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Carnaval: a crise bateu o pé ao samba brasileiro
O Brasil enfrenta uma das maiores crises da sua história. Os indicadores económicos não deixam motivos para celebrar. O Carnaval sai às ruas. Com um sorriso tímido nos rostos.
Porto Ferreira, no Estado de São Paulo, cancelou os festejos de Carnaval. A prefeitura optou por utilizar os 120 mil reais (27.500 euros) dos festejos para a compra de uma ambulância. Campinas, no mesmo Estado, vai poupar outros 1,3 milhões de reais (300 mil euros) neste Carnaval.
São apenas dois exemplos das cinco dezenas de cidades em que os poderes públicos decidiram cancelar as celebrações. Porque o país está em crise, política e económica. A festa não vai parar, até porque o espírito brasileiro o impede. Mas a grandiosidade não vai sambar nas ruas.
O Goldman Sachs diz que o país está uma "trapalhada". Os indicadores económicos parecem comprová-lo. O PIB deverá encolher à volta de 3%. Mesmo em ano de Jogos Olímpicos, que arrancam daqui a seis meses.
Apesar da recessão, a inflação está em níveis limite, aproximando-se dos 11%. É o nível mais alto desde 2002. O desemprego também se situa nos dois dígitos, atingindo agora também o sexo masculino de meia-idade. Antes eram as mulheres e os jovens as principais vítimas. No último ano, foram eliminados 1,5 milhões de postos de trabalho. Os analistas acreditam que este ano pode juntar-se outro milhão.
Os cortes na Petrobras irão engordar este número. É precisamente o escândalo de corrupção na petrolífera estatal – o caso Lava Jato - a ditar grande parte da fragilidade sentida pelo executivo da Presidente Dilma Rousseff. O pedido de "impeachment" [impugnação] está a ser analisado.
Nem o próprio partido de Dilma, o PT, lhe dá "luz verde" para as medidas de austeridade que vai propondo. O novo ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, tem como difícil missão conter o défice. Uma das suas ideias passa por introduzir uma taxa sobre as transacções financeiras.
A desaceleração da economia chinesa, com impacto imediato nas exportações brasileiras muito dependentes daquele país, e a forte desvalorização do real não ajudam a ter motivos para celebrar. Mas o país não desiste de um dos seus mais fortes cartões de visitas, o Carnaval. Só no Rio de Janeiro, esta época representa cerca de um milhão de turistas.
As escolas de samba queixam-se dos cortes nos apoios públicos, as lojas de fantasias queixam-se da falta de procura (nem as máscaras de políticos vendem como outrora), os foliões queixam-se do real fraco para comprar os materiais de qualidade no estrangeiro para os seus fatos.
Será mais triste o Carnaval de 2016. E com motivos para preocupação: além do dengue, o Brasil é um dos países mais afectados pelo vírus zika. O Governo brasileiro comprometeu-se a lutar contra esta epidemia e garantiu que não vai olhar a custos. A Bloomberg fala em mil milhões de reais (230 milhões de euros) em campanhas de informação e entrega de repelente.
Mesmo com este cenário, a procura portuguesa por este destino no Carnaval parece não ter abrandado. Pelo contrário. A Viagens Abreu, uma das maiores redes de agências de viagens em Portugal, regista um crescimento da procura. "Na comparação com o período homólogo, no Brasil houve um ligeiro crescimento", garantiu o porta-voz da empresa ao Negócios.
A festa já arrancou. O Sambódromo vai encher-se de cores, sons e movimento. Os corpos vão mostrar-se perante o calor do Verão brasileiro. E, no meio da agitação, surgirão as palavras de Vinicius de Moraes: "Tristeza não tem fim. Felicidade sim". O Carnaval passa, as dúvidas ficam.