Notícia
Inovar em sectores tradicionais
Vestuário, calçado e lazer são três sectores tradicionais da economia portuguesa. Mas o carimbo não significa que a inovação esteja afastada destas actividades. Conheça três casos reais que ajudam a provar que a tradição já não é o que era.
02 de Julho de 2009 às 15:33
Joaquim Moreira renega os 58 anos que o bilhete de identidade diz que tem. "Eu tenho é 30 anos", lança, numa conversa ao telefone com o Negócios. "Mas está aqui uma funcionária minha a dizer que, na verdade, eu tenho é 30 anos em cada perna", brinca o empresário, dono da Felmini e um homem bem-disposto que tem uma palavra apenas para resumir isso de ter sucesso - "inovar". "Só com coisas novas é que vamos lá."
A Felmini foi lá. Com sede em Felgueiras, esta empresa têxtil a caminho dos 36 anos de actividade revolucionou o mundo das botas para senhora com um processo de fabrico muito particular, que permite ter múltiplas cores numa mesma linha de produção.
À semelhança da Felmini, não faltam exemplos de empresas de sectores tradicionais que inovam a oferta aplicando a tecnologia, a investigação ou a imaginação. Só muda a forma: por um lado, há quem crie empresas novas para inovar nos sectores tradicionais; por outro lado, há quem tenha empresas aparentemente tradicionais e esteja a inovar por via dos métodos de produção e da investigação.
Certo é que a inovação não se resume à vanguarda do mundo dos computadores e afins. Está no têxtil, no calçado, na restauração e está onde nem sempre aprendemos a percepcioná-la. Basta olhar com atenção e o acto de olhar inclui os sectores mais tradicionais do país. Já dizia "O Livro dos Conselhos": "Se podes olhar, vê. Se podes ver, repara."
Fazer dos pés uma tela colorida
Joaquim Moreira é um homem ocupado. As vendas vão bem e há que trabalhar. A sua Felmini facturou oito milhões de euros no ano passado e espera facturar 10 milhões em 2009.
Na base de tanta agitação e de um volume de negócios a subir, anda sobretudo uma inovação que esta empresa têxtil de Felgueiras implementou há pouco mais de um ano. Depois de uma série de conversas internas, a que se sucedeu um período de testes ao nível dos métodos de produção, a Felmini conseguiu desenvolver um sistema de produção em que consegue ter várias cores diferentes numa mesma linha de produção de botas para senhora (o calçado feminino é o "core" do negócio).
"Conseguimos ter cerca de 20 cores diferentes na mesma linha de produção. Produzimos cerca de 1.100 a 1.200 botas por dia, todas têm um acabamento personalizado e é possível ter uma das tais 20 cores distintas. Ou seja, cada produto é único devido ao acabamento e há uma etiqueta no produto final a dizer isso ao cliente", conta Joaquim Moreira.
A Felmini leva mais de três décadas de vida, está num sector a que o senso comum chama muitas vezes "tradicional", mas tem um dono com um lema muito simples. "Só com coisas novas é que vamos lá", sublinha Joaquim Moreira, a justificar o porquê de procurar esta solução para ter botas de múltiplas cores e financeiramente viáveis do ponto de vista produtivo.
O leque cromático que o novo método de produção assegura é extenso. "Há de tudo um pouco, desde botas com tom gasto, a pares amarelos, vermelhos e violeta, entre outros", enuncia Joaquim Moreira. Os preços variam entre 50 e 55 euros e os maiores consumidores estão lá fora. França e Itália estão entre os mercados onde o produto entrou com mais sucesso, a que se juntam Alemanha e Japão, entre outros.
Joaquim Moreira diz que há novidades a caminho para voltar a inovar neste universo do "calçado para senhora jovem" (é assim que o empresário define o seu mercado), mas o ponto de partida será o mesmo. "Inovar sempre e constantemente. Só assim é que seremos diferentes", remata o empresário de Felgueiras, um homem que faz dos pés femininos uma tela colorida.
Algas, prata e têxteis inteligentes
É uma combinação improvável, mas é o alicerce de um negócio que espera facturar três milhões de euros em 2011: junta-se algodão, prata e algas e o resultado é roupa interior. Os empreendedores por detrás da New Textiles, uma "spin-off" que despontou na Universidade do Minho, sabem que a combinação resulta.
Mas chegar a esta junção improvável não foi um acaso. Quando criaram o negócio, os três gerentes da empresa, Cláudio Carvalheira, Armindo Mirante e Pedro Pinto, definiram logo dois pontos de partida: criar têxteis funcionais (há quem lhes chame "os têxteis inteligentes) e colocá-los no mercado sempre em canais comerciais especializados. Definida a base, e a partir de investigação articulada com a Universidade do Minho, a New Textiles lançou-se em Maio de 2008 com uma linha de roupa interior que é vendida em farmácias.
A singularidade desta linha de roupa, que vai desde pijamas até "boxers", é que tem particularidades calmantes, porque o uso das algas permite atenuar problemas como comichões, e actua como anticéptico, possível devido à prata. No fundo, é roupa que socializa com o corpo e que o entende.
"A política da empresa é a de lançar no mercado dois novos produtos por ano ou um produto novo e melhorar um já existente", conta Cláudio Carvalheira, antes de explicar a novidade que aí vem para a linha de roupa já existente. "No que toca a estes produtos que já temos no mercado, temos uma melhoria preparada: além das propriedades que já têm, vão passar a ter propriedades de termorregulação, para manter o corpo a 37 graus, e de gestão de humidade", avança o gerente da New Textiles.
Enquanto estas novidades não chegam ao mercado, a empresa está já a fazer contactos para começar a exportar os seus produtos. Espanha será o primeiro país na aventura de voar lá para fora com os têxteis que falam com o corpo.
A hipótese de fazer produtos para outros sectores de actividade, nomeadamente para a construção civil e para a agricultura, também está a ser discutida. E, na base de todos estes planos, está o algodão, a prata e as algas. O improvável pode mesmo dar dinheiro.
Scolari foi esquimó em Viseu
Esta é uma inovação gelada. Os autores do conceito, australianos, chamam-lhe "the coolest experience". E este é um lema de duplo sentido: "coolest" de "porreiro", mas também de "frio". Que o diga Viseu, que faz parte de um lote restrito de seis localidades em todo o mundo a dispor do "Minus 5º Ice Lounge". E o que é isto, além de ser a causa do tal lema de duplo sentido?
Nada mais do que um bar, mas que é todo feito de gelo, das mesas a todos os detalhes da decoração, importado directamente dos glaciares do Canadá. Em Portugal, é o grupo Visabeira que explora o conceito e o bar está integrado no Palácio de Gelo de Viseu. Bar e palácio foram feitos um para o outro e era isso que a empresa portuguesa queria quando decidiu importar a ideia.
"Ir ao bar é uma experiência por si só", resume José Arimateia, do grupo Visabeira. Em abono da meteorologia, diga-se que a experiência é fria - a temperatura anda entre os cinco e os 12 graus negativos -, mas o exotismo é a propósito.
Quem visitar o bar, recebe desde logo um "kit" esquimó, constituído por luvas, um casaco e umas botas, se for caso disso. É uma outra forma de viver a experiência da restauração e aqui a inovação é sobretudo imaginação.
Quando se entra no "Minus 5º Lounge" recebe-se ainda um "pager". É que a visita, dizem os donos do bar, deve durar apenas 30 minutos e a função do "pager" é a de alertar para os tempos. Ao fim de 25 minutos de estadia no bar, ouve-se um "bip" de alerta e, finda a meia-hora, surge um novo "bip", a alertar que é tempo de sair para evitar escaldões gélidos. "Isto do 'pager' é sobretudo 'marketing', porque pode-se ficar mais tempo. Mas, assim, adensa-se a experiência", sustenta José Arimateia.
Inaugurado em Abril do ano passado, o bar recebeu a visita de Scolari e da sua equipa técnica quando a selecção estagiou em Viseu antes do Europeu de 2008. "Foi engraçado tê-los cá. A visita correu muito bem e estavam todos bem-dispostos - afinal, ainda havia aquela expectativa toda para o Euro", lembra o responsável da Visabeira. Nota final neste capítulo mais fresquinho: quem já esteve lá, diz que não dá para consumir de tudo no bar, porque há bebidas que congelam. A cerveja é uma delas.
A Felmini foi lá. Com sede em Felgueiras, esta empresa têxtil a caminho dos 36 anos de actividade revolucionou o mundo das botas para senhora com um processo de fabrico muito particular, que permite ter múltiplas cores numa mesma linha de produção.
Certo é que a inovação não se resume à vanguarda do mundo dos computadores e afins. Está no têxtil, no calçado, na restauração e está onde nem sempre aprendemos a percepcioná-la. Basta olhar com atenção e o acto de olhar inclui os sectores mais tradicionais do país. Já dizia "O Livro dos Conselhos": "Se podes olhar, vê. Se podes ver, repara."
|
Fazer dos pés uma tela colorida
Joaquim Moreira é um homem ocupado. As vendas vão bem e há que trabalhar. A sua Felmini facturou oito milhões de euros no ano passado e espera facturar 10 milhões em 2009.
Na base de tanta agitação e de um volume de negócios a subir, anda sobretudo uma inovação que esta empresa têxtil de Felgueiras implementou há pouco mais de um ano. Depois de uma série de conversas internas, a que se sucedeu um período de testes ao nível dos métodos de produção, a Felmini conseguiu desenvolver um sistema de produção em que consegue ter várias cores diferentes numa mesma linha de produção de botas para senhora (o calçado feminino é o "core" do negócio).
"Conseguimos ter cerca de 20 cores diferentes na mesma linha de produção. Produzimos cerca de 1.100 a 1.200 botas por dia, todas têm um acabamento personalizado e é possível ter uma das tais 20 cores distintas. Ou seja, cada produto é único devido ao acabamento e há uma etiqueta no produto final a dizer isso ao cliente", conta Joaquim Moreira.
A Felmini leva mais de três décadas de vida, está num sector a que o senso comum chama muitas vezes "tradicional", mas tem um dono com um lema muito simples. "Só com coisas novas é que vamos lá", sublinha Joaquim Moreira, a justificar o porquê de procurar esta solução para ter botas de múltiplas cores e financeiramente viáveis do ponto de vista produtivo.
O leque cromático que o novo método de produção assegura é extenso. "Há de tudo um pouco, desde botas com tom gasto, a pares amarelos, vermelhos e violeta, entre outros", enuncia Joaquim Moreira. Os preços variam entre 50 e 55 euros e os maiores consumidores estão lá fora. França e Itália estão entre os mercados onde o produto entrou com mais sucesso, a que se juntam Alemanha e Japão, entre outros.
Joaquim Moreira diz que há novidades a caminho para voltar a inovar neste universo do "calçado para senhora jovem" (é assim que o empresário define o seu mercado), mas o ponto de partida será o mesmo. "Inovar sempre e constantemente. Só assim é que seremos diferentes", remata o empresário de Felgueiras, um homem que faz dos pés femininos uma tela colorida.
|
Algas, prata e têxteis inteligentes
É uma combinação improvável, mas é o alicerce de um negócio que espera facturar três milhões de euros em 2011: junta-se algodão, prata e algas e o resultado é roupa interior. Os empreendedores por detrás da New Textiles, uma "spin-off" que despontou na Universidade do Minho, sabem que a combinação resulta.
Mas chegar a esta junção improvável não foi um acaso. Quando criaram o negócio, os três gerentes da empresa, Cláudio Carvalheira, Armindo Mirante e Pedro Pinto, definiram logo dois pontos de partida: criar têxteis funcionais (há quem lhes chame "os têxteis inteligentes) e colocá-los no mercado sempre em canais comerciais especializados. Definida a base, e a partir de investigação articulada com a Universidade do Minho, a New Textiles lançou-se em Maio de 2008 com uma linha de roupa interior que é vendida em farmácias.
A singularidade desta linha de roupa, que vai desde pijamas até "boxers", é que tem particularidades calmantes, porque o uso das algas permite atenuar problemas como comichões, e actua como anticéptico, possível devido à prata. No fundo, é roupa que socializa com o corpo e que o entende.
"A política da empresa é a de lançar no mercado dois novos produtos por ano ou um produto novo e melhorar um já existente", conta Cláudio Carvalheira, antes de explicar a novidade que aí vem para a linha de roupa já existente. "No que toca a estes produtos que já temos no mercado, temos uma melhoria preparada: além das propriedades que já têm, vão passar a ter propriedades de termorregulação, para manter o corpo a 37 graus, e de gestão de humidade", avança o gerente da New Textiles.
Enquanto estas novidades não chegam ao mercado, a empresa está já a fazer contactos para começar a exportar os seus produtos. Espanha será o primeiro país na aventura de voar lá para fora com os têxteis que falam com o corpo.
A hipótese de fazer produtos para outros sectores de actividade, nomeadamente para a construção civil e para a agricultura, também está a ser discutida. E, na base de todos estes planos, está o algodão, a prata e as algas. O improvável pode mesmo dar dinheiro.
|
Scolari foi esquimó em Viseu
Esta é uma inovação gelada. Os autores do conceito, australianos, chamam-lhe "the coolest experience". E este é um lema de duplo sentido: "coolest" de "porreiro", mas também de "frio". Que o diga Viseu, que faz parte de um lote restrito de seis localidades em todo o mundo a dispor do "Minus 5º Ice Lounge". E o que é isto, além de ser a causa do tal lema de duplo sentido?
Nada mais do que um bar, mas que é todo feito de gelo, das mesas a todos os detalhes da decoração, importado directamente dos glaciares do Canadá. Em Portugal, é o grupo Visabeira que explora o conceito e o bar está integrado no Palácio de Gelo de Viseu. Bar e palácio foram feitos um para o outro e era isso que a empresa portuguesa queria quando decidiu importar a ideia.
"Ir ao bar é uma experiência por si só", resume José Arimateia, do grupo Visabeira. Em abono da meteorologia, diga-se que a experiência é fria - a temperatura anda entre os cinco e os 12 graus negativos -, mas o exotismo é a propósito.
Quem visitar o bar, recebe desde logo um "kit" esquimó, constituído por luvas, um casaco e umas botas, se for caso disso. É uma outra forma de viver a experiência da restauração e aqui a inovação é sobretudo imaginação.
Quando se entra no "Minus 5º Lounge" recebe-se ainda um "pager". É que a visita, dizem os donos do bar, deve durar apenas 30 minutos e a função do "pager" é a de alertar para os tempos. Ao fim de 25 minutos de estadia no bar, ouve-se um "bip" de alerta e, finda a meia-hora, surge um novo "bip", a alertar que é tempo de sair para evitar escaldões gélidos. "Isto do 'pager' é sobretudo 'marketing', porque pode-se ficar mais tempo. Mas, assim, adensa-se a experiência", sustenta José Arimateia.
Inaugurado em Abril do ano passado, o bar recebeu a visita de Scolari e da sua equipa técnica quando a selecção estagiou em Viseu antes do Europeu de 2008. "Foi engraçado tê-los cá. A visita correu muito bem e estavam todos bem-dispostos - afinal, ainda havia aquela expectativa toda para o Euro", lembra o responsável da Visabeira. Nota final neste capítulo mais fresquinho: quem já esteve lá, diz que não dá para consumir de tudo no bar, porque há bebidas que congelam. A cerveja é uma delas.