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Arrendamento de actividades económicas: dois pesos e duas medidas 

O arrendamento tem sido, tradicionalmente, uma matéria controversa na sociedade portuguesa. A principal razão foi, durante décadas, o seu caracter vinculístico, ou seja, na prática eram contratos sem termo e de difícil, para não dizer impossível, denúncia por parte do senhorio.

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Foi um tema que queimou as mãos de sucessivos governos e responsáveis políticos. Encontrar uma solução que agradasse a gregos e troianos afigurava-se uma tarefa ciclópica, senão mesmo utópica.

 

O imobilismo que, por isso, caracterizou a legislação arrendatícia foi prejudicial à reabilitação dos centros históricos das nossas cidades e promoveu a existência de factores de distorção da concorrência entre os diversos agentes económicos.

 

Ainda assim, paulatinamente, foi possível avançar para soluções que, não agradando a todos, colocaram um fim ao regime vinculístico que existia tanto no arrendamento rural como no arrendamento urbano.

 

Mas mantiveram-se falhas graves nas soluções encontradas. A CCP sempre alertou para o facto de todas as modificações que foram realizadas ao Regime do Arrendamento Urbano, ao extrapolarem de forma simplista soluções do arrendamento habitacional para o não habitacional, desequilibraram, de modo gravoso, os interesses dos inquilinos não habitacionais. Porque, de facto, as questões que se colocam aos dois tipos de inquilinos são totalmente diversas.

 

Deslocar um estabelecimento comercial, uma fábrica, um restaurante ou um hotel não é a mesma coisa que deslocar uma família ou uma pessoa de um apartamento para outro.

 

A modificação da localização de um estabelecimento comercial tem diversas implicações práticas e jurídicas que, no limite, poderão conduzir ao encerramento da empresa que o explora, atendendo aos custos decorrentes dessa mudança, nomeadamente o investimento em equipamento e a perda de uma clientela fiel.

 

Por outro lado, se é inquestionável que o senhorio é o proprietário do imóvel, também é inquestionável que o inquilino é o proprietário do estabelecimento comercial, ou seja, do negócio, que explora. Em virtude da sua dimensão e especificidade, a CCP sempre defendeu que o arrendamento não habitacional deveria ter um regime jurídico próprio, à semelhança do que se passa com o arrendamento rural.

 

A reforma do arrendamento rural, pelo facto de se tratar de um regime jurídico relativo a questões arrendatícias que dizem respeito, única e exclusivamente a uma actividade económica, permitiu que se alcançassem soluções equilibradas e justas para ambas as partes.

 

De facto, a reforma efectuada ao arrendamento rural, em 2009, possibilitou, de forma pacífica e a contento de todos, a transição de um regime vinculístico para um regime livre, mas com a salvaguarda dos interesses específicos dos arrendatários. Muitas das soluções que aí tiveram consagração legal poderiam ser transpostas para um regime jurídico exclusivo para o arrendamento não habitacional, uma vez que muitas questões resolvidas pelo regime jurídico do arrendamento rural são idênticas às que existem no arrendamento não habitacional.

 

O legislador não pode ter dois pesos e duas medidas para o regime de arrendamento de actividades económicas.

 

É que, parafraseando Orwell, todas as actividades económicas são iguais, mas parece haver umas mais iguais do que as outras.

 

Vice-presidente da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP)

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