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"Medo e ganância continuam" nos mercados, 90 anos após 'crash' de 1929

Os economistas ouvidos pela Lusa consideram que não há grandes mudanças no perfil dos investidores, 90 anos após a grande queda de Wall Street, mas democratizou-se o acesso aos mercados e reforçaram-se os mecanismos de regulação.

Reuters
22 de Outubro de 2019 às 08:01
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"A condição humana é igual. Os mesmos defeitos como o medo ou a ganância continuam presentes. Mas também as qualidades", comentou Filipe Garcia, economista da IMF -- Informação de Mercados Financeiros, à Lusa.

 

"Não me parece que haja assim tantas diferenças entre os investidores propriamente ditos. O que existe é mais sofisticação e tecnologia em tudo e não é diferente nos mercados, instrumentos, etc. A maior diferença poderá ser, eventualmente que os Estados têm mais poder e influência na economia e isso acaba por influenciar os investidores", acrescentou Filipe Garcia.

 

Pedro Lino, economista da Dif Broker e da Optimize, também referiu, à Lusa, que "os investidores hoje têm acesso a ferramentas que eram impensáveis em 1929, como alavancagem em tempo real, negociação algorítmica, investimento global em tempo real e com uma única conta".

 

"Esta democratização no acesso aos mercados e a baixo custo é o que permite qualquer pessoa investir no mercado", acrescentou.

 

No mesmo sentido, Nuno Caetano, analista da corretora Infinox, referiu que "o acesso mais facilitado à informação permite que os investidores tenham uma maior noção da realidade", sendo que "os mercados também se movem com um maior dinamismo" devido àquele fator.

 

"Fatores como a Inteligência Artificial e a sua utilização nos mercados e nas suas operações faz também acentuar as diferenças entre investidor atual e o investidor de 1929. Hoje em dia, temos muitos investidores a operar também com o auxílio da robótica, o que, por si só, muda radicalmente o paradigma do tipo de investidor de hoje em dia, comparado com o investidor de 1929", acrescentou.

 

Este mês assinalam-se os 90 anos do grande 'crash' de Wall Street, no final de outubro de 1929, que esteve na origem do período designado 'Grande Depressão'.

 

Questionados sobre o que mudou nos últimos 90 anos, Nuno Caetano comentou que "a Internet veio democratizar o acesso aos mercados, onde qualquer investidor de retalho consegue aceder através de corretoras e das suas plataformas", permitindo que "mais pessoas possam aceder a produtos de geografias diferentes, e operar a qualquer momento e de qualquer lugar, através dos muitos produtos derivados que se têm vindo a criar".

 

"Estamos a falar de um período da história com uma guerra mundial, uma guerra fria, mudanças enormes ao nível dos sistemas monetários e cambiais, emergência da União Europeia, etc. e que simplesmente não se pode resumir porque são dezenas de itens de diferenças verdadeiramente importantes", comentou Filipe Garcia.

 

Segundo Pedro Lino, "por um lado, existe agora mais risco, mas por outro há uma concertação de bancos centrais mundiais, que nunca vimos".

 

Os economistas sondados pela Lusa estão de acordo que existe atualmente uma maior regulação dos mercados do que há 90 anos.

 

"Há com certeza uma maior regulação e os reguladores são mais atentos e ativos. No entanto, não creio que se tenha perdido por completo o conflito de interesses que muitas vezes há entre o regulador e os agentes financeiros", afirmou Nuno Caetano.

 

"Sem dúvida que a regulação aumentou muito e decorre do aumento do poder/influência do Estado em todos os aspetos da vida. Essa regulamentação tem aumentado nas últimas décadas", afirmou Filipe Garcia.

 

O economista acrescentou que, a regulamentação, "em parte, é positiva porque impede alguns abusos primários, força o cumprimento de algumas práticas virtuosas e justas, mas também retira liquidez e eficiência aos mercados quando exagerada".

 

"E há indícios que já possamos ter ultrapassado a fronteira da razoabilidade porque vemos um progressivo afastamento de instituições e particulares dos mercados, preferindo fazer negócios fora de bolsa", alertou.

 

Questionados sobre se consideram que pode repetir-se em breve uma nova recessão como a que se registou há pouco mais de 10 anos, Pedro Lino respondeu que, "caso os bancos centrais não estivessem de sobreaviso, poderia acontecer".

 

"No entanto está claro que quer governos quer bancos centrais não irão deixar acontecer uma nova Grande Recessão", frisou.

 

"No último ano temos ouvido alguns economistas a alertarem para o forte abrandamento de algumas economias mundiais, e como resposta temos promessas de estímulos orçamentais e monetários", afirmou o economista, acrescentando que "é mais natural que o ciclo continue por mais alguns anos, suportado na inovação tecnológica nos próximos cinco anos".

 

Nuno Caetano referiu também que "as recentes tensões entre os Estados Unidos e a China escalou e elevou as preocupações para uma possível recessão económica", com os juros baixos e a curva das "yields" a reforçar aquela ideia, assim como a decisão dos bancos centrais em cortar os juros.

 

O analista da Infinox apontou ainda o facto de a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) ter descido a previsão do crescimento mundial, para o menor crescimento desde a crise de 2008, além da incerteza provocada pelo 'Brexit' e pela guerra comercial.

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