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22 de Dezembro de 2020 às 18:49

Queixa-Crime  

Uma cidadã portuguesa, militante de um partido da esquerda governamental apresentou queixa-crime contra Mamadou Bá por causa de uma citação de Franz Fanon feita em conferência internacional. Parece-me contudo que há aqui um equívoco ou então uma situação de discriminação.

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Para que Mamadou pudesse citar a frase criminosa foi necessária toda uma cadeia em que ele é apenas o último elo. Porquê, então, apresentar queixa só contra ele?

 

Desde logo Fanon que escreveu o texto, deve ser considerado o maior responsável. Afinal é ele que grafou o que Mamadou citou. Concordo que o facto de já ter morrido dificulta a perseguição. Mas nada é impossível. Porque não exumá-lo ou julga-lo à revelia? Um tal monstro não pode ficar impune.

 

Naturalmente o editor que publicou o livro que permitiu que Mamadou o lesse também deve ser considerado cúmplice. Sem ele Mamadou ignoraria a frase e não a poderia repetir. Havendo múltiplas edições em diversas línguas haverá que fazer uma lista exaustiva e processar a eito, uma vez que todos difundem tão criminosa análise político-social. Que ninguém escape. Para não arrastar os casos arranjem-se três juízes e ressuscitem-se os Tribunais Plenários.

 

Finalmente as pessoas que chamaram a atenção de Mamadou para a obra. Eventualmente professores universitários, ou alunos de cursos onde a obra é ensinada. O quê? Ensinada? Como podem ensinar tal coisa? Avance com uma queixa contra as Universidades, os seus reitores e professores que ousam chamar a atenção dos alunos para obras antirracistas e anticoloniais como a de Fanon. Nos bons velhos tempos, em que se cantava alegremente que Angola era nossa, tínhamos um nome para os militantes anti-coloniais, chamávamos-lhes "terroristas" e tinham de responder em tribunal depois de a PIDE apresentar a necessária queixa-crime. Hoje, quatro décadas depois do 25 de Abril, o processo está democratizado. Qualquer um pode apresentar queixa. Naturalmente a bem da nação ou como se diz agora por "razões de pura cidadania".

  

Ou será que se pode escrever, publicar, ensinar, discutir a obra de Fanon mas não citá-lo? O crime será repetir? O crime será fazê-lo em voz alta? Se dito ao ouvido ou suficientemente baixo para que a comunicação social não oiça será aceitável? Ou como diz a cidadã porque foi proferida por uma figura pública? Se fosse por um cidadão anónimo já seria, não digo de bom-tom, mas pelo menos tolerado, como certas drogas em certos países da Europa central?

 

Tendo eu já repetido esta frase descansa-me saber que o fiz sempre ao jantar e em voz deliberadamente baixa para que o vizinho do lado, militante socialista, não ouvisse, e não em conferência internacional. Estou a salvo de eventuais queixas de uma cidadã exemplar apoiada por cinco testemunhas oculares.

 

Nos últimos dias temos assistido no Brasil e em Portugal a uma inusitada campanha em que figuras públicas, em Portugal Rui Unas, João Paulo Batalha e outros, se confessam racistas em desconstrução. Confessam pretender libertar-se de preconceitos racistas e de falsas ideias coloniais. Afirmam estar a matar o homem branco colonialista e racista que havia neles.

 

Inaudito e escandaloso. Assassinatos em plena luz do dia. Despudoradamente confessados publicamente. A barbárie anunciada por Fanon e repetida por Mamadou a consumar-se perante os nossos olhos. Sem que a Polícia intervenha. Sem que o SEF levante a sua pesada mão. Onde isto chegou!

 

Este caso de claro assassinato de homens brancos colonialistas e racistas não pode passar impune. É preciso prender imediatamente estes assassinos. Onde está, pois, a correspondente queixa-crime, por este homicídio público?

 

Facto incontestado é Rui Unas estar vivo. E de o homem branco colonialista e racista que o habitava morto. Se isso não um assassinato não sei o que seja. Queixa-crime, pois. Avance maravilhosa Alice no seu país.

  

Ou será que a queixa-crime contra Mamadou ainda que não passe de uma patetice pegada tem outros objetivos de intimidação e perseguição a toda uma comunidade antirracista? Verdadeiramente inaceitável.

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