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O Plano de Desconfinamento

São famélicos indefesos que serão chamados a pagar impostos num futuro não muito distante. Nessa altura um qualquer ministro das Finanças dirá que é inevitável para pagar os custos da pandemia. E não mencionará sequer as decisões de confinamento tomadas em articulação pelo Governo, Parlamento e Presidência da República.

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O Dicionário de Língua Portuguesa da Academia das Ciências não tem entrada para "desconfinar" ou "desconfinamento". O dicionário online da Priberam define desconfinamento como "saída ou libertação de situação ou estado de confinamento ou de isolamento."

 

O meu pequeno contributo é sugerir usar uma palavra normal e chamar ao documento Plano de Libertação. Ou mesmo Plano de Saída do Estado de Confinamento.

 

Se o plano consistir em prover escolas e espaços de uso comum, com elevada densidade, de meios de teste suportados pelo Estado sou também a favor desse plano.

 

Porém se o plano mantiver a ideia central de que milhões de pessoas devem continuar presas em casa durante um período de tempo indeterminado, então será melhor chamar ao documento Plano para a Manutenção do Confinamento e as suas Exceções. Será difícil apoiar um documento que advogue a continuação da nossa prisão. E a legitimidade política da decisão deveria ser escrutinada de forma mais corajosa pelo Tribunal Constitucional mesmo que o Presidente da República não a solicite preventivamente.

 

A própria ideia de chamar ao assunto "Plano" contém a arrogância fatal de considerar que a vida dos cidadãos pode e deve ser planeada pelo Estado. E ainda a arrogância intelectual de pensar que há políticas públicas que combatam de forma eficaz a pandemia. Ou que estas se podem basear numa espécie de consenso técnico-científico unânime.

 

Para que não fiquem dúvidas. Parece-me bastante razoável que as autoridades decretem estados de emergência durante um período de quinze dias quando os riscos da doença o justificarem. Já não me parece defensável manter os estados de emergência por tempo indeterminado, como está a acontecer em Portugal. A apatia com que a sociedade e as autoridades aceitam esta situação é deprimente. E mostram de facto uma sociedade timorata e amordaçada.

 

O assunto transcende as consequências económicas provocadas pela pandemia e pelas políticas de confinamento. Ou as consequências na qualidade da educação das crianças. O que estamos a observar é uma enorme experiência social em que as pessoas aceitam a perda da liberdade em nome da sua potencial eficácia no combate à pandemia.

 

Clarificando. A pandemia é um choque brutal na sociedade. E mesmo sem medidas de confinamento alteraria de forma significativa a vida das pessoas e os seus hábitos sanitários. Um Estado bem organizado ajudaria as pessoas dando informação sobre os riscos de contágio e aconselhando-as a protegerem-se desses riscos. Há uma grande diferença entre aconselhar as pessoas a ficar em casa e decretar que estas têm a obrigação de ficar em casa ou são obrigadas a adotar o regime do teletrabalho.

 

A nossa sociedade está muito doente. E não apenas com o vírus da covid-19.

 

A descida significativa da natalidade é um sinal claro dessa doença. Embora também revele a racionalidade dos jovens. Para quê ter filhos quando se vive numa prisão? Que futuro terão os nossos filhos se não puderem ir à escola e brincar com os amigos?

 

As decisões comuns do Estado exigem prudência e bom senso. E uma noção clara do que é normal e excecional. O normal na nossa sociedade é a vida em liberdade. O ónus da prova na justificação das decisões que retiram a liberdade está nas autoridades. E não chega dizer que não há alternativas de política de saúde pública ou mesmo que outros países estão a adotar medidas semelhantes. Neste caso, a prudência recomenda a liberdade, o estado normal, e não o confinamento. As regras sanitárias acrescidas e as limitações de capacidade de espaços públicos e comerciais durante a pandemia já foram genericamente aplicadas desde julho do ano passado. O Plano de Libertação não precisa muito mais do que isso.

 

Há em Portugal vítimas do confinamento que precisam de se levantar. São famélicos indefesos que serão chamados a pagar impostos num futuro não muito distante. Nessa altura um qualquer ministro das Finanças dirá que é inevitável para pagar os custos da pandemia. E não mencionará sequer as decisões de confinamento tomadas em articulação pelo Governo, Parlamento e Presidência da República.

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