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Pare, escute, olhe e trabalhe

Não acontece só aos outros. A precaução e o conhecimento dos seus direitos são a melhor prevenção. Saiba o que se entende por acidente de trabalho, em cinco questões.

18 de Fevereiro de 2020 às 11:30
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E se um dia pudesse subir a construção "como se fosse máquina", ao som do músico brasileiro Chico Buarque? Ou seja, se pudesse trabalhar, mecanicamente, como uma máquina, sem qualquer incidente, sempre com a mesma disposição para a labuta? E que os dias passassem, como uma linha reta, sem qualquer imprevisto? O problema é que somos seres humanos. Estamos sujeitos a acidentes. Quando eles ocorrem no local de trabalho, ou a caminho dele, estamos protegidos pela lei. Nunca subimos a construção como se fôssemos máquinas. Mas temos de saber como se define um acidente de trabalho. E também como se apuram as responsabilidades e que direitos temos, entre outras questões. Trabalhemos, então, este tema.

O que é um acidente de trabalho?

Como quase sempre acontece numa profissão, é o tempo em que estamos consagrados a ela que define tudo, ou quase tudo. Um acidente de trabalho é considerado como tal se ocorrer no local, durante o tempo dedicado à atividade profissional, ou no trajeto casa-emprego e inverso.

Mas atenção: tem de haver consequências desse acidente. A lei define uma lesão corporal ou uma doença que origine uma redução da capacidade de trabalho ou de ganho. Ou, em casos mais extremos, que leve à morte do trabalhador.

Já vimos o que é um acidente. Falta definir o "onde". O acidente ocorre no local de trabalho, ou seja, todo o lugar onde o trabalhador se encontre ou para onde deva dirigir-se em função da sua atividade e em que esteja, direta ou indiretamente, sujeito ao controlo da entidade patronal.

Definido o espaço, falta o tempo: abrange não só o período dito "normal" de trabalho (por exemplo, as oito horas por dia, num horário convencional, das nove da manhã às seis da tarde), mas também, como referimos, o tempo do trajeto casa-emprego e inverso. Não ficam de parte, tão-pouco, as interrupções, normais ou excecionais, como a pausa para o almoço, por exemplo, ou as deslocações para receber uma encomenda que venha de fora da empresa.

E há que considerar, ainda, outras situações, como reuniões ou atividades enquanto representante dos trabalhadores, seja na empresa ou noutro local. E ainda uma formação profissional, no local de trabalho ou fora dele, com autorização do empregador. Ou festas organizadas pela empresa e que contem com a participação dos trabalhadores.

O mesmo se aplica a quem tenha trabalho fora do escritório, ou esteja a desempenhar a sua atividade a desoras, desde que esse serviço tenha sido indicado, ou consentido, pelo empregador.

A ideia de trajeto inclui o que se faz até ao local de refeição; ou entre locais de trabalho, para quem tem mais do que um emprego. Neste caso, é responsável o empregador do local de trabalho para onde o trabalhador se dirige.

E até, azar dos Távoras, se o trabalhador que estiver a receber assistência ou tratamento devido a um acidente anterior sofrer novo acidente, mas a caminho do local onde lhe é dada essa assistência...

O percurso é, aliás, um conceito abrangente. Considera-se também acidente de trabalho algo que aconteça ao trabalhador que se desvie do caminho para o emprego, por ter, por exemplo, de levar os filhos à escola, "fintar" o trânsito, ou, simplesmente, se se enganar no trajeto.

Mesmo quem está em vias de perder o emprego é contemplado: num processo de despedimento coletivo, por inadaptação ou extinção do posto de trabalho, enquanto ainda se encontra ligado à empresa, o trabalhador tem um crédito de horas para poder ir à procura de emprego. Se sofrer um acidente nesta fase, mantém os seus direitos intactos. Afinal, apesar de estar de saída, ainda é funcionário da empresa.

Às vezes, as consequências do acidente não se manifestam logo. Se ocorrerem mais tarde, terá de ser o trabalhador, os seus representantes ou, em caso de morte, os herdeiros, a demonstrar que a causa foi o acidente.

De quem é a culpa?

O conceito é amplo, quando se trata de apurar responsabilidades por um acidente durante o tempo de trabalho. Comecemos pelo empregador. Além dele, pode ser um representante ou outra empresa a quem se tenha feito a subcontratação de um ou de vários trabalhos o causador do acidente. Qualquer destas situações está salvaguardada na lei quando se prova que quem contrata desrespeitou ou ignorou as regras de segurança e saúde no trabalho.

Há vários exemplos possíveis. O mais grave pode ter consequências nefastas. Imaginemos que o trabalhador cai de um edifício em obras, pelo facto de o empregador não ter instalado pontos de segurança em andaimes, por exemplo.

A lei diz que quem emprega tem de indemnizar quem trabalha - e os seus familiares - por todos os danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos. Nos casos mais extremos, pode haver responsabilidade penal do empregador, ou seja, poderá ser acusado de um ou mais crimes.

OUTRAS PRESTAÇÕES

Adaptar e reabilitar

Subsídio por elevada incapacidade permanente
Pago de uma só vez. Tem direito quem fica com incapacidade permanente absoluta ou parcial superior a 70 por cento. O valor do subsídio varia consoante a situação:

Incapacidade permanente absoluta para todo e qualquer trabalho: 12 vezes 1,1 o valor do indexante dos apoios sociais (IAS), 5.792,29 euros, em 2020.

Incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual: entre 70% e 100% de 12 vezes 1,1 IAS (4.054,60 euros a 5.792,29 euros, em 2020).

Incapacidade permanente parcial igual ou superior a 70%: 12 vezes 1,1 IAS pelo grau de incapacidade fixado. Por exemplo, para uma incapacidade de 60%, será de 3.475,37 euros (5.792,29 euros x 60%, em 2020).

Subsídio para readaptação de habitação
Destinado às despesas com obras em casa, para a adaptar à condição do trabalhador. Poderá aceder quem tenha ficado permanentemente incapacitado. Cobre o valor das despesas, até 12 vezes 1,1 IAS (5.792,29 euros, em 2020).

Subsídio para reabilitação profissional
Pagamento de despesas com ações para recuperar capacidades profissionais. O montante mensal corresponde ao valor das despesas com a frequência.


Em situações graves, compete à entidade patronal pagar uma pensão anual ou uma indemnização diária, para compensar a redução na capacidade de trabalho ou de ganho, ou a morte, de acordo com as consequências do acidente. Nos quadros desta página pode ver os valores da indemnização e de outras prestações a que o trabalhador tem direito.

Nos acidentes em que não há responsabilidade direta do empregador, são as seguradoras que se chegam à frente com os pagamentos.

Mas há casos em que a companhia de seguros pode lavar daí as suas mãos. Por exemplo, quando o trabalhador é gravemente negligente e, por isso, tem a responsabilidade pelo acidente. Ou quando desrespeita, sem justificação, as condições de segurança definidas pelo empregador ou previstas na lei, ou está privado de lucidez para executar o trabalho. Se beber em excesso no horário de refeição, por exemplo, pode juntar todos os problemas que descrevemos atrás... Mas o empregador será responsabilizado se conhecer o estado do trabalhador e, mesmo assim, o autorizar a desempenhar as suas funções.

O acidente pode, ainda, ter um motivo de força maior, como catástrofes naturais, que o seguro não cobre.

O que fazer?

Acione o seguro o quanto antes. A participação ao empregador deve ser feita no prazo de 48 horas, a não ser que aquele tenha conhecimento do acidente ou o tenha presenciado.

Se o estado do trabalhador não o permitir, o prazo começa a contar assim que esteja em condições de acionar o seguro. Caso a lesão apenas se revele numa data posterior à do acidente, o prazo inicia-se nessa data. Se o acidente for fatal, os herdeiros (ou os beneficiários do seguro) têm de o participar, verbalmente ou por escrito, no mesmo prazo.

Depois de ter conhecimento do acidente, a empresa dispõe de 24 horas para participar à seguradora. Caso o trabalhador não esteja protegido pelo seguro (o que é ilegal), o empregador tem de informar o tribunal, por escrito, no prazo de oito dias a partir da data do acidente ou do conhecimento que dele teve. Em caso de morte, tem de ser comunicado de imediato.

Que direitos tem o trabalhador?

Se as consequências do acidente se traduzirem em lesões, a lei abre as portas a cuidados médicos, cirúrgicos, farmacêuticos, hospitalares e outros que sejam necessários para o restabelecimento. Em princípio, quem designa o médico que acompanhará todo o processo é a entidade patronal ou a seguradora. Mas, em caso de urgência, o trabalhador pode recorrer a qualquer médico.

E há outros direitos, mas em dinheiro: indemnizações, pensões, prestações complementares e subsídios. O trabalhador também tem o direito ao transporte e, se necessário, ao alojamento em deslocações e permanência para observação e tratamento.

O acidentado ainda pode incluir a fatura do tratamento psicológico, se este for necessário para a sua recuperação. E tem direito ao pagamento das despesas por comparência em atos judiciais relacionados com o processo.

Note que, mesmo que o trabalhador passe a ter uma capacidade reduzida, o empregador é obrigado, em princípio, a mantê-lo ao serviço.

E em caso de morte?

Certo é que os acidentes de trabalho mortais têm vindo a diminuir no nosso país (ver página anterior). Perante um desfecho fatal, os familiares têm direito a pensão: o cônjuge ou a pessoa que com ele vivesse em união de facto; o ex-cônjuge que recebesse pensão de alimentos e os ascendentes a seu cargo; os filhos e adotados menores, ou até aos 22 anos, se frequentarem o ensino secundário, e até aos 25 anos, se estiverem a tirar curso superior. Não há limite de idade se sofrerem de deficiência ou doença crónica que afete consideravelmente a sua capacidade para o trabalho.

Indemnizações e pensões 

Incapacidade permanente e absoluta para qualquer trabalho: pensão vitalícia igual a 80% da retribuição do trabalhador, mais 10% por cada pessoa a cargo. O limite é o salário antes auferido.

Considera-se a cargo o cônjuge, o unido de facto ou outra pessoa que viva com o trabalhador e tenha rendimentos inferiores ao valor da pensão social (211,79 euros, em 2020). Também o são os ascendentes (pais, avós, sogros), e o padrasto e a madrasta, nas mesmas condições. E ainda os descendentes menores, ou até aos 22 anos, se frequentarem o ensino secundário ou equiparado, ou até aos 25, se forem estudantes do ensino superior ou equivalente. Se sofrerem de deficiência, não há limite de idade.

Mas, se a incapacidade for absoluta só para o trabalho habitual, há direito a pensão vitalícia entre 50% e 70% da retribuição, conforme a maior ou menor capacidade para o exercício de outra profissão.

Se o trabalhador ficar incapaz de forma permanente, mas parcial, tem direito a pensão vitalícia igual a 70% da redução sofrida na capacidade de ganho.

Já se a incapacidade for temporária absoluta, recebe uma indemnização igual a 70% da retribuição nos primeiros 12 meses e 75% depois.

Face a incapacidade temporária parcial, a indemnização é igual a 70% da redução sofrida na capacidade geral de ganho. 


Qual o valor da pensão? Varia, de acordo com quem a ela tiver direito. Os familiares recebem também o subsídio por morte, pago de uma só vez. O montante obtém-se multiplicando 12 por 1,1 do valor do indexante dos apoios sociais (438,81 euros), ou seja, 5.792,29 euros, em 2020. Metade é atribuída ao cônjuge, ao ex-cônjuge ou ao unido de facto, e outra metade aos filhos com direito a pensão. O ex-cônjuge só recebe se tiver direito a pensão de alimentos, mas este valor não pode exceder 12 vezes a pensão mensal que lhe era paga.

Caso ninguém tenha direito a subsídio por morte, as despesas de funeral serão pagas a quem provar tê-las suportado. O montante a receber tem um limite de 1.930,76 euros, à tabela de 2020.

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