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30 de Janeiro de 2013 às 00:01

O bombo da festa

As contas públicas melhoram, mas a economia estagna, o desemprego aumenta, as condições sociais deterioram-se. Mesmo se a receita for ajustada para o remédio não matar o doente, a restauração financeira da Europa será feita sobre os sacrifícios das classes médias do sul.

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A crise começa a passar. Nos Estados Unidos multidão de pequenos investidores mostram apetite por acções como não faziam desde 2007. Portugal parece capaz de se libertar da tutela da Troika mais cedo do que previsto. Estamos todos de parabéns mas, como suspirava a Avó Berta, sempre houve ricos e pobres (ou, na versão de amiga minha salutarmente americanizada, mais vale ser rico e saudável do que pobre e doente). Com o papão do défice a sumir-se ao fundo do túnel, os empresários com menos medo de arriscarem e os bancos quase a emprestarem outra vez, a Europa - circo de paz e prosperidade do mundo desde o fim da Guerra Fria até 2008 – julga estar a voltar à normalidade, mas há um problema. Os ricos saem mais ricos da crise e os pobres saem mais pobres. O que não faria a menor diferença se estivéssemos em tempo de vacas gordas, quando há pouca inveja e muita alegria. Mas em tempo de vacas magras a saída da crise perfila uma contra a outra a Europa rica do norte e a Europa pobre do sul, com raivas de que já não me lembrava - todos os gregos são caloteiros, todos os alemães são nazis...

A razão deste confronto tem a força e falsidade dos preconceitos. Recapitulando o que sabemos: como a crise começou na Grécia e os gregos haviam pecado muito – por exemplo: contas aldrabadas para entrarem no euro e fingirem cumprir as regras; reformas aos 50 anos por dá cá aquela palha – levantou-se ao norte um coro de indignação hipócrita. Usando La Fontaine: as cigarras perdulárias do sul tinham-se arruinado e queriam sobreviver esbanjando as poupanças das formigas do norte. Gregos, italianos, espanhóis, portugueses foram metidos no mesmo saco e culpabilizados pela crise – o que é falso por duas razões. Primeira: tal como foi concebido por europeus do norte, o euro era um desastre à espera de acontecer (Delors julgara que a convergência fiscal se iria fazer a pouco e pouco mas, acabado o medo da União Soviética, o desamor secular dos europeus uns dos outros viera ao de cima). Segunda: o apetite de despesa dos meridionais foi fomentado por bancos setentrionais que muito dinheiro ganharam assim. Sobre isto, para remediar a crise, a Alemanha (com apoio entusiástico de Finlândia e Holanda) impôs rigores de austeridade. As contas públicas melhoram, mas a economia estagna, o desemprego aumenta, as condições sociais deterioram-se. Mesmo se a receita for ajustada para o remédio não matar o doente, a restauração financeira da Europa será feita sobre os sacrifícios das classes médias do sul. Serviram de bombo da festa enquanto os que ao norte foram co-responsáveis pela crise ficaram impunes. Não é de bom agoiro.

Para sairmos do buraco, os governos europeus terão de se coordenar muito melhor - sem enfurecerem eurofóbicos fanáticos ou os "born-again" do federalismo. Era mais simples antes do Tratado de Maastricht de 1992 quando a construção europeia se fazia nas costas do povo. Agora há quem a queira em democracia directa. Nem tanto ao mar…

Embaixador



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