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Cante alentejano interrompe apresentação do livro de Henrique Raposo

O livro "Alentejo Prometido" de Henrique Raposo foi apresentado esta terça-feira. Depois de semanas de polémica, a cerimónia decorreu de forma calma, ainda que com direito a um protesto ao som de cante alentejano.

Bruno Simão
Liliana Borges LilianaBorges@negocios.pt 08 de Março de 2016 às 22:48

Sala cheia e cante alentejano. Assim se resume a apresentação do polémico livro de Henrique Raposo "Alentejo Prometido", editado pela Fundação Francisco Manuel dos Santos, que decorreu ao final da tarde desta terça-feira, 8 de Março, numa livraria Bertrand, no centro de Lisboa.

O livro ganhou eco nas redes sociais depois de o autor ter sido convidado no programa Irritações, da SIC Radical, para falar da obra. As declarações de Henrique Raposo sobre temas como o suicídio, a fé (ou a falta dela) e violações no Alentejo originaram uma onda de indignação entre muitos alentejanos. Fez-se uma petição, queimaram-se livros, criou-se uma página contra o livro no Facebook e ameaçou-se o autor. Ainda assim, a cerimónia de apresentação decorreu de uma forma tranquila e não foi necessária a intervenção dos agentes de polícia e da meia dúzia de seguranças privados presentes. Nem mesmo quando a apresentação foi interrompida por um grupo de cante alentejano. 

Alentejanos protestaram a cantar

Ainda Henrique Raposo não tinha falado quando um grupo composto por cerca de uma dúzia de homens se levantou entre os presentes e começou a entoar o cante alentejano. Quando acabaram, abandonaram a sala do edifício do Picoas Plaza. Um deles ainda soltou um "acabe-se com esta palhaçada", para ouvir uma resposta igual de um dos elementos da plateia. O autor manteve-se calmo e até bateu palmas no final do cante. 

Palavra entregue a Henrique Raposo e o autor começou por confessar que "estava à espera de perder metade da minha família com este livro" - argumentando que "quem o leu percebe porquê" - mas "está a ser o contrário". Henrique Raposo avisou que não iria falar do livro porque esse é um trabalho que cabe às pessoas. "Para falar do livro é preciso lê-lo".

O cronista do jornal Expresso não deixou no entanto de, à sua maneira, se defender das críticas das quais tem sido alvo. "Estamos num tempo de 'bullshit' em que não se pode dizer o que se pensa se não cai o Carmo e Trindade". Para Henrique Raposo vigora em Portugal uma "discussão entre o olhar cínico, brando e cómico de Eça [de Queiroz] e o duro e violento de Camilo Castelo Branco". Henrique Raposo deixa o aviso: vai continuar a escrever como tem escrito até agora, mesmo que escreva "como Camilo numa sociedade dominada pela comédia queirosiana". 

cotacao Estamos num tempo de 'bullshit' em que não se pode dizer o que se pensa se não cai o Carmo e Trindade. Henrque Raposo Autor do livro "Alentejo Prometido" e cronista no Expresso

"Portugal é melhor do que o que pensamos, mas também pior do que o que pensamos. E porque é que isso acontece? Porque Eça e os seus herdeiros querem criar um país mole onde não há dureza", concluiu. No entanto, o autor não deixou de sublinhar que não estava a criticar Eça de Queiroz, que considera o melhor escritor português, mas sim "o baixo queirosianismo que se tornou na única linguagem que os portugueses têm para falar de si próprios".

Ainda antes de Henrique Raposo, Henrique Monteiro, jornalista e cronista do Expresso, desvalorizava as críticas e lamentava que o grupo de cante alentejano não tivesse ficado para ouvir a apresentação, até porque acredita que o livro é "um hino de amor ao Alentejo", uma vez que "só conseguimos reconhecer os defeitos mais profundos aqueles que nos são próximos".

Também o escritor Rentes de Carvalho criticava as paixões acesas "que não deviam ter lugar numa sociedade civilizada e democrática".

O jornalista do Expresso reflectiu que "há sempre quem prefira que a sujidade se mantenha debaixo do tapete do tempo" e elogia Henrique Raposo por ter trazido o assunto a público, até porque "não é uma condição alentejana, é uma condição do país de há 50 anos". "Pelo que conheço de outras latitudes, a verdade não anda longe daquilo que escreveste", concluiu.

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