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28 de Abril de 2014 às 21:00

Eleições e eleitores

Maior seriedade tem sido manifestada pelo Partido Socialista: ao assumir a impossibilidade de se retomar uma política orçamental expansionista, mas defendendo, naturalmente, que o rigor orçamental e o pagamento da dívida pública podem ser prosseguidos promovendo o crescimento e a equidade.

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O conceito de "ciclo político-económico" foi introduzido pela primeira vez na teoria económica em 1943 pelo economista Michal Kalecki. Em 1975, William Nordhaus não só desenvolveu um modelo teórico sobre o referido conceito como o testou empiricamente. Segundo o autor, a política macroeconómica - ou alguns dos seus ramos, como a política orçamental - é influenciada pelas eleições dado o desejo dos políticos democraticamente eleitos maximizarem a probabilidade de reeleição.

 

Independentemente das abordagens teóricas e das hipóteses formuladas, certo é que existe uma forte evidência empírica - em diferentes países e horizontes temporais - que os governos, seja a nível central, regional ou local, usam os instrumentos ao seu alcance para captação de votos, mesmo que as opções se revelem contraditórias com a fase do ciclo económico. De forma naturalmente muito simplista poder-se-á afirmar que as medidas impopulares devem ser concretizadas na parte inicial da legislatura para que mais próximo da eleição seja possível a implementação de outras, mesmo que venham a produzir efeitos económicos indesejáveis (como o agravamento do saldo orçamental) que permitam captar o eleitorado decisivo para a vitória eleitoral. Claro que subjacente a esta formulação está um elemento extremamente importante sobre a memória política dos eleitores: estes revelam, pelos estudos realizados, um comportamento míope ao reterem as decisões (ou meras intenções) no período prévio ao acto eleitoral.

 

O actual governo enfrenta diversas restrições a esta actuação: o final do programa de ajustamento, a emissão não sindicada de títulos da dívida pública e, não menos importante, a vigilância dos nossos credores. Poderíamos pensar que neste quadro específico, nada haveria a fazer de modo a sensibilizar  os cidadãos/eleitores portugueses. Nada de mais errado já que o governo inventou uma nova abordagem: o anúncio de múltiplas intenções que, acrescenta, só poderão ser concretizadas em 2015. Mas para que isto fosse possível, embora o método seja inaceitável, a "desoneração" de salários da função pública e das pensões, a revisão do IRS e tudo o mais que tem sido dito pelo governo deveria ser concretizado no Orçamento do Estado para 2015, hipótese a excluir dada a curta distância do fim do resgate financeiro.

 

Maior seriedade tem sido manifestada pelo Partido Socialista: ao assumir a impossibilidade de se retomar uma política orçamental expansionista, mas defendendo, naturalmente, que o rigor orçamental e o pagamento da dívida pública podem ser prosseguidos promovendo o crescimento e a equidade.

 

Resta uma dúvida: os portugueses terão, ou não, uma completa miopia política perante a brutal austeridade que temos vivido e a ausência de expectativas - ou de esperança - no discurso do governo?

 

Professora universitária (ISEG) e investigadora. Economista.

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