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Secessionistas garantem controlo da Mesa e presidência do parlamento catalão

Na abertura da nova legislatura e com os votos do bloco independentista, Roger Torrent (ERC) foi eleito presidente do parlamento da Catalunha e as forças soberanistas garantiram o controlo sobre a Mesa da instituição.

Reuters
David Santiago dsantiago@negocios.pt 17 de Janeiro de 2018 às 14:11

Dificilmente poderia ter sido mais invulgar a sessão de abertura da XII legislatura do parlamento da Catalunha. Com a bancada do governo autonómico vazia – a região está temporariamente sob governação de Madrid – e com alguns assentos parlamentares de deputados eleitos que estão detidos ou em Bruxelas vagos – sinalizados com laços amarelos – Roger Torrent, deputado da Esquerda Republicana (ERC), foi eleito presidente do parlamento regional com o apoio em bloco das forças independentistas.

 

Torrent, que se torna no mais novo presidente do "parlament" desde a transição democrática, contou com 65 votos a favor face aos 56 votos recolhidos por José María Espejo-Saavedra, do Cidadãos (partido vencedor das eleições autonómicas de 21 de Dezembro, que resultaram em nova maioria parlamentar do bloco secessionista). Josep Costa da aliança Juntos pela Catalunha de Carles Puigdemont foi eleito primeiro vice-presidente e Espejo-Saavedra segundo vice-presidente.

 

A restante Mesa do parlamento será ainda composta por Eusebi Campdepadrós (primeiro secretário) do Juntos pela Catalunha, por David Pérez dos socialistas catalães (PSC) como segundo secretário, por Joan García (Cidadãos) e por Alba Vergés (ERC). Dos sete membros da Mesa, quatro pertencem a forças independentistas e os outros três a partidos unionistas.

 


O novo presidente do parlamento catalão beneficiou do voto dos deputados independentistas (Juntos pela Catalunha, ERC e CUP), beneficiando ainda da abstenção dos oito parlamentares eleitos pela aliança Catalunha em Comum Podemos. Torrent foi apenas eleito à segunda votação (em que basta uma maioria simples), já que na primeira não conseguiu a maioria absoluta dos votos.

 

No discurso feito já como presidente do parlamento, Roger Torrent lembrou os oito deputados independentistas ausentes, criticou a activação do artigo 155 e prometeu trabalhar para merecer a " confiança" de todos os deputados. Lembrou ainda a ex-presidente do parlamento, Carme Forcadell, que foi libertada após pagamento de fiança, para quem o plenário catalão tem de ser "um lugar para falar sobre tudo".

 

Antes da votação, a sessão começou por ser presidida pelo presidente da Mesa da Idade (o deputado mais velho presente), Ernest Maragall, que no discurso inaugural teceu duras críticas ao governo central, em especial contra o recurso ao artigo 155 da Constituição que suspendeu a autonomia catalã e provocou eleições antecipadas (21-D).

 

Através da interpretação de Maragall aos regulamentos, este soberanista autorizou que os três deputados eleitos que se encontram detidos, Oriol Junqueras, Joaquim Forn e Jordi Sànchez, pudessem delegar o respectivo voto noutro deputado. O primeiro fê-lo em Marta Rovira e os outros dois em Jordi Turull.

 

Apesar da contestação de Inés Arrimadas, a líder do Cidadãos na Catalunha, e do PP, que pediram a Maragall para "reconsiderar" a sua decisão, este recorreu ao artigo 93 do regulamento que possibilita delegar o voto em caso de "incapacidade prolongada" para se justificar. Já Miquel Iceta (líder do PSC) considerou que a Maragall fez a "melhor interpretação possível".

 


O presidente deposto do governo catalão (Generalitat), Carles Puigdemont, e os restantes cinco deputados eleitos que se encontram na Bélgica para evitar a detenção pelos crimes de sedição, rebelião e desvio de fundos, optaram por não pedir a delegação dos seus votos de forma a evitar que esta sessão de abertura pudesse ser impugnada pelo Tribunal Constitucional.

 

Catalunha inicia novo caminho de incerteza

 

Agora que foi constituído o parlamento regional correspondente à XII legislatura, começa a contar um prazo de 10 dias úteis para a realização do debate de investidura. É aqui que tudo se complica, porque se a eleição do presidente do parlamento e composição da Mesa era, polémicas à parte, um dado adquirido, antecipa-se que a eleição do próximo presidente da Generalitat seja um processo tortuoso.  

 

Puigdemont e os outros deputados exilados deverão, agora que a Mesa está constituída por uma maioria soberanista, solicitar junto deste órgão a possibilidade de delegação do voto noutros deputados tendo em vista o debate de investidura.

 

Esta terça-feira, Juntos pela Catalunha (que integra o PDeCAT de Puigdemont) e ERC chegaram a acordo para apoiarem a investidura do presidente destituído, no entanto a esquerda secessionista mantém reticências quanto à possibilidade de uma investidura "telemática" (videoconferência) do político catalão. Citando fontes da ERC, o El Mundo escreve que o partido "não discutiu" essa via no acordo feito com o Juntos pela Catalunha.

 

Além das dúvidas da ERC, o regulamento do parlamento catalão estabelece como obrigatória a presença do candidato a presidente da Generalitat no debate de investidura. Na segunda-feira, os serviços jurídicos do "parlament" escreveram um parecer a dar conta disso mesmo, embora esse documento não tenha carácter vinculativo.

 

Assim, uma decisão final sobre a hipótese de Puigdemont ser investido à distância – ou por delegação noutro deputado, cenário também já aventado – caberá ao presidente do parlamento e à Mesa, órgão responsável por reger os trabalhos e dirigir os debates.

 


Calres Puigdemont dispõe do apoio necessário para ser investido na sessão que previsivelmente decorrerá em 31 de Janeiro. Não conseguindo os 68 votos necessários, teria uma segunda oportunidade dois dias depois, na qual bastaria uma maioria simples dos votos.

 

Todavia, correndo o risco de ser detido assim que entrar em território espanhol, Puigdemont poderia ver a sua investidura suspensa por determinação do Tribunal Constitucional da Espanha ainda antes da votação que se prevê poder decorrer dentro de precisamente duas semans. As forças catalãs constitucionalistas e o governo de Mariano Rajoy já avisaram que vão recorrer ao TC para evitar uma investidura à distância.

 

Rajoy avisou ainda que se Puigdemont tentar esta solução, irá recorrer ao Senado (câmara alta do parlamento espanhol em que o PP dispõe de maioria) com vista ao prolongamento da vigência do artigo 155. 

 

Assim sendo, não só a sessão de investidura poderá ser bloqueada, podendo nem acontecer, como é possível que as instituições políticas catalãs entrem num bloqueio que poderá acabar com a necessidade de novas eleições autonómicas. Isto porque, se daqui a dois meses a Generalitat continuar sem presidente, haverá eleições antecipadas. Só os próximos dias poderão permitir perceber se a Catalunha entra num processo de normalização ou se, pelo contrário, agrava a crise vigente.

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