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25 de Março de 2019 às 20:00

Bancos e economia - (IV)

Já no que diz respeito ao BES, a avaliação, tanto da decisão de o "resolver", como da situação actual do Novo Banco, passa por ter presente a "tempestade perfeita" que o destruiu.

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1. A evolução dos bancos desde a crise financeira e a intervenção da troika ficou marcada entre nós pelos efeitos - que perduram até hoje - de três acontecimentos: a decisão absurda da troika de forçar uma redução muito rápida do nível de alavancagem dos bancos. Quando se deu conta de que o ritmo de redução estava a provocar uma destruição maciça de emprego - e quis "emendar a mão" - já era tarde; a aplicação ao BES do quadro jurídico/regulamentar conhecido pela designação de "resolução", como resposta aos desequilíbrios acumulados pelo conglomerado Espírito Santo; por fim, a canalização de recursos públicos em montantes muito elevados para recapitalizar alguns bancos sistémicos. Esta foi justificada pela necessidade de preservar a estabilidade do nosso sistema financeiro - e deste modo evitar tanto a destruição generalizada de valor, como o acentuar da repressão financeira que se havia abatido sobre a nossa economia. No entanto, pela sua dimensão e pelas razões que estiveram na sua origem, a injecção de capitais públicos transformou-se numa questão com inegáveis implicações económicas, financeiras e políticas. Em particular - embora por razões distintas - os recursos financeiros públicos dirigidos à recapitalização do banco público e do banco herdeiro do BES.

 

Antes de prosseguir deixo uma referência pessoal. Até Maio de 2018 e durante cerca de três anos e meio, exerci as funções de Presidente de Conselho de Auditoria do Banco de Portugal. Neste contexto, e por razões legais e éticas, irei circunscrever as minhas observações às decisões e aos argumentos que são hoje públicos.

 

2. Em artigos anteriores, tive já a oportunidade de avaliar o impacto desnecessariamente destrutivo - em emprego e em produção - do programa que a troika aplicou aos bancos. Ao impor uma forte redução da alavancagem num período muito curto, forçou os bancos a travar novas operações e, sobretudo, a virar-se para os fluxos líquidos do crédito com rotação mais rápida - financiamentos a PME - que reduziram de forma substancial, com os efeitos contraccionistas conhecidos. Na altura e dos contactos mantidos com a troika, fiquei convencido de que foram as pressões do BCE que forçaram este programa, com a intenção de manter sob controlo e mesmo de reduzir o seu apoio aos bancos portugueses. Numa negação clara das suas funções estatutárias centrais de "lender of last resort"(*), num período de crise e de contracção generalizada da actividade económica.

 

No que se refere à recapitalização do banco público e do banco que sucedeu ao BES, as questões que esta coloca são naturalmente de natureza distinta. No caso da Caixa Geral de Depósitos, as interrogações vão desde a natureza das operações de crédito que estiveram na origem de uma parte significativa da sua descapitalização, até às absurdas imposições da DGCom(**) para aprovar  a recapitalização. No entanto, para além disso, permanece em aberto uma questão central. Como colocar a Caixa e o seu grupo ao serviço de um movimento de modernização e de desenvolvimento, quer do tecido produtivo, quer do próprio sistema financeiro?

 

Já no que diz respeito ao BES, a avaliação, tanto da decisão de o "resolver", como da situação actual do Novo Banco, passa por ter presente a "tempestade perfeita" que o destruiu. Questões para outro dia.

 

(*) Prestamista de última instância         

                                   

(**) Direcção Geral de Concorrência.  

 

Economista

 

Artigo em conformidade com o antigo Acordo Ortográfico 

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