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Englobamento dos rendimentos no IRS divide fiscalistas

A intenção de "caminhar no sentido do englobamento" no IRS expressa no programa do Governo foi recebida de forma diferente pelos fiscalistas, havendo quem a veja como um foco de instabilidade ou o cumprimento do que está na Constituição.

DR
08 de Novembro de 2019 às 17:20
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"Não faz sentido mudar nada sem refletir com o tempo necessário e não se pode andar a mudar regras fiscais estruturais todos os anos, muito menos no orçamento e ainda menos num orçamento que entra em vigor a meio do ano", referiu à Lusa Rogério Fernandes Ferreira (na foto), advogado especialista em questões fiscais e antigo secretário de Estado dos Assuntos Fiscais do governo liderado por António Guterres.

Apontando aos rendimentos prediais, Luís Leon, da consultora Deloitte, lembrou as recentes alterações às regras do IRS no sentido de conceder uma redução da taxa especial de 28% sobre as rendas dos senhorios que façam contratos de arrendamento de maior duração.

"A tinta dessas alterações ainda mal secou, as pessoas ainda nem sabem bem como vão funcionar e já se fala em novas alterações" ao tratamento fiscal dos rendimentos prediais, sublinha o fiscalista da Deloitte.

Ainda que discorde de novas mudanças, Rogério Fernandes Ferreira admite que o caminho do englobamento possa ter "atenuantes", como "excluir as rendas dos contratos de longo prazo, cujo regime fiscal foi há muito pouco tempo alterado, ou seguir, no que respeita a mais-valias, um modelo semelhante ao que atualmente existe para as mais-valias da venda de imóveis" -- que são de englobamento obrigatório, mas consideradas apenas em 50% do seu valor. Esta solução chegou a ser proposta em 2002 pelo governo PS.

Manuel Faustino, antigo diretor do IRS, tem uma posição distinta. Sublinhando a "salganhada e conjunto de incoerências" em que se transformou o IRS, adianta que caminhar no sentido do englobamento de forma a dar mais progressividade ao imposto "é uma imposição constitucional" e que não está nas mãos do Governo ignorá-la.

Atualmente há alguns rendimentos, nomeadamente os de capitais (como juros e dividendos), prediais e algumas mais-valias que podem pagar uma taxa especial de 28% ou, se o seu titular assim o entender, ser englobados a outros rendimentos (de trabalho e de pensões) e ser tributados pelas taxas progressivas deste imposto, que começam em 14,5%, para rendimentos anuais até 7091 euros, e vão até 48%, quando os rendimentos superam os 80 mil euros anuais.

No seu programa, o novo Governo enuncia pretender "caminhar no sentido do englobamento dos diversos tipos de rendimentos em sede de IRS, eliminando as diferenças entre taxas".

Durante a discussão do programa, no parlamento, o primeiro-ministro não entrou em detalhes, referindo, contudo, que tal será feito "passo a passo, com a devida sustentabilidade ao longo da legislatura".

Na ocasião, António Costa afirmou: "Em matéria de rendimentos prediais, isentamos a tributação para quem coloque os imóveis em regime de arrendamento acessível ou faça contratos sem precariedade," acrescentando que, "para quem não o faz, e tem o direito a não o fazer", pode acontecer que o englobamento venha a traduzir-se num agravamento de impostos.

Para Luís Leon, se os rendimentos de rendas forem penalizados fiscalmente, o mercado de arrendamento ainda terá tendência a encolher mais, pois poderá levar as pessoas a investir na compra de imóveis para venda e não para arrendar.

O fiscalista da Deloitte alerta também para o impacto que um eventual englobamento obrigatório possa ter sobre a poupança e no arrepio do caminho seguido nestes últimos anos no sentido de dispensar cada vez mais pessoas de entregar declaração de IRS ou de a entregarem automaticamente -- solução indisponível para quem não opte pelo englobamento.

Também Rogério Fernandes Ferreira alerta para que são necessárias medidas que incentivem a poupança e que "estas medidas de englobamento dos juros podem assustar as pessoas".

Crítico do atual modelo em que foram sendo retirados e tributados "avulso" cada vez mais tipologias de rendimentos, Manuel Faustino considera que a melhor solução seria englobar todos os rendimentos e sujeitá-los a uma 'flat tax' (sistema tributário em que uma taxa única é aplicada ao rendimento sem a existência de deduções ou abatimentos).



LT // CSJ

Lusa/Fim
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