Opinião
Inundações: construir resiliência num contexto de incerteza
No mundo, as inundações afetam mais pessoas do que qualquer outro tipo de catástrofe natural. É urgente encontrar respostas holísticas que criem resiliência e permitam gerir eficazmente os riscos.
Há 52 anos, em novembro de 1967, cinco horas de chuvas torrenciais bastariam para criar uma das piores catástrofes naturais em Portugal. De forma imprevisível, as inundações provocaram um total estimado de 700 mortos e 20 mil casas danificadas na região de Lisboa. A dimensão das inundações de 67 não tem comparação em Portugal - foi o segundo evento climático mais mortífero, a seguir à onda de calor de 2003. Mas, no geral, as inundações estão longe de ser ocorrências raras no nosso país: são, hoje em dia, um dos fenómenos naturais extremos mais frequentes, a par das secas, ondas de calor, incêndios florestais e tempestades.
Atualmente Portugal Continental regista 63 áreas com risco potencial elevado de inundação, de acordo com a Avaliação Preliminar dos Riscos de Inundações (APRI) da Agência Portuguesa do Ambiente. Estes riscos são locais, mas também globais. No mundo, as inundações afetam mais pessoas do que qualquer outro tipo de catástrofe natural, sendo responsáveis pelas maiores perdas humanas, materiais e económicas.
O relatório das Nações Unidas "The Human Cost of Weather Related Disasters" contabiliza que, em 20 anos - entre 1995 e 2015 - morreram 157 mil pessoas na sequência de inundações. Os prejuízos económicos acompanham a dimensão humana: na União Europeia, os prejuízos anuais rondam os cinco mil milhões de euros e globalmente foram superiores a 660 mil milhões de dólares.
Perante este impacto, o risco não pode ser ignorado, sobretudo no contexto da crise climática que vivemos. A subida do nível do mar, as tempestades e as alterações nos padrões de pluviosidade aumentam a incerteza em relação às inundações, que se esperam cada vez mais frequentes, severas e também em zonas fora dos habituais mapas de risco. Este é, certamente, um problema complexo, que exige abordagens inovadoras e, sobretudo, holísticas.
Da resignação à resiliência
Torna-se claro que a resposta tradicional de esperar pela catástrofe para depois financiar a reconstrução é inaceitável. Sabendo que os impactos vão ser de grande magnitude, há que trabalhar na adaptação das zonas e das comunidades mais vulneráveis, gerindo e minimizando o risco, para assim diminuir as perdas. As inundações deste ano em Moçambique, à passagem do ciclone Idai, são disso exemplo.
Neste contexto de incerteza, o foco deve estar na resiliência. Precisamos de envolver as comunidades e partilhar conhecimento para que estejam mais preparadas. Os seguradores têm aqui um papel fundamental, dado o "know-how" único que têm sobre gestão e mitigação de risco, que pode e deve ser mobilizado em prol da adaptação climática.
É também essencial criar sinergias entre os diversos stakeholders para que se alcancem respostas inovadoras e transversais. Só com um envolvimento alargado dos cidadãos, empresas, entidades públicas, polos de investigação e ONG é que se poderão desenhar novas abordagens à crise climática. Eventos climatéricos extremos exigem respostas sistémicas.
Vivemos a era de todos estes desafios mas também das oportunidades. As alterações climáticas e os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável são oportunidades para inovar na procura de soluções locais e globais, oportunidades para continuar a trabalhar a resiliência e a adaptação climática, oportunidades para proteger as comunidades e reduzir o risco para cidadãos, famílias, empresas e património. Com a certeza de que todos teremos a ganhar neste esforço conjunto.
CEO Zurich Portugal