Sem fim à vista
Desde 7 de outubro que tem sido dia de chorar mortos. Primeiro em Israel e depois, em muito maior escala, em Gaza. A resposta ao ataque do Hamas, deixou o território em ruínas e as vítimas não param de aumentar. Os apelos à paz multiplicam-se mas o conflito não dá sinais de abrandar.
Quando, há um ano, decidíamos - sem dificuldade, diga-se - qual era o acontecimento internacional do ano, estávamos longe de imaginar o que 2023 nos traria. À guerra na Ucrânia seguiu-se a guerra em Gaza. É o reacender de um conflito que nunca deixou de existir, mas que agora atinge proporções de desastre humanitário.
Tudo começou a 7 de outubro, quando o grupo radical Hamas lançou um ataque sem precedentes em território israelita, matando 1.200 pessoas e sequestrando outras 240. Correção: não foi assim que tudo começou, este é um conflito com mais de 70 anos. Desde o nascimento do Estado de Israel, idealizado como um porto de abrigo para todos os judeus perseguidos, que a tensão com a população árabe da região foi uma constante. Centenas de milhares de palestinianos foram violentamente expulsos do território onde viviam, num episódio que ficou conhecido como Al Nakba, "A Catástrofe". De então até hoje nunca houve um acordo de paz, as guerras sucederam-se e nos últimos 50 anos Israel construiu colonatos na Cisjordânia e Jerusalém Oriental, onde mais de 700 mil judeus hoje vivem. Pelo meio, o Hamas subiu ao poder em Gaza, e em Israel Benjamin Netanyahu lidera um Governo de braço dado com a extrema-direita.
É neste caldo geopolítico que surgem os acontecimentos de outubro. Israel respondeu com mão pesada ao ataque do Hamas e os números, ainda que venham de um lado da barricada, são esmagadores: 14 mil mortos, 1,8 milhões de civis deslocados em Gaza (80% da população), números já equiparados a uma nova "catástrofe". Foi apenas possível negociar um breve cessar-fogo, mas o fim desta guerra anunciada não se vê no horizonte.
Boicotes e petróleo
O impacto do conflito extravasou fronteiras. Pelas ruas das capitais mundiais, milhões protestam e boicotam marcas, empresas, eventos. Por cá, por exemplo, a Web Summit ficou possivelmente ferida de morte após críticas do CEO a Israel.
Num mundo globalizado, um dos grandes receios começou por ser o petróleo. Um relatório do Banco Mundial, do final de outubro, alertava que o conflito podia gerar um "choque" económico, com os preços do crude a disparar para os 150 dólares por barril. Foi assim em 1973, quando os membros árabes da OPEP impuseram um embargo à venda de petróleo aos EUA em retaliação pelo apoio militar a Israel. Mas até agora isso não se verificou.
O aparente reduzido contágio internacional é, no entanto, frágil. Uma escalada que atinja outros países na região, como o Líbano e o Irão, pode revelar-se desastrosa e ditar que esta seja, lamentavelmente, a guerra do eterno retorno.