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Petróleo: “Os cálculos para as reservas mundiais estão sobrestimados”

Clay Hoes afirma que o pico de produção do petróleo pode chegar já na próxima década. É tempo de começar a investir nas alternativas.

17 de Junho de 2008 às 07:00
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Clay Hoes trabalhou durante anos como geólogo na indústria petrolífera, fazendo a análise de reversas e perfuração, antes de entrar para a gestão de fundos. O especialista espera uma correcção na cotação da matéria-prima, que pode ir até aos 100 dólares. Mas, no longo-prazo, os preços vão continuar a subir, até porque o pico na produção de petróleo pode ocorrer já na próxima década, forçando uma mudança de paradigma.

O tema da energia tem dominado a agenda internacional, com o preço do petróleo a disparar nos últimos meses. Há já quem fale numa “bolha” na cotação da matéria-prima. Isso não significa que as empresas do sector também estão sobreavaliadas?
É preciso olhar para o longo-prazo. Mas, no curto-prazo, há certamente uma sobrevalorização nas acções das petrolíferas. A subida dos 100 dólares por barril para os 139 dólares foi muito rápida. As margens de lucro aumentaram muito significativamente, o que conduziu a revisões em alta das estimativas de resultados para o futuro. Mas é preciso que a cotação do petróleo se mantenha nos valores máximos por algum tempo. Se não houver novas revisões em alta dos lucros, podemos afirmar que as acções das petrolíferas estão sobrevalorizadas. Temos vindo a reduzir a exposição do fundo a estas empresas.

E estão a comprar o quê?
Estamos a reforçar no sector do gás natural. Também estamos a comprar acções de empresas de serviços associados à extracção de petróleo. São estas empresas que vão satisfazer a necessidade de mais extracção.

Espera, então, uma correcção no preço do petróleo?
Espero uma correcção, possivelmente para um nível entre 100 e 90 dólares por barril. Há um ano, a subida de 70 para 90 dólares foi suave e permitiu um ajustamento gradual ao aumento. Mas quando se vai de 70 para quase 140 em apenas nove meses, é muito violento. Vem-nos imediatamente à memória o que aconteceu em 1973 e 1979.

Estamos a atravessar um novo choque petrolífero...
Acho que estamos num choque petrolífero, porque é difícil aumentar a oferta, ao mesmo tempo que a procura está a crescer, não dos países desenvolvidos da Organização para o Desenvolvimento e Cooperação Económica, mas dos emergentes, como a Índia e a China, cuja população representa 40% da população mundial. Além disso, a classe média está a crescer rapidamente nestes países, o que significa mais consumo.

E a oferta não será capaz de responder a esta procura.
Sabendo que estamos a produzir 30,5 mil milhões de barris por ano, o número barris que precisamos de encontrar para repor o que estamos a produzir é difícil de encontrar. Na década passada encontrámos 12 grandes áreas de extracção. Nesta, só encontrámos duas. E quando olhamos para a capacidade tecnológica no sector, encontramos grandes constrangimentos, já que a idade média dos especialistas em geologia que trabalham para as petrolíferas está entre 52 e 55 anos. Estão a chegar ao fim da vida activa e as empresas não estão a conseguir retê-los. Vai haver um esvaziamento de cérebros no domínio geotécnico, que tornará ainda mais difícil manter os níveis de produção.

Fala-se muito de qual será o preço fundamental do petróleo, que resulta apenas do equilíbrio entre a oferta e a procura. Qual é esse valor?
Eu diria que se situa entre os 75 e os 85 dólares. Isto tendo em conta as areias betuminosas, que têm custos de extracção mais elevados.

Mas a correcção no preço do petróleo pode acontecer já até ao fim do ano?
Parte do problema do petróleo e de outras matérias-primas é que exigem projectos de construção e investimento colossais, que estão a tentar ser efectuados todos ao mesmo tempo. Estamos a falar de projectos de extracção de petróleos pesados, areias betuminosas, de produção de fertilizantes, grandes centrais eléctricas a carvão. Para conseguir pôr estes projectos de pé, estamos a exigir uma construção de infra-estruturas colossal. Em toda a parte, toda a gente quer mais metais, mais combustível, mais comida. A procura por engenheiros está a colocar imensa pressão sobre o sector de construção de infra-estruturas. É este cenário que me leva a acreditar que esta bolha nas matérias-primas é de curto-prazo. Vai rebentar e depois retomamos a tendência de valorização dos preços no longo-prazo, suportada pela crescente procura dos países emergentes.

E o que fará a bolha rebentar?
Depende da resposta dos governos. Vários países da Ásia, como a Índia, a Malásia e a Indonésia, já limitaram os subsídios ao preço dos combustíveis por razões orçamentais, deixando-os subir. E isso irá conduzir a uma diminuição do consumo, que poderá desencadear uma correcção.

Dentro de cinco anos onde podem estar os preços do petróleo?
Depois de uma correcção vão voltar a subir, a um ritmo mais lento. Vamos ver preços mais altos no gás natural, onde o fundo estará sempre presente. A procura vai ser fomentada pelas alterações climáticas e o incentivo para a utilização de combustíveis menos poluentes. Com as restrições à emissão de CO2, o gás natural será a solução interina para a produção de electricidade. Acredito que haverá, também, uma maior tolerância em relação ao nuclear e, por isso, temos no fundo uma empresa de Urânio. A China, a Índia e os EUA, que serão os três maiores consumidores de energia do mundo, têm grandes reservas de carvão que quererão explorar, apesar das consequências climáticas.

E qual o papel reservado para as energias alternativas?
Continuarão a ser uma aposta. Nós temos quatro empresas de energia solar e uma de energia eólica no fundo. A questão é que estas energias não produzem fluxos constantes. Só funcionam quando há vento ou sol.

O que não é suficiente para as necessidades.
Não chega. Por isso, vamos continuar a precisar de combustíveis fósseis. Se reduzirmos a procura por petróleo, estaremos a aumentar a utilização de gás natural. Se quisermos substituir o petróleo nos transportes, temos que reduzir o peso dos automóveis, torná-los mais eficientes e passar a utilizar a electricidade. E esta de onde virá? Terá de ser do nuclear ou do carvão. Não pode vir das energias alternativas. Ao fazermos essa substituição, o preço de cada uma dessas energias vai subir. O custo global da energia vai subir, a menos que estejamos na disposição de diminuir o nosso nível de vida. O que agora ninguém está disposto a aceitar. Inevitavelmente, parte da solução terá de vir da poupança de energia.

Tem uma opinião sobre o pico de produção do petróleo?
Sendo um geólogo tenho a minha opinião. A forma como as reservas existentes são calculadas é imprecisa. É baseada em estimativas do que existe a cinco ou dez mil pés abaixo do chão, com base em mapas e dados da perfuração. É pouco rigoroso.

Esses números estão empolados?
Há quatro anos, a Shell empolou os números das suas reservas significativamente e teve de amortizar a diferença no valor dos activos. Estive no Médio Oriente a falar com administradores de petrolíferas sobre o facto de os números das reservas da OPEP não serem transparentes. O nível de tecnologia que esses países estão a exigir das empresas especializadas em perfuração é tremendo. Se o petróleo é tão abundante e fácil de extrair, porque é que os países da OPEP necessitam de tanta tecnologia? Deixa-me preocupado.

É difícil apontar um pico do petróleo?
O campo de Cantorel, no México, já atingiu o pico. O mesmo aconteceu com o Mar do Norte, os EUA e a Indonésia. E eu acho que estamos a atingir esse pico, também, onde existem as maiores reservas conhecidas, dada a tecnologia a que esses países estão a recorrer. Vai ser um problema. Mas não o saberemos até ele aparecer à nossa frente.

Mas estamos a falar de 10, 20 anos?
Provavelmente 10 a 15 anos. Pode ser já durante a próxima década, entre 2020 e 2030. E o modelo já inclui a exploração de outros recursos como as areias betuminosas. E nessa altura os preços do petróleo vão disparar. Mas isso é bom porque nos obrigará a mudar rapidamente para um novo paradigma de energia.

E como será esse paradigma?
Antevejo as casas, as lojas e as empresas equipadas com sensores que activam ou desligam os aparelhos eléctricos à medida que entramos ou saímos das diferentes divisões. Máquinas que operam com níveis muito baixos de energia. Coisas que vemos na ficção científica, que se tornarão realidade muito mais depressa. Teremos vidros que escurecem automaticamente quando o sol incide.

E nos transportes?
A bicicleta? [gargalhadas] Acho que a o nuclear será uma parte importante da solução nas próximas décadas. Os carros terão de ser mais leves e ter um consumo mais eficiente. Serão adoptados os carros híbridos que recarregam ligados directamente a uma tomada de electricidade. As pilhas terão de ter muito maior autonomia, menos peso e ter um impacto ambiental menor. O que ainda não foi pedido à indústria. Agora exige-se que uma pilha permita a um telemóvel ter quatro horas de conversação e não que permita conduzir durante 400 ou 500 quilómetros. Mas isso vai acontecer. É a evolução.


Sobre a alta dos preços

“A culpa é do consumidor”

- “Os fundos de “hedge funds” estão a apontar o dedo a outros especuladores. George Soros foi recentemente ouvido no Senado a propósito da subida do preço e responsabilizou os investidores dos fundos de índices de petróleo pela escalada. Estamos a falar de fundos de pensões, fundos de instituições de ensino e empresas.”

- “O dinheiro investido nesses fundos subiu de 13 mil milhões de dólares em 2003 para 260 mil milhões. Mas, descontando o efeito da valorização dos índices, dá um montante que não é significativo e não justifica o disparo dos preços.”

- “Eu culpo o consumidor. Em termos globais, a procura aumentou muito rapidamente, sobretudo nos mercados emergentes.”


Sobre o brasil

“As dificuldades de extração são tremendas”

- “Estamos à espera de novos dados sobre as reservas existentes na Bacia de Santos. Houve rumores, claramente exagerados. Estamos à espera de novos dados de outros blocos. Mas os preços terão de continuar elevados para que a produção seja rentável, no longo-prazo.”

- “Ainda falta a tecnologia apropriada. Será necessário atravessar uma camada de sal, o que obriga a desenvolver técnicas que tenham um impacto mínimo nesta camada para que não se misture com o petróleo. Mas não só. Será necessário construir um barco de enormes dimensões para aguentar o peso do cabo de extracção. São dificuldades tremendas. Ninguém sabe quais serão os custos, nem o investimento necessário.”


Aposta na inovação para manter retornos



“Gasto muito tempo a olhar para novas tecnologias”, diz Clay Hoes, gestor do fundo American Express Global Energy. E essa é uma das suas estratégias para tentar bater o retorno dos outros fundos: olhar para o futuro.

O antigo geólogo acredita que o novo paradigma da energia passa pela eficiência. Por isso, da “sua” carteira já faz parte, por exemplo, uma empresa de diodos emissores de luz orgânicos, que consomem 100 vezes menos do que um écran de cristais líquidos (LCD). As energias renováveis também marcam presença.

O fundo, criado em Agosto de 2004, e com mais de 150 milhões de dólares sob gestão, não deixa de investir nos sectores mais tradicionais. Mas a forte subida do preço do petróleo levou Clay Hoes a reduzir a exposição às petrolíferas para apostar nas de gás natural, como o BG Group. O gestor acredita que a procura por este combustível “vai ser fomentada pelas preocupações ambientais, assumindo-se como a solução para a produção de electricidade”.

Entre as preferências contam-se ainda as empresas de serviços ligados à extracção, que sofreram uma forte correcção nos últimos meses.

Outra aposta vai para empresas ligadas à extracção de urânio, porque “a tolerância ao nuclear vai aumentar”. Nos últimos três anos, Clay Hoes conseguiu uma rendibilidade anualizada de 28,7% para o fundo.


No topo da rendibilidade do sector

Com uma rendibilidade anualizada próxima de 25% a cinco anos, o fundo especializado no sector da energia gerido pela Invesco é um dos mais fortes disponíveis no mercado português. Perto de 90% da sua carteira de acções está aplicada em empresas da América do Norte. Destacam-se a Occidental Petroleum, a Appache Corporation, a Murphy Oil e a Devon Energy entre as suas posições, todas com um peso superior a 4% na carteira do fundo. Para subscrever, são necessários 1.500 euros e investimento adicionais de 500 euros.


Gigantes norte-americanos dominam

O World Energy aplica os seus investimento em empresas do sector da energia a nível global, incluindo novas tecnologias, concentrando-se nas grandes capitalizações. Exemplo disso é o facto de as três posições accionistas com maior peso na sua carteira pertencerem a três gigantes do sector petrolífero: ExxonMobil, Chevron e BP. Mais de dois terços da carteira está aplicada nos Estados Unidos, seguindo-se o Reino Unido. O montante mínimo de investimento é de mil euros e os mínimos adicionais são no mesmo valor.
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