Outros sites Medialivre
Notícias em Destaque
Opinião

À (re)descoberta da China

A recente publicação "Metamorfoses no poder: rumo à hegemonia do dragão?" de Paulo Brardo faz uma análise detalhada do crescente peso geoestratégico do "Império do Meio".

  • ...

 

Embora deixe no ar a interrogação acerca do ritmo de convergência com os EUA, sustenta a tese generalizada da sua inevitabilidade.

 

Essa evolução de um país que há poucas décadas era ainda um dos mais pobres do mundo pode parecer surpreendente. No entanto, as séries longas de Angus Maddison, que estimam a evolução da riqueza e da população mundial desde há 2000 anos, sugerem que a China sempre foi mais rica e populosa que a Europa Ocidental, com exceção dos últimos dois séculos. Ou seja, a revolução industrial veio potenciar a ascensão do Império Britânico e do mundo ocidental, mas a rápida industrialização da China permitiu-lhe recuperar, pelo menos parcialmente, a sua posição tradicional.

 

Independentemente de se tornar ou não a potência dominante, a China tem hoje uma importância económica que as empresas portuguesas têm largamente negligenciado. O argumento da distância, típico dos modelos gravitacionais do comércio externo, parece insuficiente para explicar o reduzido nível de exportações portuguesas para a China. De facto, em 2014, a China ocupava a décima posição com apenas 1,7% das exportações portuguesas de bens. Já no sentido inverso, a China tem um peso bem mais significativo, ocupando a sétima posição com 2,8% das nossas importações de bens. Ao nível do investimento direto a assimetria é ainda mais elevada sendo bem conhecidos os investimentos chineses em Portugal nos setores energético, imobiliário e financeiro, entre outros.

 

A dependência de mercados próximos, no nosso caso reforçada pela união aduaneira e monetária, é outro fator de diferença entre Portugal e a China. Enquanto a União Europeia representa 71,5% das exportações portuguesas, a China depende muito menos dos mercados vizinhos. Curiosamente, a distante União Europeia é também o maior mercado para os produtos chineses, logo seguida dos EUA.

 

Portugal tem imensas oportunidades por explorar no vasto mercado chinês. Como refere Paulo Brardo, a China tem um vasto interesse por países produtores de matérias-primas de que depende, em que os países de expressão portuguesa como Angola, Brasil e Moçambique têm um peso elevado. Daí resulta uma elevada procura da língua e cultura portuguesa confirmada pelo número crescente de cursos e alunos de português na China e em Portugal. Macau tem também vindo a reforçar o seu peso como polo de aprendizagem do português. O grau de conhecimento de Pútáoyá ou País das Uvas na China é provavelmente superior ao que existe nos EUA.

 

O principal problema para as empresas portuguesas reside no receio da China como produtor mais eficiente precisamente nos setores mais importantes para nossa indústria quer tradicionais (têxteis, calçado, mobiliário) quer mais recentes (moldes, máquinas e equipamentos, plásticos). No entanto, a capacidade de inovar e diferenciar os produtos através do design, cujo impacto tem sido evidente nos mercados mais sofisticados, não deixará de produzir resultados junto do vasto segmento da população chinesa com maior poder de compra. A questão do modo de entrada, sobretudo quando o investimento direto é mais eficiente devido à distância e dimensão do mercado de destino, é dificultada pela reduzida dimensão das empresas portuguesas. Neste caso, a parceria entre empresas portuguesas e com empresas chinesas é decisiva para ultrapassar esse obstáculo. A presença de empresas chinesas em Portugal pode constituir um veículo decisivo para facilitar a redescoberta do mercado chinês. Afinal, hoje deveria ser mais fácil que em 1513. Sem ser focado no comércio internacional, o "Rumo à hegemonia do dragão?" ajuda a desbravar o novo caminho para o mercado chinês.

 

Professor de Finanças da ISCTE Business School e no INDEG-IUL ISCTE Executive Education

Ver comentários
Mais artigos do Autor
Ver mais
Outras Notícias
Publicidade
C•Studio