Opinião
Notas da semana de Marques Mendes
Luís Marques Mendes faz, ao domingo na SIC, os seus comentários sobre o que aconteceu durante a semana. E o Negócios publica as notas que servem de base aos comentários. Esta semana faz o balanço das autárquicas, perspectiva o futuro do PSD e debruça-se sobre os negócios da Media Capital e Novo Banco.
BALANÇO DAS AUTÁRQUICAS
Quatro apontamentos:
- Sondagens – Algumas empresas e sondagens não saíram bem. Foi o caso do Centro de Sondagens da Universidade Católica. O caso do Porto é paradigmático. Prever um empate e acabar numa maioria absoluta é um erro de palmatória. Desprestigia a Universidade Católica e desprestigia as sondagens.
- A Universidade Católica e os Reguladores deveriam agir. Não é um caso de manipulação. Mas parece ser um caso de incompetência.
- Presidentes "dinossauros" – Houve vários a concorrer. Pelo PS e pelo PSD. Tinham saudades e quiseram voltar. Com excepção de Isaltino Morais, todos perderam. Uma conclusão a tirar: as pessoas querem renovação e não o regresso às caras do passado.
- Loures (André Ventura) – Tanto ruído para coisa nenhuma. Um epifenómeno. Não é que problemas com as comunidades ciganas não existam. Só que a forma oportunista de os analisar não é pagante. Ainda bem.
- Efeitos nacionais das autárquicas – É a terceira vez que as eleições autárquicas têm um efeito profundo na política nacional: aconteceu em 1982 (com a queda da AD de Balsemão); aconteceu em 2001 (com o abandono de Guterres); e sucedeu agora, em 2017 (com a saída de Passos Coelho).
- A única diferença é esta: até agora o "cartão vermelho" tinha sido mostrado ao partido do Governo. Desta vez o "cartão vermelho" foi mostrado à oposição.
- O que vai mudar? A ideia de maioria absoluta. A mudança de liderança no PSD pode matar a grande ambição de António Costa: a ideia de maioria absoluta. Justa ou injustamente, PPC era um "tampão" ao crescimento do PSD e um incentivo à subida do PS. Agora, tudo muda.
O NOVO LÍDER DO PSD
- Saída de Passos Coelho – Foi uma decisão digna, correcta e responsável. Merece ser saudada.
- PPC foi um mau líder da oposição. Mas foi um bom PM. Apesar de alguns erros e exageros, tirou o país da bancarrota e acabou com sucesso um resgate duríssimo imposto de fora para dentro. O país e o PSD devem-lhe muito.
- Sucessão de Passos Coelho – A sucessão de Passos Coelho faz-me lembrar a sucessão de Guterres em 2001. Várias desistências públicas até se chegar a Ferro Rodrigues. António Vitorino não quis; a seguir, desistiu Jaime Gama (por razões pessoais); até chegar Ferro Rodrigues. Na altura havia muito medo do PSD e de Barroso. Agora há medo do PS e de António Costa. Indo por partes:
a) Desistência de Paulo Rangel – Perde uma grande oportunidade de ser líder. Ele, que já uma vez tinha tentado a liderança e que é talvez o dirigente no activo com pensamento político mais estruturado. Mas razões pessoais são razões pessoais. Respeitam-se.
b) Desistência de Luís Montenegro – Aqui o caso é diferente. Montenegro desiste por razões políticas. Quer ser líder mas mais tarde. Mais tarde. No fundo acha que o próximo líder é de transição e espera por melhor oportunidade. Só o tempo dirá se é uma decisão certa ou se perdeu uma oportunidade única.
- É que não é líquido que o próximo líder do PSD seja um líder de transição, um líder para queimar.
- Basta que evite uma futura maioria absoluta de António Costa para se segurar no lugar e até poder vir a ser PM poucos anos depois. Foi o que sucedeu com Durão Barroso em 1999. Evitou a maioria absoluta de Guterres e dois anos depois foi PM.
- E isso não é impossível: obter uma maioria absoluta é uma tarefa muito difícil para Costa; com um novo líder do PSD, que não tenha nada a ver com o passado, essa tarefa é ainda mais difícil.
- A reflexão de Santana Lopes – Não se sabe se avança
Tem todo o direito e legitimidade a fazê-lo e mais: se o fizer, é, sem dúvida, um acto de ousadia e coragem. Porque é sair da posição confortável em que se encontra, no plano pessoal, profissional e político.
- A candidatura de Rui Rio – Vantagens e dificuldades
a) Vantagens – Rui Rio tem três vantagens: primeiro, tem coragem e autoridade; segundo, tem uma imagem de prestígio de 12 anos como Presidente da Câmara do Porto; e tem, sobretudo, a grande vantagem de não ter tido nada a ver com os últimos 6 anos do PSD, seja no Governo, seja na oposição. Esta é a sua maior vantagem.
b) Dificuldades – Vai encontrar um partido balcanizado (o que exige um grande esforço de agregação); tem algumas ideias que só lhe podem criar problemas, se não for capaz de as temperar (as ideias sobre comunicação social, política de justiça e regionalização); e tem um fantasma do qual devia livrar-se já (a ideia de que defende um governo de bloco central). No lugar dele, mataria esta ideia já no discurso de apresentação, dizendo que é candidato a PM e nunca a Vice-Primeiro-Ministro, seja de quem for.
c) Pensamento – Para além disso, tem de estruturar uma estratégia (3 pontos):
- Recentrar o partido (deixar o centro para o PS é um disparate);
- Acabar com a marca de insensibilidade social que o PSD tem tido;
- Tornar o PSD um partido atractivo e competitivo nas causas, discurso, protagonistas e na ligação aos sectores mais dinâmicos do país.
OS PROBLEMAS DE COSTA
- As autárquicas correram bem de mais ao PS. Por isso em 48 horas houve um grande contraste de sentimentos: no domingo, o PS teve a alegria de uma grande vitória. Na 3ª feira, teve um pesadelo, com a saída de PPC.
a) No domingo à noite, António Costa teve duas surpresas agradáveis:
- Primeira: a geringonça é uma sociedade com três sócios mas só dá dividendos para um deles. Os lucros vão todos para o PS. Os outros, o Bloco e o PCP, ficam a ver navios.
- Segunda: o PS passou a entrar com mais facilidade no eleitorado do PCP. Durante 40 anos, o PS era apresentado pelo PCP como um partido de direita. Com a participação na geringonça, o PCP legitimou o PS como partido de esquerda. Assim, o quadro mental e político dos comunistas mudou e os eleitores do PCP deixaram de se sentir mal a votar com o PS. E o PCP começou a esvaziar-se.
b) Na 3ª feira, António Costa teve um pesadelo com a saída de PPC.
- PPC era o seguro de vida da geringonça. Acabou o seguro.
- PPC era o líder do PSD que os socialistas gostavam de enfrentar em 2019. A ideia era mostrar: de um lado, o rosto da maldade (a austeridade); do outro, o rosto da bondade (a devolução de rendimentos). Ora esta ideia acabou.
- PPC era o líder do PSD com que os socialistas contavam para ter uma maioria absoluta. Agora, não havendo PPC, é muito mais difícil obter uma maioria absoluta.
- Eleições antecipadas?
a) Até domingo, o PS adoraria ter eleições antecipadas. E adoraria que o PCP as provocasse. Tinha três factores a seu favor: a dinâmica económica, o efeito da vitimização e Passos Coelho.
b) A partir de 3ª feira, o PS foge de eleições antecipadas como o diabo da cruz. E fará tudo o que puder para que o PCP não abra uma crise política. Porquê?
- Primeiro, porque agora já não há PPC;
- Depois, porque nos primeiros seis meses de 2018 o novo líder do PSD estará em estado de graça, fresco e sem desgaste (o que lhe dava jeito mesmo eram umas eleições antecipadas);
- Terceiro, porque a partir de agora o PS precisa de tempo para tentar desgastar o novo líder do PSD;
- Conclusão: a partir de 3ª feira tudo mudou: até lá os socialistas adorariam eleições antecipadas se o PCP as provocasse; a partir de agora, eleições antecipadas só favorecem o novo líder do PSD.
OS DESAFIOS DO PCP E DO CDS
- Com as eleições autárquicas, o PCP levou um murro no estômago e ficou numa encruzilhada.
a) Se abrir agora uma crise política, ainda se prejudica mais. Por isso, não o vai fazer. Vai aprovar o Orçamento.
b) Se for de braço dado com o PS até às eleições, pode suceder-lhe o mesmo que sucedeu agora, em dose reforçada.
c) Em conclusão: vai gerir o ano de 2018 com um olho na geringonça e outro numa eventual crise. Com uma diferença em relação a domingo passado: o PS vai "adocicar" a relação com o PCP porque, com a saída de Passos Coelho, deixou de lhe interessar ter eleições antecipadas.
- Quanto ao CDS, os desafios são claros:
a) Assunção Cristas saiu consolidada na liderança. Foi a vitória da coragem e do espírito construtivo a fazer oposição.
b) Agora, daqui retirar a ilação de que o CDS irá sozinho às legislativas acho que é uma enorme precipitação. Pode ir ou pode não ir. Vai depender, muito, do estado em que estiver o PSD daqui a um ano. Um PSD forte favorece uma coligação eleitoral. Um PSD fraco mata-a definitivamente.
ALTICE GANHA A TVI?
- Com todas as polémicas políticas e eleitorais, quase ninguém se lembra que está prestes a ser tomada uma decisão importante sobre o negócio Altice/TVI. É já na próxima 3ª feira, dia 10 de Outubro.
- Para que o negócio da compra da TVI pela Altice chumbe é preciso que a ERC (Entidade Reguladora da Comunicação) dê parecer desfavorável. E, para existir parecer desfavorável, é preciso que os 3 elementos da direcção da ERC votem – os três, em conjunto – contra a operação.
- O que temos pela frente no próximo dia 10 de Outubro?
a) O parecer dos serviços técnicos da ERC, ao que parece, é desfavorável ao negócio. Ou seja, é um parecer negativo.
b) Se os três elementos da ERC seguirem a proposta dos serviços técnicos, o negócio é chumbado, porque o parecer da ERC é vinculativo.
c) Se, por hipótese, como se diz, os dois vogais votarem contra e o Presidente votar a favor, então o negócio vai mesmo por diante, ficando a faltar a decisão final da Autoridade da Concorrência.
Notas Finais:
- O Presidente Jean Claude Juncker estará em Portugal no final do mês – a 30 no Conselho de Estado, a 31 em Coimbra para ser doutorado "honoris causa".
- "Transferência" do NB para a Lone Star – últimos passos
a) Decisão de autorização da DGCOM chegará esta semana;
b) Lone Star muda de atitude e "injecta" este ano os mil milhões euros (estavam previstos 750 milhões em 2018 e 250 milhões mais tarde);
c) Órgãos sociais – Comissão executiva toda portuguesa; CA, todos não portugueses (não executivos).