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As dez bandeiras de Donald Trump

Para lá do estilo e postura, Donald Trump tem um conjunto de propostas que atraíram sobre si, desde o primeiro momento, os holofotes da comunicação social. Nem todas as medidas serão postas no terreno, até porque algumas poderão não ter o apoio do Partido Republicano. Mas todas estão no seu programa.

Reuters
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1. Acordo de Paris é para anular e renegociar

Para Donald Trump, o aquecimento global não passa de um fenómeno natural. E, assim sendo, pouco sentido terão os pactos entre os países para lutar contra ele, como o histórico Acordo de Paris, assinado no ano passado por 195 estados e que entrou em vigor na passada sexta-feira, 4 de Novembro, nos 103 que já o ratificaram. Um desses países foi, precisamente, os Estados Unidos, mas Trump já avisou que não pretende dar continuidade à agenda ambiental de Obama. Pelo contrário. O Acordo de Paris, do qual não é "grande fã", é para "cancelar", diz.

O novo Presidente chega à Casa Branca na mesma altura em que, em Marraquexe, Marrocos, decorre a 22.ª Conferência da ONU sobre as alterações climáticas (COP 22). Em cima da mesa está a execução do acordo contra as alterações climáticas e a sombra do novo Presidente norte-americano paira sobre o encontro. Esta quarta-feira, Ségolène Royal, a ministra francesa do ambiente, afirmou que Trump "não pode, contrariamente ao que disse, renunciar ao Acordo de Paris". Afinal, salientou, este determina que "durante três anos não o podemos abandonar".

Resta saber que coelho tirará o novo Presidente americano da cartola para contornar essa regra. Nos EUA, Obama ratificou o acordo usando os seus poderes executivos e sem esperar pela votação no Senado. O seu argumento foi o que não estava em causa um tratado, mas sim um "acordo executivo". Agora, Trump está decidido a pôr um travão a todo o processo. Durante a campanha, numa entrevista à Reuters declarou que "no mínimo" irá "renegociar os compromissos". Isso "no mínimo. No máximo posso fazer outra coisa", afirmou. Da sua política energética consta também a viabilização da construção de um oleoduto entre os EUA e o Canada e a revitalização da exploração de carvão.

2.Putin, o líder fetiche de Trump

"Ele lidera o seu país e, pelo menos, é um líder, ao contrário daquilo que temos neste país", afirmou Donald Trump sobre o presidente russo, Vladimir Putin, comparando-o com Barack Obama. Dias antes tinha sido Putin a referir-se a Trump como alguém "brilhante" e "muito talentoso". Trump fez questão de sublinhar que "o facto é que isso não o levará a lugar nenhum. Eu sou um negociador". No entanto, Putin não escondeu a preferência por Trump na corrida eleitoral contra Hillary Clinton.

E esta quarta-feira fez questão de dizer que espera "trabalhar em conjunto [com Trump] para retirar as relações russo-americanas do actual estado de crise". Esta preferência levou a que, segundo diversas agência de inteligência dos EUA, o Kremlin tenha promovido diversos ataques informáticos para prejudicar a candidatura de Clinton. Numa altura em que se verifica uma tensão inédita desde a Guerra Fria entre a Rússia e os EUA, Putin parece ver em Trump um elo fraco para assegurar a concretização das ambições russas no Médio Oriente e na Europa de Leste.

3. Deixar a Síria para a Rússia e eliminar o EI

Se a posição de Donald Trump em relação ao conflito militar na Síria é pouca clara, as propostas do presidente eleito dos EUA para combater o autodenominado Estado Islâmico (EI) resumem-se a uma ideia: eliminar o EI. Durante a campanha e nos debates que manteve com Hillary Clinton, Trump criticou a estratégia de Washington na Síria, apontando o dedo à estratégia de apoiar financeira e militarmente os grupos rebeldes sunitas que combatem o regime de Damasco: "Nós nem sabemos bem quem são esses rebeldes", atirou Trump. No entender do futuro presidente dos EUA, a Rússia, e também o Irão, estão a ter sucesso no apoio ao presidente sírio Bashar al-Assad, que "estão a matar o EI". Para Trump a política de Washington em relação ao Médio Oriente tem sido "um desastre".

Estas afirmações fazem crer que com Trump na sala oval os EUA deixarão de apoiar as forças de oposição a Assad o que, em última instância, poderá deixar caminho aberto para Moscovo e Teerão consolidarem a sua aliança estratégia com Damasco. Por outro lado, Donald Trump quer derrotar o EI, embora até à data não tenha relevado como. "Acredito que temos de destruir o EI. Temos de nos preocupar com o EI antes de nos envolvermos em demasia" na questão síria, defende Trump. No Pentágono discute-se a melhor forma de acabar com a guerra que se prolonga há mais de cinco anos na Síria e de derrotar o EI, também presente no Iraque e, cada vez mais, na Líbia. Enviar "botas para o terreno" é uma possibilidade que continua a pairar, embora ninguém a admita como forte hipótese. Se se repetirem nos EUA os ataques terroristas já levados a cabo (ou patrocinados) pelo EI, em solo europeu norte-americano, como irá o temperamental Trump reagir? 

4. Irão em vias de ficar outra vez isolado

O acordo sobre o programa nuclear iraniano foi visto como um dos grandes sucessos da administração Obama. Contudo, este acordo que levou à revogação de todas as sanções aplicadas a Teerão devido ao programa nuclear secretamente desenvolvido foi duramente criticado por Donald Trump. O futuro presidente dos EUA chegou mesmo a classificar o acordo com o Irão como, "possivelmente, o mais estúpido acordo que viu "em toda a história dos acordos".

"O pior acordo alguma vez assinado" e "holocausto nuclear" foram outros adjectivos utilizados por Trump para descrever o compromisso que começou por ter também o dedo da então secretária de Estado Hillary Clinton. Assim, tendo em conta as reticências do Partido Republicano relativamente ao acordo e ainda o facto de que Trump rejeita os termos acordados com Teerão, afigura-se plausível que o mesmo seja revogado. Se tal acontecer – novamente isolado em termos comerciais – Teerão ficará motivado a prosseguir o programa nuclear tendo como objectivo fins bélicos. 

5. Acordo comercial com a UE travado

O Acordo de Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento (TTIP, na sigla inglesa), que está a ser negociado pela União Europeia e pelos Estados Unidos desde Junho de 2013, por iniciativa do ainda presidente norte-americano, Barack Obama, deveria ser assinado até ao final deste ano. Mas já não vai. Provavelmente até deverá ser engavetado pelo presidente eleito da maior economia do mundo. Durante a campanha eleitoral, Donald Trump fez declarações contrárias ao livre-comércio, acusando Obama de promover um tratado comercial que iria provocar perda de empregos e a baixa dos salários. Esta quarta-feira, a Comissão Europeia admitiu que o TTIP não será ratificado sob a presidência de Obama e reconheceu que as negociações estão em "stand by".

De resto, "é impossível dizer a duração dessa pausa", ressalvou a comissária europeia do Comércio, Cecilia Malmström, enquanto Jyrki Katainen, vice-presidente da CE responsável pelo Emprego e Crescimento, aconselhou que "devemos manter a calma e esperar as respostas do novo governo e do novo presidente". Portugal é apontado como um dos países que mais benefícios poderia ter com a redução das barreiras alfandegárias, com os têxteis a surgirem entre os sectores mais favorecidos. "Um mercado que é hoje o quinto melhor e o primeiro extra-comunitário, perto de atingir 300 milhões de euros de exportações e com potencial de crescimento, segundo os estudos poderia chegar em cinco anos [com o TTIP em vigor] aos 800 milhões de euros", revela Paulo Vaz, da associação desta indústria (ATP). Segundo um estudo da FLAD (Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento), a execução do TTIP poderia provocar um acréscimo de 0,57% a 0,76% no PIB português.

6. NATO paga por todos

Há muito se proclama a necessidade de reformar a NATO e redefinir o seu conceito estratégico. Se entre 1949 (data da sua constituição) e 1989 (ano em que caiu o Muro de Berlim) a Guerra Fria assegurou a razão de ser do sistema de segurança colectiva fornecido pela Aliança Atlântica, desde então persiste uma constante tentativa de encontrar um papel para a NATO. Depois da expansão para o leste europeu surgiu a ameaça terrorista e, mais recentemente, a resposta russa à aproximação da aliança para junto das suas fronteiras.

Moscovo tem feito inúmeras demonstrações de força militar junto às fronteiras com a Polónia e os países Bálticos. O problema é que os Estados Unidos continuam a custear o essencial das despesas de funcionamento da organização. Em 2015 só cinco dos 28 aliados da NATO contribuíram com o mínimo de 2% do PIB definido como meta. Ao longo da campanha eleitoral, Trump disse várias vezes que os EUA não poderiam continuar a pagar pela segurança europeia. Chegando a colocar em causa um dos pilares da organização, o artigo 5 da NATO que estipula a protecção mútua automática em caso de ataque a qualquer aliado. Questionado pelo New York Times sobre o seu compromisso no caso de um aliado ser atacado, Trump respondeu que, em primeiro lugar, teria de fazer uma avaliação do cumprimento das contribuições desse país para a Aliança Atlântica.

Reagindo à vitória de Trump, Jens Stoltenberg, secretário-geral da NATO, lembrou que perante o "novo ambiente de segurança, que inclui guerra híbrida, ciberataques e a ameaça do terrorismo" a liderança dos Estados Unidos "é mais importante que nunca". Acrescentando que "uma NATO forte é boa para os EUA". Ver-se-á se Trump concorda com Stoltenberg.   

7. "Boom" na economia e no emprego 

Donald Trump promete um "boom económico" que ponha o país a crescer a um ritmo anual de 3,5% nos próximos oito anos, e a criar 25 milhões de empregos. Uma das formas de consegui-lo passa por "reconstruir a América". Literalmente. Trump quer "construir a próxima geração de estradas, pontes, ferrovia, túneis, portos e aeroportos". Não há uma estimativa do investimento que tal suporia, mas Trump já disse que seria pelo menos o dobro do que prometera Clinton (275 mil milhões em gastos directos mais 225 mil milhões em empréstimos e garantias).

Outra via para o "boom" virá da renegociação dos acordos comerciais que reduzem postos de trabalho, nomeadamente com o México e a China, e da drástica redução da carga fiscal que tem planeada, por via do aumento do consumo e de investimento. Durante uma campanha difusa quanto à forma de concretizar o seu programa, o futuro presidente contará ainda com o contributo do repatriamento dos lucros das multinacionais que estão estacionados em jurisdições estrangeiras para evitarem pagar o equivalente ao IRC. 

8. Um muro para travar os violadores

Esta é a área política de Donald Trump que mais atenção mediática recebeu. Desde o primeiro dia da sua campanha que o candidato republicano colocou um alvo sobre os imigrantes ilegais. Esta frase, proferida durante o seu primeiro discurso como candidato, marcou o tom de toda a campanha: "[O México] está a mandar pessoas que têm muitos problemas e que estão a trazê-los até nós. Estão a trazer drogas. Estão a trazer crime. São violadores. E alguns, presumo eu, são boas pessoas." A sua proposta central é a construção de um muro ao longo de toda a fronteira dos Estados Unidos com o México. Uma ideia que muitos já explicaram ser irrealista pelos enormes custos que teria.

Mas Trump insiste que será o Governo mexicano a assumir a despesa. O republicano tinha prometido também deportações em massa de imigrantes ilegais, que poderiam chegar aos 11 milhões de pessoas. Trump já avançou também com várias ideias avulsas. Duas delas são banir todos os muçulmanos de entrar nos EUA; e avaliações apertadas de todos os refugiados.

9. Impostos são para baixar ou eliminar  

Ao nível do imposto sobre pessoas singulares (o equivalente ao nosso IRS), Donald Trump quer reduzir o número de escalões e aliviar a carga fiscal de forma generalizada, mas beneficiando sobretudo quem tem rendimentos muito altos ou mais baixos. Caso concretize a sua promessa, quem tem rendimentos anuais entre 9.275 e 29 mil euros, deixará de pagar qualquer imposto - até aqui, vem suportado taxas marginais de 10% a 15%, mas estes valores acabam por ser muito atenuados devido às deduções fiscais. Nos escalões mais altos, quem por exemplo ganhe 415 mil euros/ano passará a pagar uma taxa marginal de 33%, contra uma taxa de 39,6% actual.

Segundo as contas feitas pelo "think tank" Tax Foundation, isto significaria um alívio na facture fiscal dos 1% mais ricos da população em 5,3%, mas a factura poderá ser ainda maior caso Trump avance com a sua intenção de baixar a taxa de IRC para os 15%. A descida já é abrupta só por si, mas, mais importante do que isso, Donald Trump quer que esta taxa se aplique a todo o tipo de negócios, incluindo as chamadas "partnerships", o que permitiria aos ricos que parqueiam os seus rendimentos em sociedades passarem a pagar IRC de 15% em vez de IRS de 33%.

No IRC, a descida da taxa de 35% para os 15% seria acompanhada de uma revisão das deduções que permitem reduzir o imposto mas, segundo as contas da Tax Foundation, ainda assim, os cofres públicos seriam subtraídos de 1,9 biliões de dólares na próxima década. Ainda no IRC, o futuro presidente quer também que as multinacionais que têm os seus lucros parqueados no exterior para evitar pagar possam repatriá-los para os EUA a uma taxa de 10% .

O imposto sucessório, que baptizou de "imposto da morte", é para eliminar. Falta saber a margem orçamental e a posição do congresso e do senado. 

10. Obamacare é para revogar no primeiro dia 

A lei que garante a todos os americanos um plano de saúde, uma das bandeiras do Presidente Obama, tem os dias contados. Trump já avisou que pretende revogá-lo no seu primeiro dia de mandato e que, para o efeito, convocará uma sessão especial do Congresso. No seu entendimento, "o melhor programa social será sempre um emprego", na lógica de que, tendo trabalho, as pessoas poderão pagar do seu próprio bolso as despesas de saúde. Os seguros são obrigatórios, mas há subsídios a que podem recorrer os cidadãos que não tenham condições financeiras para os adquirir.

Os últimos dados divulgadas pelo Governo de Obama indiciam que os prémios dos seguros terão um aumento na ordem dos 25% no próximo ano e o número de segurados é apenas metade do que o previsto inicialmente pelo governo. Os republicanos sustentam que muitos nem sequer dão uso aos seus seguros para reduzir custos. Em suma, dizem, "o Governo não deveria dizer-vos como devem gastar o vosso dinheiro".
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