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Livros de miúdos - negócios de graúdos

Não cresça, ponha a sua imaginação a render. Investir em banda desenhada pode ser o melhor dos dois mundos para si, se é daqueles que começaram a viajar com o Tintin, a citar Júlio César com o Astérix ou a criar máquinas malucas com o Spirou e o Fantásio. Nos quadradinhos, a "bolha" especulativa já passou, e o maior risco para o investimento chama-se humidade. Mas esta é uma aventura que requer tempo e coordenadas certas.

03 de Outubro de 2008 às 06:00
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Antes de "avançar para a loucura", a ideia de Rui Bana da Costa era simplesmente "refazer as colecções de quando era jovem". Hoje tem, pesadas recentemente, um pouco mais de seis toneladas de banda desenhada (BD) distribuídas por várias casas. No "pico da loucura", admite, chegou a ter um apartamento só para os livros, somente habitado pelo Homem-Aranha, o Mickey, o Príncipe Valente e o resto da "família" de super-heróis.

Rui Bana e Costa, antigo administrador da Bolsa de Lisboa e vice-presidente da Cap Gemini Portugal na altura em que decidiu reformar-se, há cerca de três anos, é referenciado como sendo o maior coleccionador de banda desenhada (BD) existente no País. É como tal que se vê, e não como investidor, até porque define Portugal como um "mercado um bocado selvagem", no sentido em que "não é regulado". Mas isso não invalida que não se faça negócio. À conta da mudança para a casa onde se instalou após a reforma, tem actualmente à venda, no Ebay, uma colecção de 52 volumes (17 caixas) da Entertainment Comics por 4.000 libras (pouco mais de cinco mil euros, à cotação actual).

No "pico da loucura", refere, as compras mensais chegavam às 500 revistas/álbuns e os gastos a cerca de 200 contos. Tudo é relativo: passados quase 15 anos sobre essa data, o mesmo coleccionador deu mil euros por apenas dois números do "Gafanhoto", banda desenhada histórica portuguesa. "Sou hoje o único que tem a colecção do ‘Gafanhoto’ toda", diz Bana e Costa, naquele ponto onde a satisfação de coleccionador e investidor se encontram em equilíbrio. Avalia a sua colecção de BD portuguesa em 100 mil euros.

Quadradinhos que valem milhões

"Se a pessoa que vem falar comigo nunca ouviu falar do ‘Papagaio’, do ‘Mosquito’ ou do ‘Gafanhoto’, como é que vai saber em que investir?" A pergunta é de Pedro Silva, um dos dois sócios da livraria especializada BDMania, e dono das editoras Bdmania e VitaminaBD. Os três títulos que menciona são parte da história da banda desenhada portuguesa, e podem revelar-se boas apostas de investimento, mas há que ter em conta que, aqui, o que é potencialmente rentável são colecções inteiras, em bom estado.

Se estamos a falar de multiplicar o preço de capa de uma revista de banda desenhada estilo "comics" norte-americana, de três euros para 20 euros, no Ebay, essa não é uma tarefa difícil, acredita Pedro Silva, que explica: neste tipo de investimento "há factores passionais" que fazem os compradores "ceder a impulsos" e pagar o impensável por um determinado exemplar, como nos cromos.

"Cromices", poderão alguns dizer, se não souberem o valor que atinge hoje o número da revista de BD em que apareceu pela primeira vez o Super-homem (ver caixa): 550 mil dólares em 2006, segundo os números oficiais, mas podendo, hoje, ultrapassar os 1,5 milhões de dólares em venda directa de "sites" especializados. Se é para investir "a sério", Pedro Silva recomenda o mercado norte-americano, orientado por guias de preços anuais. É nos EUA que os 50 títulos listados como sendo os mais caros têm uma rentabilidade, em média, entre 8% e 10% e onde existem vendedores e avaliadores especializados, não neste tipo de literatura, mas neste tipo de investimento.

O mercado está agora em baixa, defende, depois de uma "bolha" na década de 90 que fez com que um "comic" tenha tido uma tiragem de nove milhões de exemplares – "compravam-se duas cópias de cada: uma para ler, satisfazendo a vontade do coleccionador, e outra para meter no saco e guardar", satisfazendo a ambição do investidor. Hoje, o "comic" mais vendido tem uma tiragem de 150 mil exemplares.

Na Europa, a escola franco-belga da BD está um pouco mais desorganizada, porque não vingou a imposição dos guias de preços, como nos EUA. Os valores são mais modestos, mas as rentabilidades igualmente agradáveis: o nº1 do Tintin, que valia, em 1982, 12 mil francos franceses (equivalente a 1,82 mil euros, à taxa de conversão irrevogável fixada em 1998), passou para os 18 mil euros em 2007 – montante que, consoante o estado do exemplar, pode registar uma valorização de 100% a 500%.

Em temos de risco, quer Bana e Costa, quer Pedro Silva concordam que ele é baixo, quase nulo, se depurado de especulação e se se tiver em conta que não há seguro para esse tipo de bens em Portugal. O maior problema são mesmo os factores naturais: humidade, fogo – ou livros avaliados em milhares de euros tornarem-se comida para pequenos insectos devoradores.


Super-homem
Action Comics nº1

O primeiro número da revista "Action Comics", que surgiu um ano antes de começar a Segunda Guerra Mundial, é o título de BD mais caro do mundo referenciado pelos guias de preços norte-americanos. Foi a primeira vez que a personagem do Super-homem, criada por Jerry Siegel e Joe Shuster (que eram pagos a 10 dólares por página entregue), foi apresentada ao público. O valor de capa, de 10 cêntimos de dólar, em Abril de 1938, era já de 2,35 mil dólares em 1971 e de 130,4 mil dólares em 1991. Consta do guia de preços oficiais, com um valor de 550 mil dólares em 2006 (mais 13% do que em 2005). No "site" especializado "Nostomania" aparece já com um valor de 1,8 milhões de dólares, com rentabilidade de 65,8% ao ano, e de 17,9% a cada três meses.


Batman
Detective Comics" nº 27

Embora a "Detective Comics" seja a série mais antiga publicada pela DC Comics (desde 1937), neste caso não é o primeiro número da revista que é o mais valioso. O título de segundo título de BD mais caro do mundo cabe ao número 27, porque foi nessa edição que o Batman apareceu pela primeira vez os leitores, em Maio de 1939. Foi criado por Bob Kane e Bill Finger. O preço de capa de 10 cêntimos de dólar, no original, passou para 2,74 mil dólares em 1971 e para 227,8 mil dólares em 1991. Era de 450 mil dólares em 2006 (mais 10% que em 2005), em números oficiais. O "site" "Nostomania" confere-lhe um valor de 1,72 milhões de dólares, actualmente, com taxas de rentabilidade de 63,8% ao ano, e de 17% a cada três meses.


Cinco passos a seguir

1. Informar-se
Compre um guia de preços ("price guide") anual. Faça perguntas, vá às livrarias especializadas, consulte "sites" estrangeiros, nomeadamente americanos. Aprenda. Entre em contacto com a BD. No próximo dia 24 de Outubro, começa a Feira Internacional de BD da Amadora.

2. Comprar
"Meta-se no avião e dê um salto às lojas nos EUA", diz Pedro Silva. "Perca tempo em alfarrabistas" e "aposte em qualidade", sugere Rui Bana e Costa. As livrarias especializadas continuam a ser importantes, mas a Internet já domina. A Amazon para livros novos, o Ebay para venda directa e oportunidades e "sites" especializados, como o do heritage (www.ha.com, secção "comics"), para leilões.

3. Conservar
A manutenção, condição fundamental para a conservação do valor destes investimentos, é feita através de sacos e caixas ("boxes"), especialmente concebidos para tal, em vácuo. Mais ou menos acidez na composição do invólucro pode valer mais ou menos alguns milhares de euros no espaço de uma década de degradação. Possivelmente vai ter de os mandar vir de fora – os guias de preços têm vários anúncios de vendedores.

4. Avaliar
A análise de um exemplar e a sua graduação (são 25, os graus possíveis, de "pobre" a "gema") devem ser realizadas por uma entidade reconhecida, por ser um "selo de qualidade" que valoriza ainda mais o seu exemplar. Não é de graça – prepare-se para pagar uma comissão. Bana e Costa e Pedro Silva mencionam, ambos, uma única entidade, norte-americana, a CGC, mas o segundo recorda que a norte-americana faz parte de um grupo que negoceia, ele próprio, títulos de BD.

5. Vender
Transformar os "quadradinhos" em dinheiro, sobretudo se os quiser ver devidamente valorizados, pode exigir tempo e paciência, até surgir um interessado à altura. Tem duas opções, assume o risco, o trabalho e o lucro total, e fá-lo por si só, através de venda directa, com ou sem Internet. Ou inclui um intermediário especializado. Aqui não há surpresas – vai pagar igualmente uma comissão.
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