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Isabel dos Santos reclama porque "outros corruptos" continuam "incólumes", diz ativista

Isabel dos Santos "sente-se com legitimidade de reclamar porque ela está a ver que outros que também são beneficiários desse esquema gigantesco continuam incólumes ao lado do Presidente da República", afirma Sedrick de Carvalho.

Miguel Baltazar
19 de Janeiro de 2020 às 13:25
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O ativista angolano Sedrick de Carvalho disse hoje que a empresária Isabel dos Santos sente-se com legitimidade para "reclamar" porque outros "beneficiários" do esquema de corrupção de que usufruiu "continuam incólumes ao lado do Presidente da República".

 

A viver em Portugal desde 2017, após o desfecho do processo conhecido como 15+2, no âmbito do qual esteve preso em Luanda, o ativista e jornalista disse à Lusa que, sendo "produto dos maiores esquemas de corrupção do país a partir do seu pai", o anterior Presidente de Angola, José Eduardo dos Santos, a empresária "sente-se com legitimidade de reclamar porque ela está a ver que outros que também são beneficiários desse esquema gigantesco continuam incólumes ao lado do Presidente da República", como é o caso do ex-vice-presidente Manuel Vicente.

 

"O que ela está a tentar transmitir é que não merece ser julgada porque outros também beneficiaram do saque, do roubo, que é, na verdade, um discurso que tem razão de fazer, porque quem a está a julgar, a apertar, a colocar contra a parede, são também corruptos e deste ponto de vista não há legitimidade para corruptos julgarem corruptos. Agora se estivéssemos perante instituições sérias no país, claro que Isabel dos Santos tem que ser julgada e até condenada", afirmou.

 

Para Sedrick de Carvalho, há em Angola "um grande truque de ilusionismo político" e a luta contra a corrupção é uma "pedra de arremesso" num processo de mudanças de poder internas no MPLA, não existindo, de facto, uma mudança no país, mas "uma continuidade, uma mesmice de comportamentos".

 

A luta contra a corrupção é, no seu entender, "um bom pano de fundo" que "atrai as massas", mas que não tem correspondência real, a começar pelo facto de os principais protagonistas serem os mesmos.

 

Sublinhando que o discurso de luta contra a corrupção que João Lourenço faz "não é muito diferente do que o José Eduardo dos Santos fazia", o ativista afirmou que nada foi feito para "começar do zero", enquadrando o atual Presidente na "classe rica" fomentada pelo seu antecessor.

 

Se não, "como se vai compreender que João Lourenço era acionista, ou é acionista, de bancos sem ter conseguido essas ações pela via da corrupção, num sistema em que José Eduardo dos Santos liderava e todas as vias de acesso ao capital angolano eram pela via da corrupção. Não há nenhum processo transparente de acesso", declarou.

 

Para o ativista, a assunção de se ter usufruído da corrupção para "fazer uma catarse nacional" não interessa ao regime.

 

"Não pode começar do zero, porque ele precisa de iludir as pessoas com o discurso da corrupção. Daí é que ataca, por exemplo, a Isabel dos Santos, que é um dos principais rostos da corrupção em Angola, porque representa sobretudo a família Dos Santos, mas não ataca o Manuel Vicente, antes pelo contrário, ataca Portugal a defender o Manuel Vicente, exatamente pelo mesmo motivo, pela corrupção", afirmou.

 

Apontou ainda a ausência de "alarido" perante a notícia de processos em Portugal contra Isabel dos Santos, quando João Lourenço "moveu mundo para defender Manuel Vicente" no caso do processo de corrupção que correu em Portugal e que culminou com a condenação do Procurador Orlando Figueira.

 

"São essas dualidades que pouca gente compreende, mas cada vez mais pessoas estão a compreender que não é para levar a sério a luta contra a corrupção. É tudo uma manobra muito grande de ilusionismo político levada a cabo por João Lourenço", acrescentou.

 

"Não é mera convicção minha que o país não está a mudar. Há pessoas muito respeitadas, no país e fora, que chegaram a acreditar que havia uma mudança no país, mas que eles dizem atualmente que não, é tudo retórica".

 

"Há um grande truque de ilusionismo político no país, mas no essencial é a mesma coisa", disse, salientando que o que existe é uma luta pelo poder "muito forte" dentro do MPLA (Movimento Popular de Libertação de Angola, que governa o país desde a independência, em 1975).

 

"A forma como o país tem sido governado não é uma visão do Presidente, é uma visão do partido", afirmou, sublinhando a sua convicção de que "é muito mais fácil o partido tirar João Lourenço do que João Lourenço mudar o partido".

 

O processo movido a Isabel dos Santos "é político, mas é político como sempre foi no tempo do pai dela", pois o MPLA "não consegue conceber, não compreende, a lógica de divisão do poder num Estado de direito democrático", salientou.

 

"Toda e qualquer ação que é levada a cabo com os tribunais é levada a cabo com o apadrinhamento, o incentivo, do poder político e basta ver que o despacho do arresto de bens e contas de Isabel dos Santos tem o serviço de inteligência e segurança do estado envolvido nele. Isto é inevitável em Angola", salientou.

 

Para Sedrick de Carvalho, a ideia de "perseguida política" e de "defensora da democracia" que Isabel dos Santos "tenta passar", e de que está a ser "combatida" por ter tentado acabar com a corrupção na Sonangol, "é tudo uma mentira, uma falácia".

 

Sobre a situação social em Angola, o ativista alerta que "é cada vez mais caótica" e sublinha que se mantém a "represão política".

 

"De 2017 para cá houve pelo menos cinco casos de repressão política. Neste momento em que estamos a falar, há presos políticos no país", acrescentou.

 

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