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O peso do sismo na economia da Turquia e da Síria

Além da catástrofe humana, os turcos vão ter de lidar com os impactos económicos do sismo. Destruição de áreas agrícolas deve fazer subir preços ainda mais, depois de no ano passado a inflação ter atingido 65%. Mas a política “pouco ortodoxa” de Erdogan também.
Susana Paula, Vítor Rodrigues Oliveira e Hugo Neutel 18 de Fevereiro de 2023 às 12:00

Depois de ter fechado o ano passado com uma inflação de quase 65%, a Turquia pode enfrentar uma nova subida acentuada de preços este ano, pelos impactos do sismo que afetou o país.

Mais de 51 mil pessoas morreram no sismo que há dez dias atingiu fortemente a Turquia e a Síria e, embora o foco imediato esteja nas operações de resgate, o duplo terramoto abanou uma economia que já estava muito fragilizada.

“Este desastre abateu-se sobre a economia turca numa altura em que o clima económico já estava fragilizado”, comenta Nick Stadtmiller, analista da Medley Global Advisors, citado pela Bloomberg. “E aumenta o risco de outros problemas, das vulnerabilidades preexistentes”, acrescenta.

No final do ano passado, a economia turca estava já debilitada por uma lira completamente desvalorizada e uma inflação galopante, que deixaram mais de dois terços dos turcos com dificuldade em pagar as suas necessidades de alimentação e habitação, de acordo com um inquérito do instituto de investigação turco Yöneylem.

Mas vamos por partes, desde 2013 que a moeda turca tem perdido valor, mas em 2022 afundou para níveis nunca vistos, entrando numa espiral de desvalorização: em dezembro, um dólar valia 19 liras turcas (o dobro do ano anterior). E, claro, uma das principais consequências desta desvalorização é a inflação. Quando as moedas caem em valor, os bens importados tornam-se mais caros. Com a maioria dos países a importar bens, como combustíveis, matérias-primas e tecnologia, as moedas mais fracas representam preços mais altos.

O instituto turco de estatística reportou que a inflação no país atingiu um máximo de 25 anos em outubro passado (85,5%), embora analistas independentes apontem para valores ainda mais altos.

As empresas turcas foram afetadas pela queda no valor da lira, que fez com que os custos de produção disparassem, enquanto as famílias viram os seus salários reais, descontando a inflação, cair a pique, com fortes perdas de poder de compra.

No entanto, e ao contrário do que acontece com outras economias, o banco central turco optou por baixar as taxas de juro em 500 pontos-base (de 14% para 9%) ao longo do ano passado, o que deixou os preços desancorados e contribuiu para que a Turquia tenha fechado o ano passado com uma das maiores taxas de inflação do mundo. As taxas de juro baixas no país numa altura de inflação galopante devem-se a uma leitura “menos ortodoxa” da política monetária pelo Presidente turco, apontam vários analistas. No passado, o dinheiro barato na economia pode ter ajudado Recep Tayyip Erdogan a ganhar eleições. E a proximidade da próxima ida às urnas pode estar a contribuir para isso.

Destruição de área agrícola

É neste contexto que vários analistas tentam estimar o impacto dos sismos na economia turca. À primeira vista, as 10 províncias destruídas pelos sismos representam, por si só, uma pequena parte do PIB turco. No entanto, representam corredores agrícolas e industriais essenciais para o total do país, sobretudo Istambul e outras grandes cidades turcas. Mas segundo a Oxford Economics, mesmo que as disrupções neste corredor sejam de curto prazo, só por si retiram pelo menos 0,4% do PIB.

“A nossa estimativa inicial aponta para uma despesa pública para lidar com os terramotos em torno de 5,5% do PIB”, calculou o economista da Bloomberg Selva Bahar Baziki, sem considerar os apoios diretos às famílias.

Por outro lado, o impacto nas áreas agrícolas pode levar a falhas no abastecimento de bens alimentares e, dessa forma, aumentar a inflação, depois de ter atingido 64,2% no conjunto do ano passado.

Além disso, a intervenção política de Erdogan deve continuar a alavancar a subida de preços – seja pela manutenção de uma política monetária relaxada, seja pelo esforço orçamental que será necessário para reconstruir o país. Com eleições legislativas e presidenciais em maio, a reeleição está muito dependente do sucesso da reconstrução do país. E isso foi visível logo nos primeiros dias após o terramoto, quando Erdogan prometeu que as 10 províncias afetadas estariam reconstruídas num ano. E anunciou um “cheque” de 10 mil liras (cerca de 500 euros) para cada família afetada e prometeu alojar os desalojados em hotéis na costa do país.

Em suma, além da catástrofe humana, os sismos terão também um forte impacto orçamental e na economia do país, com as primeiras estimativas a apontarem para uma quebra de dois pontos percentuais este ano.



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