Outros sites Medialivre
Notícias em Destaque
Notícia

Como a pandemia está a afetar os preços que os consumidores pagam pelos bens agrícolas

A diminuição da procura e a queda dos preços do petróleo devido à pandemia de covid-19 debilitou os preços de algumas matérias-primas da área alimentar e energética. Mas há outras que estão a ser beneficiadas pela corrida a produtos mais vitamínicos ou pelo armazenamento de bens essenciais por parte dos consumidores numa altura em que se verificam constrangimentos nalgumas cadeias de fornecimento e limitações da oferta de países produtores.

Café - Isolamento sustenta preços em alta

Café - Isolamento sustenta preços em alta
O preço do café arábica está a subir no mercado nova-iorquino, sustentado pelas perturbações nas exportações à conta do confinamento decorrente da pandemia. O mesmo acontece com a variedade do robusta, negociado em Londres. A procura continua resiliente, com o aumento das vendas nos supermercados a atenuar a quebra nos restaurantes e cafés. Ainda assim, a Organização Internacional do Café (OIC) receia que o consumo de café possa estagnar ou diminuir face ao crescimento de 2% a 3% anterior à crise, devido ao corte de rendimentos das famílias à conta de uma recessão resultante da covid-19. A OIC sublinhou, num relatório citado pela Bloomberg, que, em média, a queda de 1% no PIB mundial está associada a uma desaceleração de 0,95% no crescimento do consumo de café.

Subida do café depende das empresas

O preço da matéria-prima está em trajetória ascendente, mas para já não há indicação de que os consumidores vão passar a pagar mais pelo café. A Associação Industrial e Comercial do Café (AICC) esclarece ao Negócios que "os preços são estabelecidos por cada empresa", e que por isso "a Associação não pode comentar este assunto sob o risco de ser interpretada como instrumento de fixação de preços, atividade proibida pela Autoridade da Concorrência". Também contactada, a Delta não quis prestar declarações.

Cacau - Chuva traz pressão negativa

Cacau - Chuva traz pressão negativa
A volatilidade do cacau disparou no final da semana passada para máximos de mais de um ano, numa altura em que os operadores avaliam o impacto das condições meteorológicas nas colheitas da África Ocidental e a forma como o novo coronavírus irá impactar o mercado.

Os futuros do cacau subiram no início do ano em Nova Iorque devido aos receios em torno do tempo seco naquela região africana, para depois começarem a descer nos dois últimos meses, à medida que a chuva foi trazendo algum alívio aos agricultores.

Ao mesmo tempo, os operadores estão a tentar perceber de que modo poderá a pandemia afetar a procura de produtos que têm o cacau como ingrediente, como é o caso do chocolate, e se irá perturbar as cadeias de fornecimento.

Chocolate não deve sentir reflexos para já

A indústria do chocolate tem continuado a resistir, apesar de muitas vezes se pressagiar o seu fim devido à erosão dos solos em África, de onde vem 70% da produção (especialmente da Costa do Marfim). O Negócios tentou contactar empresas do setor, nomeadamente a Nestlé, a Mars e a Imperial, mas não obteve respostas até ao fecho. Por regra, existe um hiato temporal entre as variações nas matérias-primas e os preços para os consumidores finais, sendo prática corrente das empresas firmar contratos de médio e longo prazos.

Manteiga - Fecho de escolas e restaurantes castiga

Manteiga - Fecho de escolas e restaurantes castiga
Esta componente gorda do leite, que em 2016 atingiu um preço recorde ao recuperar o estatuto de "produto saudável" - por oposição às gorduras trans (utilizadas, por exemplo, na margarina) -, esteve a perder terreno no ano passado e 2020 não se afigura mais risonho. É que o encerramento dos restaurantes e escolas, à conta da covid-19, está a penalizar fortemente a manteiga - que nos EUA, por exemplo, é essencialmente consumida naqueles estabelecimentos e não tanto em casa. Os futuros da manteiga na bolsa de mercadorias de Chicago negoceiam em mínimos de quase oito anos - e o queijo, outro derivado lácteo, transaciona no nível mais baixo do último ano. O leite segue a mesma tendência, com os analistas inquiridos pela AgWeb a estimarem que o preço possa cair 20% para perto dos níveis da crise de 2008.

Manteiga à espera para ver

É possível que a queda do preço da manteiga venha a ser sentida pelos consumidores, mas ainda é cedo para o afirmar com certeza, refere Fernando Cardoso, secretário-geral da Federação Nacional das Cooperativas de Produtores de Leite (FENALAC). "A transmissão dos preços entre as cotações de matérias-primas, neste caso a manteiga em grosso, e os produtos disponíveis na distribuição para venda ao consumidor final não é imediata", pelo que é necessário "aguardar mais algumas semanas", aponta o responsável.

Sumo de Laranja -Vitamina C volta a “estar na moda”

Sumo de Laranja -Vitamina C volta a “estar na moda”
O preço do sumo de laranja (mais especificamente o concentrado congelado) tem estado a valorizar, com a sua procura a aumentar fortemente neste período de ampla propagação do novo coronavírus, com mais pessoas a procurarem a sua vitamina para terem o organismo mais fortalecido.

Com efeito, o sumo de laranja tem vindo a tornar-se cada vez mais popular, numa altura em que as pessoas estão menos preocupadas com o açúcar e as calorias e mais viradas para a vitamina C.

A menor procura por sumo de laranja que se verificou no ano passado deu agora lugar a um aumento do consumo nesta era de "fique em casa". Só em março, os futuros desta "commodity" dispararam 22%, naquele que foi o ganho mais acentuado desde outubro de 2015.

Sumo de laranja sem impacto a curto prazo

Foi um dos produtos cujo consumo escalou com a pandemia. O sumo de laranja concentrado congelado é nesta altura uma das matérias-primas com mais "vitamina", mas o produto final não está a refletir a subida dos preços. Ao Negócios, fonte do setor adianta que os contratos do sumo de laranja são de longa duração, logo o aumento do preço para os produtores não tem impacto imediato junto do consumidor. Contactada, a Associação Portuguesa das Bebidas Refrescantes Não Alcoólicas refere que "não trabalha informações sobre preços".

Açúcar - O pior trimestre desde agosto de 2018

Açúcar - O pior trimestre desde agosto de 2018
O açúcar está estreitamente ligado à evolução do petróleo, pelo que o panorama geral é de queda, tal como acontece com o "ouro negro". O Commerzbank estima que o preço do açúcar não refinado possa cair até aos 12 cêntimos de dólar por libra-peso no quarto trimestre. "O início da colheita no Brasil deverá trazer mais pressão ao mercado e o açúcar vai herdar muita volatilidade do petróleo e do real", comentou à Bloomberg um analista do Rabobank, Carlos Mera. A valorização do dólar face ao real incentiva um maior volume de exportações do Brasil, para mais numa altura em que a menor procura de biocombustível torna mais apelativo transformar a cana em açúcar em vez de etanol. Entre janeiro e março, o açúcar teve o seu pior trimestre desde 2010, com um mergulho de 20% (para o nível mais baixo desde agosto de 2018).

Açúcar dependente da União Europeia

A queda do preço do açúcar nos mercados internacionais não deverá chegar ao bolso dos portugueses, até porque não é sentida pelas refinarias nacionais. Na prática, não existe uma correlação direta entre a oscilação de preços do mercado mundial e os valores praticados na União Europeia. As regras comunitárias ditam que as empresas devem adquirir a matéria-prima a determinados fornecedores preferenciais. O Negócios tentou contactar a RAR e a Sidul, as duas maiores empresas do setor, que recusaram comentar o tema.

Trigo - Protecionismo alimentar impulsiona cereal

Trigo - Protecionismo alimentar impulsiona cereal
Os preços do trigo estão a subir no mercado de Chicago, com os países a focarem-se em maneiras de salvaguardar a segurança alimentar numa altura de perturbação da oferta devido à pandemia. Muitos exportadores preferem acautelar-se e armazenar o produto para consumo nacional, o que torna o seu fornecimento mais escasso. É o caso da Roménia (segunda maior fornecedora desta gramínea na UE), que já interditou as exportações de cereais para países fora da União Europeia no período de vigência do estado de emergência que deverá prolongar-se pelo menos até meados de maio. Medidas similares foram igualmente tomadas pela Rússia e pelo Cazaquistão. Em Chicago, os futuros do trigo têm estado a ganhar terreno devido à ampla manifestação desta tendência, já apelidada de protecionismo alimentar.

Preço do pão não deve mexer

Apesar da subida do preço do trigo nos principais países exportadores, o pão que chega à mesa dos portugueses não deverá ficar mais caro. A expectativa é de José Palha, presidente da Associação Nacional de Produtores de Cereais, Oleaginosas e Proteaginosas (ANPOC). Por causa da pandemia, os produtores preparam-se para pagar mais pela matéria-prima, mas "o preço da farinha de trigo não tem um peso assim tão grande" no produto final, que depende de custos como a mão de obra ou o processo de transformação.

Arroz - Vendas limitadas içam preços

Arroz - Vendas limitadas içam preços
O arroz tem estado a ser sustentado nos mercados internacionais pela redução na oferta e pelos riscos de perturbação nas cadeias globais de fornecimento, com a Fitch Solutions a rever em alta a previsão para os preços este ano, de 12,5 para 13 dólares por 100 libras-peso. Com a propagação da covid-19 e os governos a implementarem medidas rigorosas para conter o surto, aumenta o risco de escassez da oferta, uma vez que há países, como o Vietname (terceiro maior exportador mundial), que estão a limitar as vendas para salvaguardar o consumo dentro de portas. Isto numa altura em se verifica um aumento generalizado da procura, com os consumidores a acorrerem aos supermercados para abastecerem as suas despensas. Segundo o Conselho Internacional dos Cereais, também a seca na Austrália tem pressionado.

Arroz pode ficar mais caro

A dependência dos mercados externos está a preocupar os produtores nacionais, que já fazem contas ao preço do arroz. Pedro Monteiro, presidente da Associação Nacional dos Industriais do Arroz (ANIA), diz que há uma "forte possibilidade" de os países de origem "restringirem ou proibirem as exportações" para fazerem face às suas próprias necessidades. Portugal já sente "atrasos no comércio internacional e aumentos generalizados" no preço da matéria-prima, o que poderá vir a ter impacto no custo do produto final.

Óleo de Palma - Menor consumo e mais stocks penalizam

Óleo de Palma - Menor consumo e mais stocks penalizam
O preço desta oleaginosa tem vindo a perder força devido aos receios em torno das suas abundantes reservas, especialmente na Malásia, numa altura em que a disseminação da covid-19 e as medidas de confinamento diminuem a procura por este óleo vegetal muito usado para cozinhar (e também é um ingrediente de muitos cosméticos e alimentos processados, como pizzas prontas, bolachas e margarina) e na produção de biodiesel.

Assim, o menor consumo de óleo de palma, a par com um aumento da produção, tem estado a enfraquecer os preços e não se espera, para já, uma mudança de rumo. As cotações desta oleaginosa afundam em torno de 15% desde o início de 2020, "bastante pressionadas pela acentuada queda do consumo de biocombustíveis", refere a Mongabay News. Nos restantes óleos vegetais, a tendência é similar.

Transportes "compensam" queda

Os preços do óleo de palma estão a descer, mas os custos do transporte (marítimo e rodoviário) tendem a subir, nomeadamente devido à menor atividade dos portos por força dos "lockdowns", pelo que o impacto da queda não deverá ainda fazer-se sentir por cá. Existem preços distintos para cada um dos polos de origem das plantações de palma, uma vez que as distâncias até ao consumo final são diferentes, influenciando o preço de venda, sublinha Pedro Cachola na sua dissertação de mestrado sobre a análise de uma cadeia de abastecimento deste óleo vegetal.
  • 2
  • ...

A descida das cotações do crude tem atingido matérias-primas agrícolas utilizadas na produção de biocombustíveis, como é o caso do açúcar, do óleo de palma e do milho - e, no que diz respeito a este cereal, os futuros em Chicago estão em mínimos de 2016, com os EUA a estimarem uma forte queda na produção de etanol.

Mas há também matérias-primas agrícolas que estão a beneficiar das quarentenas e do distanciamento social, devido à maior procura. É o caso do sumo de laranja, com a procura por vitamina C a fazer disparar o consumo desta bebida.

 

Também a limitação das exportações por parte de alguns países, que querem salvaguardar os stocks para consumo nacional, tem feito subir alguns preços, como os do arroz e do trigo.

O confinamento de mais de meio mundo em casa – são mais de quatro mil milhões de pessoas que estão atualmente isoladas – também tem diminuído a mão-de-obra, o que dificulta a colheita e escoamento de produtos, muitos dos quais ficam igualmente retidos nos portos devido à quebra da atividade económica.

Ver comentários
Outras Notícias
Publicidade
C•Studio