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O Orçamento de Centeno foi a exame e recebeu 11,4 valores

As avaliações ao Orçamento do Estado para 2018 dividem-se por linhas ideológicas, um espelho daquilo que parece ser também a opinião dos portugueses. Entusiasmo moderado à esquerda com as reversões e desconfiança mais à direita.

Miguel Baltazar/Negócios
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Não se pode agradar a gregos e a troianos. É possível que este ditado tenha passado pela cabeça de Mário Centeno nos últimos dias, ao ver a reacção ao orçamento que desenhou e que foi aprovado ontem no Parlamento. Da direita vêm críticas à falta de ambição na redução da dívida e à ausência de uma reforma do Estado; da esquerda chegam elogios contidos aos progressos na recuperação de salários e outros direitos perdidos nos anos da crise.

Este fosso de percepção está também traduzido na avaliação feita pelos economistas e especialistas convidados pelo Negócios a dar uma nota ao OE 2018. Contas feitas, o documento acaba por merecer 11,4 valores. Um suficiente, que é tornado mais robusto pelo "muito bom" dado por uma das economistas, que elogia precisamente o exercício de equilíbrio de Centeno.

08 valores - "Falha na consolidação estrutural"

08 valores - 'Falha na consolidação estrutural'
Joaquim Miranda Sarmento, Professor de Finanças do ISEG. "Apesar da redução nominal do défice, este OE (além de não ter uma estratégia de competitividade) falha na consolidação estrutural. O défice estrutural, em torno dos 2%, não se reduz desde 2015. O aumento dos impostos indirectos, redução da despesa com juros e os dividendos do Banco de Portugal têm sido usados para criar despesa estrutural (pessoal e prestações sociais) e para redução IRS e do IVA restauração. Portugal devia estar a ter excedentes orçamentais, aproveitando este período mais favorável para reduzir mais a dívida pública e consolidar as contas públicas. Só desta forma seria capaz de aguentar choques externos".

09 valores - Uma negativa à justa

09 valores - Uma negativa à justa
Bagão Félix, Economista, Ex-ministro das Finanças. Pontuou o OE em 12 dimensões e só em quatro deu nota positiva, sendo que uma delas, o imposto sobre sal e açúcar (16 valores), acabou por cair. A meta de défice de 1,1% e a prudência macroeconómica recebem 15 valores e as "alterações (insuficientes) no IRS" 11 valores. A partir daí, só negas: 9 valores para a redução lenta da dívida; 7 para a "vacuidade das medidas de contenção da despesa" e para a "incapacidade" de reduzir o emprego público e qualificar funcionários; 6 valores pela falta de reformas; 4 para as alterações ao IRS dos recibos verdes e para a "eliminação do regime fiscal do cheque-educação"; e 3 para "ausência de apoios à poupança".

11 valores - "Não se vislumbra num novo modelo"

11 valores - 'Não se vislumbra num novo modelo'
Manuel Carvalho da Silva, Coordenador do CES-Lisboa, ex-lider da CGTP. "O OE de 2018, na senda dos dois últimos orçamentos, dá pequenos passos na reposição de direitos essenciais para que as medidas de "excepção", adoptadas em nome do combate à crise, não passem a normalidade. Aumentos das pensões, aligeiramento do IRS e descongelamento das carreiras consubstanciam estes progressos. No entanto, continua a estagnação do investimento público, o subfinanciamento dos serviços públicos e muito por fazer na dignificação do trabalho, no combate às desigualdades e à pobreza, o que não permite vislumbrar neste OE um novo modelo socioeconómico de progresso social que urge construir".

12 valores - "Repara alguns dos piores retrocessos"

12 valores - 'Repara alguns dos piores retrocessos'
José Castro caldas, Investigador do CES. "É um orçamento que procura reparar alguns dos piores retrocessos de quatro anos de cortes nos rendimentos salariais, nas pensões de reforma, no financiamento dos serviços públicos, no investimento e repor alguma justiça na fiscalidade. Isto justifica, por si só, uma nota positiva. Se considerarmos o que seria a alternativa da direita - um orçamento que prolongaria os cortes para servir a dívida, pondo com isso em risco a recuperação - a nota deve ser mais do que positiva".

17 valores - "É um exercício bem conseguido"

17 valores - 'É um exercício bem conseguido'
Francisca Guedes de Oliveira, Professora da Católica do Porto. "Uma nota absoluta para um documento desta natureza é praticamente impossível e por isso a nota dada é relativa. Olhando para os últimos 10 (rectificativos incluídos) este orçamento está claramente no top 5%. É um orçamento ainda sobre amarras apertadas (agora preventivas) da Europa e por isso bastante cauteloso. É um orçamento que repõe rendimentos de forma transversal, que tem preocupações de equidade e de inclusão, que olha para a economia e para a competitividade e tudo isto tentando garantir a sustentabilidade das contas públicas. É um exercício bem conseguido".

Nos últimos dois anos, o Governo ultrapassou algumas das desconfianças iniciais em relação à sua capacidade para controlar as contas públicas e colocar a economia a crescer, mas isso não significa que a avaliação do seu trabalho se tenha tornado consensual.

As opiniões sobre o Orçamento do Estado parecem depender do quadrante ideológico a que pertence o inquirido. O painel escolhido pelo Negócios mostra isso mesmo, agindo como um reflexo da sociedade. Ainda há poucos dias, uma sondagem da Aximage concluía que a maioria dos portugueses achava que as famílias teriam mais dinheiro no bolso graças às medidas do OE 2018. Contudo, quando se avalia a composição das respostas, observa-se uma relação clara com a intenção de voto nas legislativas de 2015. A esmagadora maioria dos que votaram PS acham que o OE dará mais dinheiro às famílias (71%). Quem votou BE e CDU também (69% e 66%). Mas aqueles que colocaram a cruz no PSD e no CDS estão significativamente mais cépticos (32% e 28%).

No painel de especialistas verifica-se uma distribuição semelhante. Quem se posiciona à direita dá notas mais negativas. Aqueles que estão mais alinhados à esquerda dão notas positivas, com destaque para o 17 de Francisca Guedes de Oliveira, que colaborou na elaboração do cenário macroeconómico do PS.

À esquerda, os elogios concentram-se na devolução de rendimentos, que este orçamento continua a desenvolver, seja através de reforço de prestações sociais, como de alívio de impostos. Porém, criticam o facto de o OE não ir mais longe no apoio aos serviços públicos e na "dignificação do trabalho".

Entre aqueles que chumbam o exercício de Centeno, as críticas divergem no défice - Bagão Félix elogia a meta de 1,1%, Miranda Sarmento critica a falta de ambição na consolidação estrutural - mas convergem na falta de ambição na redução da dívida pública.


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