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Música para recordar a revolução, quarenta anos depois

"Grândola, Vila Morena" e "E depois do adeus" são canções emblemáticas do 25 de Abril de 1974, mas 40 anos depois há quem escolha outras músicas que não só lembram a revolução como ainda fazem pensar sobre a actualidade.

25 de Abril de 2014 às 15:00
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"FMI", a música que José Mário Branco escreveu em 1979, "devia passar pelo menos uma vez por dia em todas as rádios", afirmou o músico Paulo Furtado, The Legendary Tigerman, à agência Lusa. "Talvez acordasse este povo que tão sereno está", adiantou.

 

Quarenta anos depois da revolução, Paulo Furtado escolheu aquela música por lhe ter marcado a adolescência e por ser a que, ainda hoje, o faz pensar sobre o que se passou no país desde o 25 de Abril.

 

"Muito inteligente e cáustica", disse, "FMI" é uma das mais conhecidas composições de José Mário Branco, escrita quando tinha 37 anos, um texto apaixonado e desencantado sobre o país, retrato dele e da sociedade.

 

"Aquelas palavras fazem muito sentido agora. Não é por ter asneiras no meio que a coisa acorda as pessoas. Não há outro remédio senão berrar, senão exigir e reclamar alto e bem alto, para que as pessoas oiçam", afirmou o músico.

 

Para Paulo Furtado, 43 anos, os portugueses deviam aproveitar esta efeméride para "fazer balanços": "Reflectir se é este tipo de políticos que queremos (...). Acho que há muito poucas boas pessoas na política". "Os bons não querem sujar as mãos, não querem estar misturados com cargos partidários, ser 'jotinhas'".

 

Luís Varatojo, que foi dos Peste & Sida e faz hoje parte de A Naifa, tinha nove anos quando se deu a revolução. Em entrevista à Lusa, recordou ser levado a manifestações e da "predisposição das pessoas para se juntarem e irem para a rua fazer alguma coisa pelos outros e em prol da sociedade".

 

Por isso, quando se fala em "25 de Abril", lembra-se sempre da música "Portugal ressuscitado", de Ary dos Santos (texto) e Fernando Tordo (música), para as vozes de Tordo, Tonicha e do grupo In-Clave: "A canção é um bom símbolo dessa época".

 

Gravada pouco depois da revolução, a canção é reconhecível sobretudo pelo refrão, entoado ainda hoje em muitas manifestações: "Agora, o povo unido nunca mais será vencido".

 

Luís Varatojo diz que não se pode comparar o que é hoje Portugal com o que era há 40 anos, excepto numa coisa: "Eu acho que tem a ver connosco, com o povo português; está adormecido, foi espezinhado novamente e não reage".

 

"O que nos tentam enfiar todos os dias é que a situação é assim e não tem volta a dar. Cada um é melhor é ficar em casa sossegadinho, com as suas pantufas, no seu sofá, a ver a 'Casa dos segredos' e o 'Festival da Canção' e que assim é que a vida vai para a frente", criticou.

 

O músico lamentou ainda que a efeméride esteja a ser tratada "de uma forma muito conservadora", porque "não se está a fazer passar a mensagem certa para as gerações mais novas": "É que a revolução é um tema altamente apelativo para a juventude."

 

Esta ideia de desmotivação dos portugueses é partilhada por Pedro Silva Martins, guitarrista e principal compositor dos Deolinda.

 

Já nasceu depois do 25 de Abril de 1974 - tem 37 anos -, e tem a percepção de que "o terreno não está fértil para esse tipo de ideais e de mudança", como explicou à agência Lusa.

 

Olhando para trás, o músico percebe que havia "um sentimento de insatisfação com o que era vigente, com as situações de injustiça". Havia uma certa esperança misturada com desencanto.

 

É isso que encontra na música "Eu vim de longe" (1982), de José Mário Branco, a sua escolha para fixar uma memória sobre o 25 de Abril de 1974.

 

Na música, José Mário Branco registou o que sentiu e viveu, no regressou do exílio, de Abril de 1974 e Novembro de 1975: "Quando a nossa festa s'estragou/ e o mês de Novembro se vingou/ eu olhei p'ra ti/ e então entendi/ foi um sonho lindo que acabou/ houve aqui alguém que se enganou".

 

"Há canções muito simbólicas sobre o 25 de Abril, mas prefiro esta", disse Pedro Silva Martins, justificando que é de um autor que estima e porque nela transparece "a desilusão de uma ideia que existia para o 25 de Abril, mas com a esperança de que essa ideia possa vir a ser renovada no futuro".

 

Hoje, da observação diária que faz, e que transpõe para o repertório dos Deolinda, o guitarrista repara que "as pessoas estão desmotivadas, de costas viradas" e "tentam viver a vida como podem".

 

Para quem não viveu os anos de mudança pós-revolução, como a cantora e compositora Francisca Cortesão, de 30 anos, a aproximação a essa época é feita muitas vezes pela música.

 

Os discos de José Afonso, José Mário Branco ou Sérgio Godinho sempre estiveram presentes e vão sendo redescobertos. "As pessoas têm um bocado a mania das efemérides. Mas se servir para as pessoas 'reouvirem' os discos, faz sentido", disse à agência Lusa.

 

Com a nostalgia de quem não viveu os anos quentes de democracia, Francisca Cortesão, que é conhecida como Minta, escolhe a canção "Tinha uma sala mal iluminada", de José Afonso, editada em 1978.

 

"É uma ideia um bocado romantizada de alguém que não viveu a fase do antes e do depois [da revolução], mas tem a ver com uma ideia de coletivo e de camaradagem que a esta distância me seduz. Acho comovente quando ele canta 'Mas se há um camarada à tua espera/ não faltes ao encontro e sê constante'. Acho mesmo bonito", disse.

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