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Itália entra em recessão e arrisca novo confronto com Bruxelas

O governo italiano fala em "fase transitória" e anuncia já a recuperação para o segundo semestre, contudo certo é que Itália entrou oficialmente em recessão. Metas para o crescimento são praticamente inalcançáveis, o que poderá exigir um orçamento retificativo e um novo embate com a UE. Bruxelas não comenta, por agora.

EPA
31 de Janeiro de 2019 às 20:28
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A economia transalpina encolheu nos dois últimos trimestres de 2018 (-0,2% no quarto e -0,1% no terceiro), o que significa que Itália entrou oficialmente em recessão. Assim, as consideradas otimistas metas fixadas pelo governo italiano para o PIB em 2019 ficam mais distantes, se não impossíveis de alcançar, o que não só poderá exigir um orçamento retificativo como reabrir a porta a nova confrontação com Bruxelas.

Por partes. Em Setembro, o então ainda recém-formado governo de aliança entre 5 Estrelas e Liga projetava uma expansão económica de 1,5% para este ano, objetivo entretanto revisto em baixa para 1%. O produto transalpino cresceu 1% em 2018 (tinha crescido 1,6% em 2017), abaixo dos 1,2% antecipados pelo executivo liderado pelo primeiro-ministro Giuseppe Conte.

Isto significa que é gerado um efeito cascata em 2019 equivalente a -0,2%, o que, aliado ao abrandamento do conjunto da Zona Euro, põe em cheque o cumprimento das metas inscritas por Roma num orçamento expansionista que foi aprovado a custo e classificado pelas principais instituições internacionais como demasiado otimista

O Il Sole 24 Ore refere que esta deterioração faz com que mesmo as previsões de instituições como a Comissão Europeia ou o FMI surjam agora como demasiado otimistas. Citada por aquela publicação, Stefania Tomasini, analista da Prometeia, considera que o PIB terá uma evolução em 2019 situada entre 0% e 0,5%. Ainda mais pessimista, o economista-chefe do Centro Europa Ricerche, Antonio Forte, antecipa que a economia "vai crescer abaixo de 0,5%". Em outubro, a Comissão previa uma expansão de 1,1% neste ano.

Apesar de ser a terceira recessão em 10 anos, Giuseppe Conte considera tratar-se somente de uma "fase transitória" e garante que a retoma chegará já na segunda metade do ano. O líder do governo reiterou a importância de reforço do investimento público, e também privado, como via para recolocar a economia numa trajetória ascendente. E conta com a entrada em vigor, a 1 de abril (pelo que não produz efeitos no primeiro trimestre), do rendimento de cidadania para os mais pobres, acreditando que esta medida vai potenciar a capacidade de compra e animar a procura interna. Forte e Tomasini mostram maior preocupação relativamente à fraca procura interna do que em relação ao ambiente externo, até porque a procura externa teve um efeito positivo no PIB.

Orçamento retificativo?

Depois de há duas semanas ter dito que Itália caminhava para um "boom económico", o líder do 5 Estrelas e vice-primeiro-ministro, Luigi Di Maio, considera que os números agora conhecidos mostram que o anterior governo "mentiu" ao dizer que a crise havia sido superada. Já o ministro titular das Finanças, Giovanni Tria, exclui qualquer necessidade de retificar o orçamento aprovado no final de dezembro pelo parlamento, salientando, ao invés, a redução registada nas últimas semanas no diferencial entre os juros da dívida italiana e alemã.

A confiança de Tria baseia-se no facto de o orçamento negociado com a Comissão Europeia – que chumbou, de forma inédita e em duas ocasiões, a proposta orçamental do governo eurocético – prever já uma espécie de mecanismo retificativo no valor de 2 mil milhões de euros, verba congelada por seis meses e que pode ficar cativa durante todo o ano de 2019 em função de uma eventual degradação do clima económico.

Todavia, as contas feitas pelo La Stampa apontam para que na primavera as autoridades governamentais possam ter de cortar pelo menos mais 2 mil milhões de euros. Isto em face dos dados atuais, pelo que se a conjuntura piorar ainda mais, o buraco poderá ser maior.

Seja como for, os números agora conhecidos poderiam elevar o défice orçamental de 2019 dos 2% acordados com Bruxelas para um intervalo entre 2,2% e 2,5%, hipótese que poderá merecer reprovação da Comissão Europeia, já que no final do ano passado rejeitou a proposta de 2,4% feita por Conte.

Ao Negócios, um porta-voz da Comissão Europeia diz que a instituição liderada por Jean-Claude Juncker não se pronuncia sobre dados divulgados por institutos nacionais (foi o italiano Istat a revelar os dados), acrescentando que Bruxelas apresentará as suas próprias projeções a 7 de fevereiro (Previsões de Inverno).

É certo, porém, que a implementação do orçamento italiano está a ser monitorizada com especial atenção pela Comissão Europeia, não apenas por se tratar de um documento aprovado a ferros, mas também porque as dúvidas suscitadas quanto à sua exquibilidade aumentam em função de uma conjuntura mais desfavorável.

Giovanni Tria argumenta que não existe risco de incumprimento das metas porque o abrandamento económico insere-se no âmbito das variáveis macroeconómicas e que, na ótica de Bruxelas, é o saldo estrutural (que mede se houve ou não consolidação orçamental) que conta, já que exclui os efeitos do ciclo económico. Contudo, o impacto negativo provocado pelo abrandamento económico impacta no aumento do défice e do endividamento. Itália tem já a segunda maior dívida pública (em torno de 131% do PIB) da área do euro, só atrás da Grécia. 

O jornalista Mario Sensini escreve no Corriere della Sera que esta era já uma "notícia esperada" e que não vai provocar grandes mudanças no programa do governo 5 Estrelas-Liga. No entanto "vai tornar mais difícil a gestão das contas públicas, já sob apertada monitorização de Bruxelas".

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