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Advogados indignados por receberem 25 euros por hora

A Associação Nacional de Freguesias (Anafre) assinou um protocolo com a Ordem dos Advogados (OA) para prestar consultas jurídicas gratuitas a pessoas com carência económica. Os advogados do Porto consideram que o pagamento de 25 euros por hora é indigno.

24 de Fevereiro de 2016 às 21:00
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O Conselho Regional do Porto da Ordem dos Advogados insurgiu-se contra a prestação de consultas de apoio jurídico nas freguesias que aderirem ao protocolo estabelecido entre a Associação Nacional de Freguesias (Anafre) e a Ordem dos Advogados (OA). De acordo um comunicado publicado esta terça-feira pelo órgão portuense, o Conselho Regional do Porto levanta vários entraves ao protocolo e "repudia de forma veemente" o pagamento de 25 euros por hora, ou 16 euros por meia hora, que põe em causa "a dignidade e o prestígio do exercício da profissão de advogado".

 

O protocolo entre a Anafre e a OA foi assinado no passado dia 28 de Janeiro pelo presidente da Anafre, Pedro Cegonho, e pela bastonária Elina Fraga, e estipula que as consultas de esclarecimento e encaminhamento jurídico sejam disponibilizadas de forma gratuita a "pessoas singulares de reconhecida insuficiência económica", nomeadamente pessoas que ganhem, por mês, o mesmo ou menos que o salário mínimo (530 euros).

 

Os honorários dos advogados serão pagos pela junta de freguesia em causa. Este ano está fixado o valor de 25 euros por cada hora de consulta, sendo ainda possível adquirir um pacote com um bloco horário de três horas, em que poderão ser prestadas, no máximo, seis consultas, por 100 euros – dividindo este valor pelas seis consultas (uma a cada meia hora), chega-se aos 16,7 euros referidos pelo Conselho Regional do Porto.

 

Este órgão discorda fortemente da prestação destas consultas de apoio jurídico. No comunicado, lê-se que tais montantes "põem em causa a dignidade e o prestígio do exercício da profissão de advogado, ao permitir que um advogado possa prestar uma consulta, elaborar minuta de cartas, um contrato ou um requerimento por uns meros 16 euros".

 

Consultas de apoio jurídico custam "no mínimo" 50 a 60 euros

 

O Negócios falou com a presidente do CRP, Elisabete Grangeia, que começa por dizer que o modelo de apoio jurídico que é agora protocolado "é mais permissivo que o que já existe", atribuído pela Segurança Social, "que analisa não só o rendimento mas também o património" de quem o solicita.

 

Quanto ao valor dos honorários, a advogada considera que "16 euros por uma consulta de apoio jurídico é um valor que não dignifica a nossa profissão". Elisabete Grangeia afirma que "no mínimo" uma consulta deste tipo no consultório de um advogado custa "50 a 60 euros". Em cidades como Lisboa ou Porto, facilmente pode ultrapassar os 100 euros.

 

E existe outro risco: "se um advogado que está numa junta custa 25 euros" – que não são pagos pelos cidadãos, mas pela junta – "e por esse valor faz cartas, requerimentos e contratos, então começa-se a nivelar o preço dos advogados". "Em municípios pequenos, se as pessoas sabem que o advogado custa 25 euros à junta, vão pagar o dobro noutros consultórios?", questiona a presidente do CRP. Ainda que a consulta não esteja disponível para qualquer pessoa, "o valor da consulta passa para o exterior".

 

Apoio nas juntas pode fazer concorrência aos escritórios

 

Corre-se portanto o risco de este apoio "fazer concorrência aos escritórios de advogados", até porque os advogados que vão prestar apoio nas juntas não vão só prestar ajuda a interpretar e aplicar as normas jurídicas. No protocolo assinado entre a Anafre e a OA, está previsto que seja também concedido encaminhamento jurídico, que consiste no "aconselhamento sobre os actos a praticar", e que pode implicar a "elaboração de minutas de cartas, de contratos ou simples requerimentos".

 

Ora, para Elisabete Grangeio, "isto é quase a privatização do apoio judiciário" e, em municípios pequenos, "é muito fácil acabar-se com a advocacia", porque, diz, as consultas jurídicas das freguesias, tal como estão previstas, vão ser muito completas.

 

A terminar, o Conselho Regional do Porto não concorda com a forma como os advogados vão ser colocados nas freguesias. O protocolo diz que será através de escalas, a elaborar pela Ordem dos Advogados, e que serão preenchidas por aqueles que quiserem participar nestas consultas. Mas estes também terão de assinar contratos com as juntas "que os fidelizem ao seu cumprimento e assegurem a sua presença nos dias e horas de atendimento jurídico".

"É muito fácil canalizar clientes para um colega"

 

Isso pressupõe "que será sempre o mesmo advogado a prestar o serviço, o que poderá levar à eclosão de situações de angariação de clientela", nota o CRP. "O protocolo diz que não é permitido angariar clientes, mas é muito fácil canaliza-los para um colega ou para o seu próprio escritório", admite Elisabete Grangeia.

 

A Anafre não comenta e diz que desconhece as críticas do Conselho Regional do Porto, e remete um comentário para a Ordem dos Advogados. Quanto ao processo, explica que os formulários para a adesão das freguesias a este protocolo só foram disponibilizados esta semana, pelo que ainda não é possível perceber quantas freguesias aderiram ao apoio jurídico.
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