Opinião
Como gerir os riscos? Construindo o “próximo normal”
Em menos de um ano, a perceção dos riscos empresariais por parte dos gestores mudou completamente. São conclusões esperadas face ao contexto em que estamos, mas que não devem eclipsar uma visão integrada e equilibrada dos negócios a longo prazo.
Sinal do momento que atravessamos, o tecido empresarial enfrenta hoje desafios muito diferentes comparativamente ao início de 2020. Vivemos um contexto único, de mudanças rápidas, em que a gestão da resposta aos desafios trazidos pela pandemia – marcadamente dinâmicos – exige uma atuação conjunta de todos nós, empresas, famílias e governos.
A pressão constante na resposta às ondas epidemiológicas demonstra que tudo o que fizemos até agora são apenas medidas de resiliência essenciais para gerir o risco e, coletivamente, continuarmos a adaptação à mudança. Apesar de serem medidas de cariz reativo, que resultam no imediato e que contrariam o impacto que corresponderia ao "não fazer nada", já as explorámos o suficiente para sabermos que algumas delas terão futuro e, se robustecidas, manter-se-ão eficazes e farão parte do "próximo normal".
Não surpreende que, em 2020, o desemprego e as doenças infecciosas sejam os temas que mais preocupam os líderes empresariais mundiais, como vinca o relatório "Riscos Regionais dos Negócios 2020", desenvolvido pelo Fórum Económico Mundial em outubro passado, em parceria com a Zurich, a Marsh e o SK Group. O risco de doenças infecciosas é, aliás, o mais recorrente em todas as regiões do mundo, subindo 28 lugares no ranking desde 2019.
Portugal não é exceção. Os resultados do inquérito realizado a 156 líderes empresariais nacionais mostram que a maior preocupação está na propagação de doenças infecciosas, seguida da "falha de mecanismo financeiro ou institucional" e do "desemprego ou subemprego". Já a "falha de adaptação às alterações climáticas" ou a "perda da biodiversidade e colapso dos ecossistemas" foram relegadas para 10.º e 23.º lugar dos riscos percebidos, respetivamente, o que evidencia a necessidade de consciencializar os gestores sobre o impacto dos episódios climáticos extremos nas empresas, na economia, nas comunidades e no planeta.
Tão importante como existir uma noção dos riscos prementes relacionados com a pandemia da covid-19 e as crises económica e social daí decorrentes, é promovermos ações em prol do ambiente e da sociedade. Mais: tem de existir uma visão integrada de todos estes temas. Até porque, se há algo que a pandemia veio evidenciar, foi o facto de todos os riscos – de saúde, económicos, ambientais e sociais – estarem fortemente interligados. E serem, ou acabarem quase sempre por se tornarem riscos globais e sistémicos, que impactam os negócios e a economia de forma transversal, nas mais diversas partes do mundo, atingindo severamente as populações.
Para além da pandemia, também precisamos de ter como prioridade, em todo o mundo, a mitigação e adaptação às alterações climáticas. Terá de ser uma urgência dos governos, das empresas, das ONG e das famílias. A adoção de comportamentos mais sustentáveis permite reduzir as emissões de carbono e restaurar a biodiversidade do planeta. Atingir este objetivo é uma forma de evitarmos novos surtos epidémicos. Para o concretizarmos, é vital que pensemos em soluções integradas, partilhadas e de longo prazo, que permitam impulsionar a economia e proteger o planeta e as pessoas.
Neste "próximo normal" tudo conta: a educação familiar, o ensino escolar, a experiência da academia, a evolução da ciência, o propósito das empresas, a atitude das instituições públicas e a ação dos poderes locais e dos governos. Juntos podemos consagrar este objetivo como um desígnio urgente do mundo, o que nos fará acreditar que a mudança acontecerá e que o futuro existe!
O equilíbrio entre curto e longo prazo
É certo que cada empresa estará numa fase específica de resposta à crise que atravessamos, contudo, a identificação dos riscos – e o conhecimento sobre a sua gestão e aproveitamento das oportunidades que trazem – é o primeiro passo para uma gestão ativa. Há atitudes fundamentais e globais que fazem a diferença no presente e podem alterar o rumo do futuro.
O "próximo normal" vem reforçar a necessidade de implementarmos soluções sistémicas e com visão de longo prazo. "O que é realmente material para o meu negócio", "que riscos impactam o meu negócio" e "como posso preparar a minha empresa", são perguntas para as quais as empresas e os empresários têm que encontrar respostas. Só desta forma obtêm uma visão alargada da gestão de risco e conseguem integrar o desenvolvimento económico, social e ambiental nas suas matrizes de materialidade. Esta é parte do sucesso para que as empresas se mantenham resilientes e competitivas.
Fazer uma leitura atenta e clara sobre o que se passa à nossa volta, interpretar o momento numa lógica de dinâmica integrada, colocar na equação os fatores de maior relevância para uma análise ponderada e imaginar como poderá ser o futuro através da criação de cenários realistas e possíveis é outra parte para a tomada de decisões de sucesso. E, a partir daqui, seguir passo a passo, mantendo a leitura e a interpretação críticas do efeito consequente. Opções e decisões simples? Não, bastante complexas, mas fundamentais para que o movimento do progresso possa ser bem-sucedido em momentos de disrupção como aquele que a atualidade nos oferece.
Qualquer crise traz consigo oportunidades que as empresas podem ou não conseguir aproveitar. As mudanças são inevitáveis: a chave está no equilíbrio entre aquelas que garantem a sobrevivência a curto prazo, e nos permitem viver no "novo normal", e as estratégias a longo prazo, que nos tornam promotores da construção do "próximo normal". Voltar ao passado não será possível. Conhecemos os riscos e temos, agora, a oportunidade de construir um "próximo normal" mais resiliente, equilibrado, saudável e sustentável para as gerações vindouras.
CEO Zurich Portugal