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Luís Portela deixa a liderança da Bial: “Vou procurar conhecer a melhor versão de mim. É minha intenção visitar o Tibete”
O dono da farmacêutica entrega o cargo de “chairman” a Horta Osório, em abril próximo, para se dedicar à Fundação Bial, aos seus livros e à família. “Sobretudo desejo saber aproveitar a disponibilidade de tempo que vou ter para me procurar conhecer melhor”, confidenciou ao Negócios.
Nascido em 28 de julho de 1951, em Águas Santas, no Porto, Luís Portela teve uma "infância tristonha" e começou a trabalhar muito cedo - com apenas 17 anos, para justificar a mesada paterna.
Era "um jovem que queria sobretudo ser útil ao outro, e que pensou em formas diferentes de ser útil ao outro. Pensou ser frade, monge tibetano e médico", contou o próprio, já lá vão uns 10 anos, ao Negócios. Escolheu Medicina.
Aos 21 anos, quando estava a meio do curso, o pai, António Emílio Portela, faleceu. Luís foi médico durante três anos no Hospital de São João, e deu aulas de Psicofisiologia, na Faculdade de Medicina do Porto, durante seis anos.
Até que, em 1978, como o seu irmão mais velho, que então geria a Bial, não lhe comprava a participação, acabou por adquirir as ações dos outros acionistas.
O médico decidiu então abandonar o doutoramento em Londres e recuperar a empresa fundada, nos anos 20 do século passado, pelo seu avô, Álvaro Portela, conjuntamente com o sócio, o senhor Almeida. Daí o nome Bial, porquanto a empresa foi criada pelo dois "al" - Almeida e Álvaro.
Transformou um pequeno laboratório numa companhia de elite mundial
À frente da Bial, Luís pensou para a empresa uma estratégia assente na inovação. Ao contrário das concorrentes, que apresentavam cópias, procurou "licenciar novas tecnologias, novos medicamentos com empresas multinacionais para trazer para Portugal".
E em 1992 a Bial arrancou as suas atividades em I&D, onde anualmente investe cerca de 20% das suas receitas.
Luís Portela transformou os pequenos Laboratórios Bial na maior farmacêutica portuguesa, tendo ousado investir numa estratégia de longo prazo para integrar a Bial num grupo de elite à escala mundial - os criadores de medicamentos.
E foi preciso ter paciência de monge tibetano, visão estratégica do tamanho da China e espírito empreendedor para esperar anos e anos até à obtenção de resultados.
Já lançou no mercado mundial os primeiros medicamentos de investigação portuguesa - um para a epilepsia (o Zebinix) e outro para a doença de Parkinson (o Ongentys), nos quais investiu mais de 600 milhões de euros. E abriu recentemente um centro de I&D nos Estados Unidos.
A Bial tem fábrica na Trofa e 10 filiais, e emprega hoje 1.011 pessoas, dos quais 10% são doutorados, tendo 150 profissionais a trabalhar em I&D, de 17 nacionalidades.
Exportando para 60 países, fechou o pandémico ano de 2020 com uma faturação de 344 milhões de euros, mais 11,3% do que no ano anterior, com 80% a ser garantida nos mercados externos.
"Sou incapaz de fazer mal a uma mosca. Sou um pacifista que alarga o pacifismo ao universo"
Esta quinta-feira, 21 de janeiro, após 42 anos de liderança da Bial, tendo há uma década entregado a presidência executiva da companhia ao filho mais velho, António, Luís Portela anunciou a sua substituição no cargo de "chairman", em abril próximo, por António Horta Osório, o banqueiro que está de saída da liderança do britânico Lloyds e que vai ser "chairman" do Credit Suisse a partir de maio.
"Decidi retirar-me da vida profissional porque vou fazer 70 anos dentro de meses e porque fomos preparando na Bial a minha saída desde há alguns anos", explicou Luís Portela ao Negócios, adiantando que irá dedicar-se à Fundação Bial, aos seus livros e à família.
A paixão pela escrita, pela leitura e pelo conhecimento fazem de Luís Portela um escritor compulsivo.
Ao longo da sua vida publicou já vários livros sobre o sentido da vida e a espiritualidade, como "Para Além da Evolução Tecnológica", "À Janela da Vida", "O Prazer de Ser", o"Ser Espiritual - Da Evidência à Ciência" ou "Da Ciência ao Amor - Pelo Esclarecimento Espiritual", em que aprofunda um dos principais interesses que tem atravessado toda a sua obra já publicada - a compreensão da dimensão integral do homem, tanto sob os aspetos físicos como do ponto de vista espiritual.
Luís Portela é um pacifista. "Sou incapaz de fazer mal a uma mosca. Se ela me incomodar apanho-a com a mão (20 anos de karaté permitem-me a concentração para apanhar a mosca à mão), abro a janela e ponho-a lá fora. Eu não mato uma mosca, como não mato uma centopeia. Sou um pacifista que alarga o pacifismo ao universo", afirmou ao Negócios no verão de 2009.
De entre as obras que mais o marcaram está "O Livro do Caminho Perfeito", de Lao Tsé.
E agora? "É minha intenção visitar o Tibete, coisa que antes nunca tive oportunidade de fazer. Mas, sobretudo, desejo saber aproveitar a disponibilidade de tempo que vou ter para me procurar conhecer melhor, nomeadamente a melhor versão de mim", confidenciou Luís Portela, esta quinta-feira, ao Negócios.