Opinião
[589.] BANIF
A metáfora é a figura de estilo mais fascinante. Não pára de originar estudos académicos, da literatura à publicidade, da linguística aos estudos mediáticos. No caso da publicidade, o tema que mais me tem interessado é o da relação entre o texto verbal e a imagem quando ambos concretizam uma determinada metáfora.
A metáfora, quer dizer, uma forma de comunicação em que o significado pretendido não corresponde ao significado literal, ocorre em milhões de palavras e expressões. Algumas são tão comuns que já não damos por elas, as chamadas metáforas mortas, como "as pernas da mesa", ou "a chama" em vez de paixão, ou "asas" em vez de avião, ou "porco" por sujo ou mal comportado. A riqueza permitida por esta substituição de um termo por outro não tem limites. Há sempre novas metáforas entrando na linguagem comum. A qualidade da poesia também se avalia pela sua capacidade de inventar metáforas.
Na publicidade, as metáforas podem limitar-se ao texto verbal que acompanha uma imagem, mas as mais interessantes são as que se visualizam ou até que se completam na imagem. Um novo anúncio do BANIF recorre a uma metáfora comum no título: "500 milhões de euros para quem não baixa os braços". A expressão "baixar os braços" não é, na frase, para se entender literalmente, mas no significado metafórico de não desistir. No entanto, a fotografia que ocupa todo o anúncio mostra dois homens vestidos de operários com os braços no ar, encaminhando uma enorme peça metálica para o seu destino num armazém.
A foto mostra, portanto, alguém que "não baixa os braços" porque está a segurar o tubo metálico no seu movimento pelo ar. Na imagem não há metáfora; no texto há. O que faz a imagem? Enquanto fotografia, isto é, um simile da realidade, não pode ou dificilmente pode "ser" a metáfora. Mas ela ilustra directamente a metáfora do texto, não pelo seu significado adicional - não desistir-- mas pelo significado que já esquecemos, o de "não baixar os braços" propriamente ditos. Esta articulação entre os dois significados da metáfora - relativos ao movimento físico dos braços e à persistência - enriquece a mensagem. Em vez do efeito "trompe l'oeil", pelo qual uma imagem engana o olhar durante um pequeno lapso de tempo, esta visualização do sentido literal da frase da metáfora como que engana a linguagem verbal.
Os publicitários do BANIF entusiasmaram-se com a metáfora braçal e não se ficaram por aí. O texto explicativo começa com outra metáfora: "Este é o momento de arregaçar as mangas." Esta segunda metáfora já não tem correspondência visual, pois os dois operários estão com as mangas vestidas. Apesar de não ser preciso explicar metáforas, os publicitários recearam que o receptor fosse burro e não as entendesse. À maneira típica da publicidade, explicam de seguida a segunda metáfora: "Este é o momento [...] de levar os projectos para a frente."
A explicação da primeira metáfora ficou para o remate do texto: "Acreditamos em quem não desiste de acreditar." O principal elemento da frase é "não desiste", isto é, o significado da metáfora; mas a publicidade, com a sua obsessão em projectar sonhos nos receptores, tinha de lhe acrescentar o verbo "acreditar". O que parecia tão material - braços, mangas, projectos que avançam - passa no último segundo para a esfera da fé.