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Os argumentos que opõem Bruxelas e Lisboa no debate das sanções
Comissão e Governo de António Costa têm vários argumentos para fazer valer a sua tese. Conheça as explicações que podem estar na base das negociações entre Bruxelas e Lisboa.
OS QUATRO ARGUMENTOS DA COMISSÃO EUROPEIA
Ajustamento estrutural 2013/2015
Em 2013, ao abrigo do Procedimento dos Défices Excessivos (PDE), o Conselho da União Europeia recomendou a Portugal que reduzisse o défice público global para menos de 3% do PIB – e que nesse período garantisse um ajustamento estrutural nas contas públicas de 2,5 pontos (0,6 pontos em 2013, 1,4 pontos em 2014 e 0,5 pontos em 2015). Portugal falhou a primeira recomendação o que impediu a conclusão do PDE; e fez um ajustamento estrutural entre 2013 e 2015 de 1,1 pontos (0,6 pontos em 2013, 1,1 pontos em 2014 e um agravamento de 0,6 pontos em 2015). É esta divergência no ajustamento estrutural que leva os serviços da Comissão a avaliar que o país não fez um "esforço efectivo" para equilibrar as contas públicas.
Esforço orçamental em ano de eleições
O desempenho orçamental de 2015, ano de eleições, é o principal factor a penalizar Portugal. O défice ficou acima de 3% do PIB, o que impediu a conclusão do PDE; e, mais grave, o saldo estrutural agravou-se em 0,6 pontos, o que compara com a recomendação da UE de uma melhoria de 0,5 pontos, dando razão a Bruxelas que logo na discussão do Orçamento avisou para riscos de derrapagem.
2016 precisa de um plano B
Quando o Governo de António Costa elaborou o Orçamento do Estado, a Comissão Europeia não validou o esforço de ajustamento estrutural anunciado pelo Executivo, mas deixou passar. Além deste diferendo, Bruxelas identificou riscos para a execução orçamental e exigiu, em Fevereiro, que Portugal preparasse medidas adicionais para usar quando fosse necessário. Desde essa altura, Bruxelas aproximou-se de Lisboa – ambos os executivos prevêem défices abaixo de 3%. No entanto, continuam separados por 900 milhões de euros, com a economia a não dar sinais de retoma que mitiguem os riscos orçamentais.
Planos para próximos anos ficam aquém do previsto
O Programa de Estabilidade, que avança previsões novas para 2017 a 2020, é outra das peças que servirá à Comissão na avaliação a Portugal. Neste documento, o Governo compromete-se a reduzir o défice. No entanto, prevê correcções ao saldo estrutural sempre abaixo do previsto nas regras europeias; e promete poupanças vagas que são consideradas arriscadas. O Governo conta em 2017 já beneficiar da flexibilização do Pacto de Estabilidade e Crescimento, mas esta benesse ainda não foi negociada com a Comissão.
OS QUATRO CONTRA-ARGUMENTOS DO GOVERNO PORTUGUÊS
Sanções inéditas a um "bom aluno" não fazem sentido
A possibilidade de a Comissão Europeia decidir aplicar sanções a Portugal, através do corte de fundos estruturais, resulta de novas regras criadas para os fundos durante o período da crise e que entraram em vigor em 2013. Até agora nenhum país foi alvo destas sanções e, por isso, seria de esperar que a estreia aconteça numa situação óbvia, que não divida os comissários, o que parece não ser o caso de Portugal.
Governo promete cortar défice para menos de 3%
Um Governo que entra de novo tem sempre o início de funções como atenuante. É assim cá dentro e também lá fora. Além disso, o Executivo de António Costa pode sempre argumentar que, mesmo sendo um Governo com apoio de esquerda no Parlamento de partidos críticos da Comissão Europeia, tem feito esforços para prometer baixar o défice e conseguiu até que o apoio do Bloco e do PCP em torno do Programa de Estabilidade. Costa promete uma saída do Procedimento por Défices Excessivos já este ano, uma possibilidade que não é afastada pela Comissão Europeia, e que a confirmar-se será o "melhor défice dos últimos 43 anos", segundo o primeiro-ministro.
Há problemas a mais na Europa
A crise dos refugiados, o referendo à permanência do Reino Unido na União Europeia e o impasse político em Espanha são alguns dos assuntos que mais preocupam os responsáveis da Comissão Europeia. O Governo português conta que este enquadramento acabe por beneficiar a causa portuguesa. Ou seja, a Comissão evitaria acrescentar aos problemas que já existem outro tipo de complicações. Ainda para mais quando, além de Portugal, também Espanha poderá ser alvo de sanções, o que juntando à Grécia – ainda a braços com o último resgate – poderia recuperar um problema que todos julgavam estar já ultrapassado: as contas públicas dos países do sul da Europa.
Travão ao investimento e multas são contraproducentes
Não faz sentido cortar fundos estruturais a um país que precisa de investimento como de pão para a boca. A tese pode vingar junto da Comissão Europeia que na hora de pensar nas sanções terá de ter em conta também a situação económica do país – este argumento começou já a ser ensaiado pelo ministro das Finanças, numa altura em que os dados económicos para o primeiro trimestre apontam para uma quase estagnação da economia.