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Abrir mais os cordões à bolsa? "Não", responde Schäuble
"Penso que as recomendações da Comissão Europeia foram dirigidas ao país errado", afirmou o ministro alemão das Finanças.
O pedido de mais estímulos orçamentais, feito pela Comissão Europeia na semana passada com o propósito de sustentar o crescimento e o emprego na Zona Euro, não deve ser dirigido à Alemanha, porque a maior economia europeia tem ao longo da última década aumentado a despesas de investimento cinco vezes acima da média dos seus pares. A recusa e a argumentação são do ministro alemão das Finanças, Wolfgang Schäuble.
"Penso que as recomendações da Comissão Europeia foram dirigidas ao país errado", disse nesta terça-feira, 22 de Novembro, o ministro perante a câmara baixa do Bundestag num debate sobre o Orçamento para 2017. Citado pela Reuters, Schäuble frisou que o investimento na Alemanha cresceu 3,9% entre 2005 e 2015, quando na média da Zona Euro subiu em média 0,7%.
A Comissão Europeia lançou na semana passado um apelo à Alemanha para que gaste mais do que está a prever nos Orçamentos dos próximos anos, de modo a ampliar os esforços de recuperação da economia do euro, excessivamente assentes nas políticas de baixos juros e de compra de dívida do BCE. Esse pedido está implicitamente contido na recomendação para a política orçamental agregada da Zona Euro que foi pela primeira vez emitida por Bruxelas, dando seguimento a uma velha reivindicação do Sul e do FMI que, nos anos mais severos da crise, criticaram a deriva austeritária assumida pela generalidade dos países do euro, incluindo a Alemanha que nunca sentiu dificuldades de financiamento.
A Comissão pede uma orientação "moderadamente expansionista" para o conjunto da Zona Euro, propondo um estímulo orçamental equivalente a 0,5% do PIB, o que é praticamente o avesso do resultado das directrizes definidas em Julho pelo Eurogrupo para os orçamentos nacionais que resultam, em termos agregados, numa orientação orçamental "moderadamente restritiva para o conjunto da área do euro em 2017 e 2018". Na opinião da Comissão Europeia, isso "não parece apropriado", devido à necessidade de apoiar a retoma económica, os esforços do BCE, mas também de combater "a incerteza crescente que se verifica neste momento" (numa possível alusão à vitória de Donald Trump nas eleições presidenciais norte-americanas).
Mudar a orientação da política da Zona Euro como um todo significa que quem tem margem orçamental – como é o caso, desde logo, da Alemanha, que há dois anos apresenta excedentes – deve gastar mais nos próximos anos do que está a prever. Já os países que ainda estão aquém dos objectivos orçamentais, como é o caso de Portugal, "têm, acima de tudo, de se concentrar" nas suas metas, acrescentou então o comissário dos Assuntos Económicos, Pierre Moscovici.
Em vésperas de ano eleitoral – em Setembro de 2017 os alemães voltam às urnas - Schäuble argumentou que o governo foi capaz de aumentar os gastos graças aos baixos custos dos empréstimos e ao aumento das receitas fiscais. Contudo, acrescentou, é provável que as receitas diminuam nos próximos anos (as previsões oficiais apontam para uma desaceleração da actividade económica, de 1,8% para 1,4%) e as taxas de juros, já perto de zero, não ficarão mais baixas, dando à Alemanha menos margem de manobra orçamental, que planeia aumentar os gastos com a defesa e na tentativa de combater as causas da migração em África.
Membro veterano do partido conservador (CDU) de Angela Merkel, Schäuble instou todos os partidos políticos a serem "tão honestos e realistas quanto possível" sobre as possibilidades orçamentais da Alemanha na próxima campanha eleitoral. "Quanto melhor o conseguirmos, menos espaço deixaremos para aqueles que querem enfraquecer a democracia com chavões demagógicos e populistas". "A honestidade realista é a melhor pré-condição para proteger a liberdade, o Estado de Direito e a democracia", argumentou.
Escreve a Reuters que vários deputados da oposição atacaram a orientação política do governo de manter o orçamento equilibrado, acusando a coligação CDU/SPD de negligenciar os salários baixos e, de nessa medida, contribuir para a ascensão do AfD – partido de extrema-direita que quer retirar a Alemanha do euro e da União Europeia e fazer marcha atrás na política de acolhimento de refugiados, e que pode, pela primeira, conquistar assentos no parlamento alemão.
"O AfD é filho das políticas da grande coligação", disse Gesine Loetzsch, do Die Linke, partido radical de esquerda. "É hora de você perceber que a política de austeridade levou a Europa a uma profunda crise", acrescentou.
Sven-Christian Kindler, dos Verdes, considerou, por seu turno, ser errado manter "obstinadamente" uma política de rigor orçamental em tempos de baixas taxas de juros e de alto desemprego juvenil em muitos países da Zona Euro, mas também na Alemanha. "Precisamos de medidas contra a desigualdade social neste país, é disso que precisamos agora", disse.
Eckhardt Rehberg, especialista em orçamento da CDU, rejeitou as acusações e defendeu a política de equilíbrio, ou de "défice zero", de Schäuble. "Ter 'défice zero' significa ser justo com as gerações futuras", argumentou, acrescentando que a Alemanha tem aumentado os gastos públicos em infra-estruturas, em segurança e com os imigrantes.