇÃO DE RICARDO SALGADO

 

  1. Na parte criminal, o processo do BES não anda nem desanda. Está encalhado. Mas na parte das contraordenações, a cargo do BP, consumou-se esta semana a primeira condenação definitiva de Ricardo Salgado (e Amílcar Morais Pires).

 

  1. O BP tinha condenado Ricardo Salgado, em processo contraordenacional com uma coima elevada e sanções acessórias. Depois houve a sentença condenatória do Tribunal da Concorrência. A seguir, recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, que Ricardo Salgado também perdeu. Esta semana, mais precisamente no dia 8 de Janeiro, Ricardo Salgado teve a última derrota – perdeu o último recurso no Tribunal Constitucional. Ele e Amílcar Pires. Vai ter de pagar coima no montante de 3,7 milhões de euros. Com a justiça a reconhecer que o ex-presidente do BES praticou actos dolosos de gestão ruinosa.

 

  1. Uma única conclusão a tirar: parabéns ao Banco de Portugal porque teve uma vitória em toda a linha. Uma vitória importante para o país. É que, face aos lamentáveis atrasos na justiça criminal, se não fosse esta actuação célere e firme do BP, um dia destes Ricardo Salgado e seus antigos pares no BES ainda passavam sem qualquer condenação em tempo útil.

 

 

ELEIÇÕES NO PSD

 

  1. Resultados – Ninguém está satisfeito. Todos ficaram aquém das expectativas.
  • Miguel Pinto Luz – Esperava ficar acima dos 10%. Não conseguiu. Caso para dizer que a prestação foi melhor que o resultado. Foi penalizado pela bipolarização.
  • Luís Montenegro – Pensava ficar à frente de Rio ou, pelo menos, taco a taco. Não conseguiu. Está muito longe de alcançar o seu objectivo.
  • Rui Rio – Tinha a expectativa de ganhar à primeira volta. Esteve muito próximo. Mas falhou o objectivo. In extremis, mas falhou.

 

  1. A segunda volta – Usando uma imagem desportiva, eu diria: a segunda volta é um jogo novo que começa. Não é a segunda parte de um jogo que já começou e que está no intervalo. Nada disso. É um jogo novo.
  2. Rio tem tudo para ganhar. Ficou muito próximo da vitória e tem a dinâmica da campanha a seu favor. Só por um azar dos Távoras perde a eleição.
  3. Mas a verdade é que ainda não ganhou. E há três variáveis que, em teoria, podem ocorrer na segunda volta:
  • Primeira: dos que votaram ontem, quantos voltam a votar e quantos ficam em casa? Não é líquido que todos voltem a votar.
  • Segunda: dos que votaram em Pinto Luz, quantos votam em Montenegro? A maioria, certamente.. Mas nunca a totalidade.
  • Terceira: e os 9 mil militantes que não votaram ontem? São mais de 20% dos eleitores. Quantos vão votar e quantos ficarão em casa? Qual dos dois candidatos mais abstencionistas vai mobilizar?
  • Em conclusão: Rio tem uma clara vantagem. Dificilmente perde esta eleição. Mas a história das segundas voltas em Portugal é uma história com surpresas. Basta recordar Soares contra Freitas do Amaral em 1986. Mesmo assim, dificilmente a história se repete.

 

  1. Futuro – Curiosamente, no dia 18, todos podem ter as suas vitórias relativas:
  • Rio pode sair vencedor. É o mais provável. E vencedor é vencedor.
  • Luís Montenegro pode ter, mesmo não ganhando, um resultado digno: 47% ou 48% dos votos. Ficará, mesmo assim, com um estatuto que lhe pode dar ainda uma oportunidade no futuro.
  • Miguel Pinto Luz ganhou notoriedade, estatuto e alguns votos. Pode sonhar com alguns voos. Não haverá muitos, mas ainda há alguns.

 

  1. Finalmente, há duas pessoas que, não tendo directamente a ver com esta eleição, podem no dia 18 sair mais ou menos satisfeitos: António Costa e Pedro Passos Coelho. O primeiro porque se quer aguentar o mais possível no Governo. O segundo porque pode querer voltar ao Governo no futuro. Disso falaremos na próxima semana.
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