Opinião
Paris 2015, menos ar quente…
Esta semana ficámos a conhecer, ainda em versão rascunho, uma nova encíclica papal. Francisco, novamente bem, coloca a Igreja Católica do lado da evidência científica sobre os efeitos do aquecimento global e exorta os católicos à acção.
Basicamente, depois disto, chegámos a um ponto em que de um lado está a ciência e do outro a inteligência de pessoas como Sarah Palin, que confessa adorar o cheiro das emissões e, pelos vistos, abusa desses prazeres. Convenhamos, já não é a dúvida que nos tolhe…
Em ano de nova Cimeira do Clima, o Papa critica a "recusa", a "indiferença", a "resignação confortável" e a "fé cega na tecnologia" que têm "bloqueado as soluções", sendo necessário fazer um esforço para encontrar uma solução para a questão ambiental.
Os que "têm mais recursos e poder económico ou político parecem estar apenas focados em disfarçar os problemas e em esconder os sintomas", escreve o sumo pontífice.
O Papa leu Naomi Klein. Eu também a ando a ler. O novo livro da autora de "No Logo", - This Changes Everything -, também identifica todas as maneiras como, mesmo os que acreditam na necessidade de mudar de paradigma, cruzam muitas vezes os braços e olham para outro lado.
De acordo com Francisco, "a submissão da política à tecnologia e às finanças é provada pelo fracasso das cimeiras globais do clima. Verdade, mas isso não será mais sintoma do que o verdadeiro problema?
As grandes cimeiras internacionais têm uma crescente dificuldade em transmitir ao cidadão comum o resultado das longas e complexas decisões em que os milhares de participantes se envolvem.
Esta dificuldade é exacerbada no caso das Conferências das Nações Unidas relativas às alterações climáticas. Não só o número de participantes atinge várias dezenas de milhares, como a complexidade e diversidade das agendas políticas e a duração do processo de preparação de tomada de decisão (que dura vários anos de pré-conferências) condiciona sobremaneira o resultado.
Que podemos então, esperar desta Conferência de Paris?
Em primeiro lugar, haverá uma formalização de doações financeiras por parte dos países desenvolvidos para alimentar o Fundo Verde do Clima por forma a que disponha de 100 mil milhões de dólares por ano a partir de 2020.
Essa verba permitirá um salto tecnológico notável em matéria de energias renováveis e de sustentabilidade dos transportes nos países em vias de desenvolvimento, diminuindo significativamente as emissões de gases com efeitos de estufa. As oportunidades para as empresas portuguesas nos PALOP, em Timor, mas também no Brasil e na China são muito significativas.
Em segundo lugar, a maior economia do mundo irá formalizar o anúncio do seu pico de emissões e reforçar a sua aposta nas energias renováveis. Com esta opção, a China condicionará não só os EUA, onde Obama quererá reforçar o legado ambiental da sua presidência, como também o Brasil onde o crescimento económico não tem sido acompanhado pelo aumento da eficiência energética.
São paliativos, pequenas mitigações, muito pouco face à dimensão do problema?
De acordo, mas voltando a Naomi Klein, não será pela iniciativa dos políticos que a dimensão da mudança quase apocalíptica que aí vem poderá ser travada. Os políticos só agem quando as massas percepcionam os grandes problemas. A secular negação de direitos cívicos a mulheres ou a negros não eram problemas até as sociedades, como um todo, assim os percepcionarem. O verdadeiro problema na falta de resposta às consequências do aquecimento global não são os políticos, é o doce sossego em que os deixa a nossa indiferença…
Advogado