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Salários dos licenciados caíram 9% em cinco anos

Licenciados estão a passar ao lado da recuperação de salários. Em média ainda recebem menos 9% do que em 2011. Aumento da população com ensino superior e o controlo de admissões na Função Pública podem ajudar a explicar porquê.

Miguel Baltazar/Negócios
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A recuperação do mercado de trabalho está a puxar pelos salários dos portugueses, mas essa melhoria está a deixar para trás alguns dos mais qualificados. O salário líquido dos licenciados recuou em média 9% entre 2011 e 2016, segundo dados do Instituto Nacional de Estatística (INE). O aumento do número de licenciados, a sua colocação em empregos que não exigem essa habilitação, a maior valorização de mestrados e doutoramentos e as restrições à contratação no Estado ajudam a explicar porque é que os salários dos trabalhadores mais qualificados não acompanham a tendência geral da economia.

No inquérito que faz para apurar os dados do emprego, o INE também pede às pessoas que indiquem o valor aproximado do seu ordenado líquido mensal. A informação detalhada solicitada pelo Negócios revela que esse valor médio, relativo à ocupação principal dos licenciados, aumentou de ano para ano entre 1998 e 2007. A partir daí, começam a ser frequentes reduções, que se tornam permanentes no período entre 2012 e 2014. Nos dois anos seguintes, a hemorragia pára, mas os salários dos licenciados estabilizam e não seguem a tendência geral de recuperação da economia: o valor nominal estagna nos 1.223 euros por mês, um valor que se repete, em média, já nos primeiros dois trimestres deste ano.

Quem tem um diploma superior continua a ganhar mais do que quem não tem canudo, mas esse prémio é cada vez menor, mostram os valores do INE. Se, em 1998, os empregados com ensino superior ganhavam mais do dobro da média dos trabalhadores (+107%), em 2010 recebiam mais 72%. A quebra prossegue nos cinco anos seguintes, baixando para 46%.

Como em causa está o valor líquido, é possível que o forte aumento de impostos do programa de ajustamento seja uma das explicações. Mas não é certamente a única. Os quadros de pessoal, uma fonte que trata de forma exaustiva dados administrativos, retratando essencialmente o sector privado, também revelam uma quebra contínua da remuneração dos licenciados: o chamado "ganho", que inclui suplementos, recuou 5,6% entre 2011 e 2015. Para quem tem estudado o assunto, esta pressão sobre os licenciados é uma evidência.

"Há seis, sete anos o mercado de trabalho teve uma quebra forte, que coincidiu com maior oferta de licenciados. Tivemos ao mesmo tempo maior oferta e menor procura", refere João Cerejeira, co-autor de um estudo publicado em Março que analisou o prémio dos licenciados e dos pós-graduados, concluindo que se observa uma quebra nos primeiros (ver texto ao lado).

Tem havido um efeito de substituição: licenciados que ocupam os cargos anteriormente detidos por pessoas com o secundário. João Cerejeira
Professor da Universidade do Minho

Estado deixou de contratar

As políticas orçamentais de contenção da despesa pública também pressionaram em baixa os salários. "O facto de a Função Pública ter deixado de contratar diminuiu a procura de licenciados", refere Cerejeira. É também essa a primeira das explicações mencionadas por Francisco Madelino para ajudar a explicar a quebra, que não surpreende o professor do ISCTE. Ao ter absorvido, no passado, "grande parte da mão-de-obra qualificada", "o Estado pressionava o custo da mão-de-obra para cima", refere o antigo presidente do Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP).

Neste contexto, "tem havido um efeito de substituição", prossegue João Cerejeira: "licenciados ocupam os cargos anteriormente detidos por pessoas com o ensino secundário". "Turismo, restauração e call centers, onde os salários praticados não são elevados, começaram a absorver licenciados", concretiza Francisco Madelino.

E isso é mau?

Teoricamente, a mera redução do prémio dos licenciados - num país onde a diferença é particularmente elevada - não é necessariamente negativa, numa perspectiva de redução de desigualdades, aponta Madelino. Além disso, embora salários menos generosos possam ser frustrantes para a geração que está a entrar no mercado, eles podem atrair "mais empresas tecnológicas para Portugal, dando eventualmente origem a uma nova subida dos salários no futuro", refere João Cerejeira.

Contudo, a redução de salários denuncia um "problema estrutural" de produtividade que incentiva a emigração dos mais qualificados, como acrescenta Francisco Madelino. "As economias podem ser mais ou menos flexíveis nos despedimentos, mas uma empresa competitiva e inovadora tem de ter salários elevados. A estabilidade do emprego e a motivação é essencial".

Como possíveis soluções, o professor da Universidade do Minho defende a valorização do ensino profissional e o cruzamento de políticas entre o IEFP e o Ministério da Educação. Já o docente do ISCTE coloca a tónica em "factores que possam criar uma discriminação positiva, em termos fiscais e de contribuições, para empregadores que promovam a estabilidade", evitando contratos precários. A ideia está a ser promovida há dois anos pelo Governo – que ainda não esclareceu quando avança.




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