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Tudo o que a Moody’s pensa sobre Portugal
Dos elogios aos alertas, a agência de notação financeira analisa a economia portuguesa ao pormenor. Faz vários alertas ao crescimento e destaca o travão que o ainda elevado endividamento representa. Aponta o dedo à incerteza política e diz que a banca é a principal vulnerabilidade de Portugal.
Foram já seis as ocasiões em que a agência Moody’s deixou o "rating" de Portugal inalterado. Actualmente em "Ba1" com uma perspectiva "estável", a dívida nacional continua, assim, a ser assombrada pela classificação de "lixo". Mas apesar de não mexer na avaliação, a agência de notação financeira não perde a oportunidade de avaliar a evolução da economia portuguesa.
Isso mesmo reflecte o relatório publicado na segunda-feira, 23 de Maio. A Moody’s aponta "o regresso da economia ao crescimento e a implementação de reformas estruturais sob o programa de ajustamento económico", salientando que impulsionaram "o reequilíbrio da economia para as exportações". Um factor positivo, defendem os analistas Kathrin Muehlbronner (na foto) e Dietmar Hornung.
Mas o crescimento é ainda moderado, o que afecta também "os níveis elevados de dívida pública". E a Moody’s alerta para o abrandamento da consolidação orçamental, verificado no ano passado, além dos riscos que o sector bancário continua a representar, devido à sua fragilidade. De facto, a agência de notação financeira analisa a economia portuguesa a fundo. Por isso, fique a saber os principais focos de preocupação, bem como os maiores elogios.
Alerta vermelho no crescimento
Um dos principais receios da Moody’s reside na evolução da economia nacional, cujo crescimento desde 2014 tem sido "moderado". "O crescimento do PIB [produto interno bruto] real até abrandou ao longo dos últimos trimestres para apenas 0,8% homólogos, no primeiro trimestre de 2016", destaca a agência de notação financeira. Este é mais um sinal de que, argumenta a Moody’s, "a recuperação de Portugal está a ficar aquém da registada por outros países da periferia da Zona Euro".
Os analistas da agência norte-americana antecipam um crescimento de 1,5% este ano, abaixo dos 1,8% previstos pelo Governo. E para 2017 a perspectiva da Moody’s é que Portugal atinja apenas 1,8%. Tudo graças "aos estímulos ao consumo privado". Isto porque, apesar de contribuir para o crescimento da economia, "cerca de metade do consumo [privado português] depende de bens importados". Um problema? Sim, já que as importações diminuem o crescimento do país.
E é aqui que está outra fonte de preocupação. "As exportações de bens diminuíram no primeiro trimestre", nota a Moody’s, "devido a uma acentuada redução das exportações para países fora da União Europeia". Além disso, a agência reitera que, graças ao elevado peso das importações no consumo privado nacional, "as importações crescerão mais fortemente do que as exportações este ano".
Ainda assim, a Moody’s elogia o crescimento das exportações nos últimos anos, que passaram de 31% do PIB em 2010 para 43% em 2015. E destaca que "as exportações de serviços, principalmente turismo, deverão continuar robustas". Mas aponta o dedo "ao acentuado abrandamento do investimento na segunda metade do ano passado", que a agência diz querer verificar se continuará em 2016.
Divida: o mesmo problema de sempre
Há dívida a mais. Esta a principal conclusão da Moody’s em relação a Portugal, quer a óptica esteja no sector público ou no sector privado. "O rácio de dívida pública finalmente começou a reverter a tendência no ano passado", nota a agência de notação financeira, apesar de ter sido uma "queda marginal". Passou de 130,2% do PIB para 129%, um nível que fica muito próximo dos 128,9% que a Moody’s antecipa para o final deste ano.
"Não incluímos os rendimentos da potencial venda do Novo Banco e de outros activos", destacam os analistas Kathrin Muehlbronner e Dietmar Hornung. Mas mesmo esse factor positivo não teria um grande impacto na evolução da dívida pública, já que a Moody’s antecipa que o rácio continuará elevado até ao final da década. A previsão é que ronde os 124% do PIB em 2020.
Mas há elogios a fazer. "As autoridades portuguesas conseguiram suavizar significativamente o perfil de reembolsos de dívida do Estado durante os últimos anos", aponta a agência de notação financeira, explicando que isso deve-se, por exemplo, aos reembolsos antecipados ao FMI e às recompras de dívida. Por isso, considera, "um choque de taxas de juro teria um impacto mais limitado" nas contas nacionais. E acrescenta que também o maior peso dos investidores de retalho é "positivo" .
E há ainda a dívida privada. "Os contínuos níveis elevados de dívida no sector privado, particularmente entre as empresas não-financeiras, são um constrangimento de longo prazo nas perspectivas de investimento e de crescimento de Portugal", considera a Moody’s. E a dívida das famílias, apesar da tendência de redução acentuada, "continua mais elevada do que em muitos pares".
A incerteza política de um Governo minoritário
Quando se refere ao Governo de António Costa, a Moody’s classifica-o como minoritário e "dependente de três partidos inclinados para a esquerda". Por isso, considera que, "em princípio, opõem-se à austeridade orçamental exigida pelas regras da União Europeia". E alerta, assim, que "os riscos políticos são baixos, mas não tão baixos como no passado".
"Ainda teremos de ver se darão o apoio necessário [ao Governo], caso mais medidas de austeridade sejam exigidas para alcançar o objectivo orçamental deste ano", atiram ainda os analistas. No mesmo sentido, acrescentam, "o orçamento para 2017 poderá também ser uma fonte de desentendimento político".
Debilidade da banca ameaça orçamento
A banca nacional já sofreu várias injecções de capital nos últimos anos, tanto público como privado. Um facto que pesou por várias vezes nas contas públicas e que, defende a Moody’s, continuará a ser uma nuvem negra sobre o Governo. "As repetidas injecções de capital claramente apontam para uma persistente debilidade do sistema bancário português", consideram os analistas Kathrin Muehlbronner e Dietmar Hornung.
"O sector bancário português é e, provavelmente, continuará a ser a principal vulnerabilidade de Portugal", acrescenta a Moody’s, salientando que são uma "fonte de riscos orçamentais". E apesar de a agência de notação financeira destacar que "o novo Governo parece querer resolver alguns dos problemas basilares", a verdade é que há o risco de ter "de injectar de novo capital, desta feita no estatal Caixa Geral de Depósitos".