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May pede flexibilidade. UE disponível para nova proposta sobre fronteira irlandesa
O ambiente parece ter desanuviado no dia em que os líderes europeus se reúnem numa cimeira informal para tentar desbloquear o processo relativo ao Brexit. Londres pede a Bruxelas que não persista em exigências "inaceitáveis" e a União mostra-se aberta a melhorar a proposta sobre o mecanismo de salvaguarda na questão da fronteira entre as duas Irlandas.
Após meses de bloqueio negocial entre o Reino Unido e a União Europeia, surgem agora melhores perspectivas quanto a um eventual acordo, isto no dia em que a cidade austríaca de Salzburgo acolhe uma cimeira informal precisamente marcada com o objectivo de desbloquear as conversações para a saída britânica do projecto europeu (e também para discutir a questão da política migratória europeia que continua a provocar divisões).
"Nenhum dos lados pode exigir ao outro o inaceitável" se o objectivo for alcançar um acordo sobre a relação futura entre os dois blocos depois de efectivado o Brexit, agendado para Março do próximo ano, avisou a primeira-ministra britânica em declarações ao jornal alemão Die Welt publicadas esta quarta-feira, 19 de Setembro.
Sob forte contestação ao nível interno, designadamente devido às exigências feitas pela União Europeia, Theresa May assume que na intervenção de 10 minutos que dirigirá hoje aos restantes líderes europeus irá pedir maior flexibilidade relativamente à exigência de Bruxelas respeitante ao chamado "backstop" (uma espécie de mecanismo de salvaguarda) para o problema relacionado com a fronteira entre a Irlanda e a Irlanda do Norte. No fundo, trata-se de uma cláusula impeditiva do estabelecimento de controlos rígidos na fronteira entre as duas Irlandas.
De acordo com o Politico, e já a antecipar o encontro informal de hoje na Áustria, o chefe da equipa negocial europeia para o Brexit, Michel Barnier, admitiu repensar e "melhorar" a proposta europeia que tem como objectivo evitar a criação de uma fronteira física entre as duas Irlandas. Também May quer evitar o regresso de controlos fronteiriços que ponham em causa os progressos alcançados na relação entre Dublin e Belfast.
"Estamos preparados para melhorar a nossa proposta. O trabalho na UE está em curso. Vamos clarificar quais os bens que chegados à Irlanda do Norte do resto do Reino Unido precisem ser controlados, onde, quando e quem deve fazer essas verificações", explicou ontem Barnier aos jornalistas presentes em Bruxelas.
De acordo com uma fonte diplomática europeia citada pelo Politico, Michel Barnier explicou que dos quatro tipos de inspecção de bens feitas ao abrigo das regras europeias (sanitária, alfandegária, fiscal e regulatória), só a que diz respeito às questões de higiene e saúde teria de ser obrigatoriamente efectuada na fronteira irlandesa.
O conflito em torno desta questão é, nesta altura, o maior obstáculo a um acordo que permita enquadrar a forma como se irão relacionar a UE e o Reino Unido depois de consumado o Brexit. Sem um acordo capaz de assegurar uma saída britânica ordeira, prevaleceria um vazio legal na relação entre os dois blocos, o que a acontecer abriria espaço a um conjunto incertezas de desfecho imprevisível.
Apesar de Theresa May ter inicialmente aceitado a inclusão do chamado "backstop" no acordo que viesse a ser alcançado entre as partes, a pressão interna dos chamados "hard brexiters" (defensores de uma saída dura da União) levou a uma mudança de posição da chefe do governo britânico, que considera que esse mecanismo criaria uma divisão constitucional e económica "inaceitável" entre a Irlanda do Norte e o resto do Reino Unido.
No essencial, a posição europeia consiste na necessidade de um mecanismo de salvaguarda que assegure que a Irlanda do Norte (parte do Reino Unido) continue obrigada a respeitar as regras aduaneiras estipuladas pelo mercado único europeu, isto mesmo que o Reino Unido adopte outro tipo de relação comercial com a União. Note-se que Londres rejeita continuar a respeitar a liberdade de movimento de cidadãos, uma das quatro liberdades de movimentos fundamentais do mercado único que Bruxelas considera indivisíveis (as outras dizem respeito a capitais, bens e serviços).
Em jeito de conclusão, May considera que da mesma forma que Londres "evoluiu na sua posição, a UE tem de fazer o mesmo". Esta terça-feira, o presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, alertava para a possibilidade real de em Março não haver condições para fechar um acordo com o Reino Unido devido à demora nas conversações.