Opinião
O futuro da Caixa
O processo de reestruturação e recapitalização da CGD deixou de interessar os media. Em seu lugar temos fartas reportagens sobre os empolgantes temas dos salários e das declarações de rendimentos e patrimónios dos administradores.
É certo que o pessoal político-mediático tem sobras razões para se preocupar com as torrentes de rendimentos pessoais com origem no banco público. Este tornou-se, crescentemente, numa fonte de distribuição de prebendas capeadas de salários.
Em 2015, a CGD registou um custo médio com o pessoal de 97,5 mil € /pessoa, o mais elevado dos quatro principais bancos, longe do segundo que melhor paga, o BCP, com 85 mil €. Esta extrema generosidade na Caixa é relativamente recente. No período 2002-2008, o valor médio dos custos com o pessoal era na CGD muito próximo da média: 79,3 mil € - contra 79 mil € em média nos quatro bancos principais. Foi no período 2009-2015 que se registou o grande salto. Entre 2004 e 2010, o valor cresceu 77,5%, contra a média de 22,6%; o banco que a seguir maior valor registou foi o BPI com 30,1%. Nem o resgate da troika moderou significativamente a generosidade da Caixa: entre 2011 e 2015 a quebra foi apenas de 6,9%.
O que está por trás do brilho destes números tem impedido que se pense o futuro da Caixa na perspectiva do interesse nacional.
A CGD está no caminho dos decisores nacionais. Estes, esmagados entre a derrocada da crise do sistema financeiro nacional e o espartilho de Bruxelas/Frankfurt, ocupam-se apenas com questões laterais. Para os problemas centrais, os nossos decisores aceitam o papel menor que as instituições europeias lhes querem destinar. Os casos mais recentes, BES e Banif, mostram como obedientemente se aceita o papel menor que nos destinam mesmo que isso signifique a espoliação do capital nacional para o doar ao capital externo, ainda que vizinho.
É preciso ver para além das aparências. Todos parecem defender a manutenção pública da CGD, quando tal significa a continuação do acesso às prebendas que refiro acima. Mas, até aqueles que se benzem para esconjurar a privatização da Caixa aceitam agora o seu início imparável, com a aceitação da exigência da emissão de obrigações privadas.
O papel a destinar à CGD deve ter em conta quatro ameaças essenciais que se conjugam e que se auto-reforçaram recentemente:
1) A hostilidade da UE ao capital bancário nacional, alimentada por agentes internos bem posicionados;
2) Um sistema monetário e financeiro em crise, com possíveis derrocadas à espreita;
3) A ameaça dos juros nulos ou negativos e da desmaterialização total da moeda;
4) A taxa de poupança baixa e a consequente estagnação do PIB.
Perante estas ameaças impõe-se a necessidade de procurar novas soluções para a preservação dos activos nacionais de média e pequena dimensão, limitados por não terem ao seu alcance as soluções globais para os grandes activos. A história da CGD mostra que, em certas ocasiões, soube desempenhar, em parte, este papel.
Procurar capital privado nacional é a solução desejável, mas irrealizável no momento.
A Caixa se for apenas um banco público vulgar - como tem sido - adiciona a instabilidade financeira actual à instabilidade política - e estoira.
A solução que preconizo obriga a um novo papel para a Caixa que passa por enfrentar os novos problemas que refiro. Estes obrigam à procura de novas soluções numa escala nacional.
O objectivo central é o de preservar e estimular a poupança com soluções diferentes e inovadoras capazes de enfrentar os riscos de desmaterialização da moeda e dos juros baixos e negativos.
Há agora uma oportunidade para reorientar a CGD visando prosseguir o interesse nacional actual perante um sistema financeiro esfrangalhado e uma Europa que, com os seus agentes internos, nos procura esbulhar do capital financeiro e bancário de origem nacionais.
Há um papel que a CGD poderia desempenhar, que não é nem ser mais um banco, nem um mero departamento estatal de prebendas principescas.
Economista e professor no ISEG