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Portugal é o melhor destino para jovens. E então?

Num momento capital como este, em que estamos oficialmente na moda, e estamos mesmo, foi-nos dada uma oportunidade para subirmos ao palco do mundo e mostrarmos o que valemos. Vamos dançar o vira? É isto que queremos mostrar?

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"Grécia, Espanha ou Portugal, quem vencerá a batalha deste Verão?" Milhões de franceses ouviram esta pergunta há apenas uns dias na televisão. O M6, um dos grandes canais generalistas do país, usou-a como teaser de uma reportagem sobre os principais destinos turísticos de 2019. E como é que nos saímos deste confronto? Nada mal, se acharmos que ficamos bem na fotografia como o país da imperial barata e dos hostels que custam 14 euros por dia (sic). Muito mal, se acharmos que este é, na verdade, o fado da nossa economia. Uma tragédia turística sem fim à vista.

 

A reportagem, convém esclarecer, está genericamente bem feita. Fala com empresários competentes, pessoas sãs, turistas contentes. E também mostra uma Lisboa simpática, em desenvolvimento e modernização. O retrato que todos gostamos de ver. Mas é precisamente por ser uma imagem, digamos, rigorosa que nos devemos preocupar. Num momento capital como este, em que estamos oficialmente na moda, e estamos mesmo, foi-nos dada uma oportunidade para subirmos ao palco do mundo e mostrarmos o que valemos. Vamos dançar o vira? É isto que queremos mostrar?

 

Portugal não é um país de luxo, insistem as pessoas que andam no turismo há muito tempo. Não temos argumentos para nos batermos no campo da qualidade. Ora, eu até daria crédito ao argumento se quem o dissesse não fossem as mesmas pessoas que geriram o turismo durante as últimas décadas, quando todo o mundo estava a crescer e nós tristemente na cauda. Sejamos honestos: o sol, o Tejo, os monumentos, o vinho do Porto e até a simpatia dos portugueses, ou seja, tudo o que os estrangeiros elogiam, já cá estão há séculos. Turistas a sério, em números relevantes, é que só apareceram nos últimos cinco anos. E não foi pelo trabalho dos 15 ou 20 anos anteriores que eles saíram da toca.

 

Portugal deu a volta em muita coisa. Fez apostas certas, no sector público e privado, que facilitaram esta mudança. Mas a única maneira de arrastar isto no tempo, de tornar sustentável o que para já é apenas uma tendência, é apostar na trincheira da qualidade.

 

Voltemos à reportagem: uma estadia de quatro dias em Lisboa para um casal, explica o jornalista (para uma audiência que ronda os dois milhões de pessoas), custa em média 450 euros. "Em Atenas e Barcelona custa 650!" O facto é explicado através de uma ilustração com um pódio liderado por Portugal. Líder da poupança, claro está. Porque do lado de cá, a realidade é mais cruel: significa que os estrangeiros estão dispostos a gastar mais 45% quando aterram em solo vizinho. 

 

É óbvio que é difícil mudar esta disponibilidade e percepção da noite para o dia. Mas esse dia não virá se continuarmos a ver restaurantes imitar toscamente o que vêem lá fora, menus escritos em inglês, francês e alemão, museus em estado de falência, ideias boas (como a do Comboio Presidencial) escorraçadas, sinaléticas pobres e mal escritas, vinhos com cápsula de rosca serem servidos na única companhia aérea de bandeira.

 

Temos de ser vigilantes. Protestar e exigir qualidade. Ao Estado, que é a vítima do costume nestes debates, mas também às empresas que tanto vestem a pele de cordeiro mas fazem papel de lobo na maior parte dos casos, apoucando e ferindo a nossa imagem. 

 

A reportagem deixa a ideia que Lisboa é o melhor destino para jovens. Pode ser. Mas amanhã não seremos ninguém se não tivermos os jovens, as pessoas de meia-idade, os reformados e os turistas de negócios. Todos com a mesma força. Para isso precisamos de mais gastronomia e menos festas da espuma, mais vinho e menos sangria, mais experiência e menos conveniência. Mais qualidade e menos conversa. 

 

Presidente e diretor criativo do Time Out Market

Artigo em conformidade com o antigo Acordo Ortográfico

 

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