Notícia
Teatro: Poesia na banalidade dos lábios
Ele gosta de ver a poesia interpretada. A Jorge Pinto não interessam as palavras sem uma intenção. O toque dos lábios para sentir no Porto esta Páscoa.
Havia uma distância entre a poesia e o teatro. Uma espécie de intervalo criado por um poder que queria ver cada arte na sua gaveta. Hoje misturam-se rapidamente. "A interdisciplinaridade está a tornar a vida mais rica".
Jorge Pinto prepara-se para estreitar essa mistura em "Beijo". No mesmo palco, actores, quatro episódios escritos por Michel Deutsch e uma sucessão de poemas de autores portugueses contemporâneos.
É um ponto de partida para explorar a banalidade com que se tocam os lábios, ao bom jeito do horário nobre televisivo. "O aspecto competitivo, promocional e o aspecto rotineiro de quem se esquece da raiz e se reduz à prática". As relações configuram-se em diferentes sentidos.
"Não vejo os tempos actuais como uma degradação, mesmo com estas coisas das pessoas não comunicarem e olharem para um pequeno ecrã. O ser humano continua a ter necessidade de contacto físico".
Este espectáculo, no Mosteiro de São Bento da Vitória, Porto, é um comentário a quando o mundo "se esquece disso". Não uma reflexão ou uma crítica. "Não devo transformar o espectáculo numa lição de moral ou filosofia. Elas estarão implícitas. O espectáculo é um entretenimento, tenho de ter prazer a vê-lo. A reflexão é um segundo plano".
O encenador junta à palavra uma forte componente visual e sonora. "A transversalidade das estéticas já é um facto. Toda a gente fica a ganhar". É necessário filtrar toda a informação que circula hoje em dia e avançar no sentido de novas formas de exercer a profissão, diz. "Não é na primeira página do Google que se vai resolver a nossa formação".
Jorge Pinto tem os gostos bem definidos no que respeita ao texto poético. Não o quer ouvir a ser simplesmente lido, com um código musical que se foi agarrando com o passar do tempo. "Proponho outra coisa. Defendo que a poesia tem de ser interpretada". E deixa-se levar pela corrente do pensamento.
"Gosto da interpretação. Há muito pouca gente interessada em interpretar porque não há essa tradição [em Portugal]. Para mim, um texto poético tem a mesma necessidade de interpretação que outro texto qualquer. Não me interessa que me leiam poesia". Jorge Pinto só quer ouvir as palavras a tocarem uma outra dimensão.
Beijo Texto a partir de Michel Deutsch, Ruy Belo, Álvaro de Campos, Manuel António Pina, Mia Couto, David Mourão-Ferreira, Eugénio de Andrade, Maria Teresa Horta, José Luís Peixoto, Ana Luísa Amaral
Encenação de Jorge Pinto
Interpretação Emília Silvestre, Paulo Freixinho e Bárbara Pais, Maria Faria, Sara Pacheco
Onde: Mosteiro São Bento da Vitória, Porto
Quando: 23 a 27 de Março
Quanto: dez euros, com descontos aplicáveis