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Saltar à corda com os anos da incompreensão

Nos diários da nossa adolescência, os problemas e os receios eram uma constante. Mudava tanto em tão pouco tempo. Era uma autêntica Montanha-Russa. Como esta, naturalmente musical, que agora se instala em palco.

Filipe Ferreira
24 de Março de 2018 às 14:00
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Montanha-russa
A peça de Inês Barahona e Miguel Fragata está no Teatro Nacional D. Maria II até 27 de março. Depois de viajar até Duclair, em França, vai percorrer Portugal. Há já datas marcadas para Portimão, Torres Novas, Vila Real, Sardoal e Funchal até Julho. no porto, estará no Teatro Nacional S. João, de 31 de maio a 10 de junho.

"Esta é a canção da primeira vez" que andámos de Montanha-Russa. Sem cinto apertado. Prontos a cair nos tempos da adolescência, ser exploradores urbanos, saltar à corda, dançar a valsa dos incompreendidos, comer pizza de madrugada ou jogar minigolfe. Fizemos tudo isto sem sair do lugar.

A viagem vai-se traçando entre os anos 1970 e os nossos dias, da vida sem liberdade à experiência partilhada em directo nas redes sociais. As preocupações da adolescência, apesar destes saltos temporais à mostra num gigante relógio, são uma constante. Reflexo de um processo que Inês Barahona e Miguel Fragata começaram há mais de um ano, com a recolha de diários.

O caminho acabou por ser o da ficção, sem deixar de integrar elementos e episódios da pesquisa. Quatro histórias guiam-nos a Ciclone, uma montanha-russa que passou por Lisboa, Berlim e Lima. As ligações entre as personagens vão-se desvendando devagar, de forma natural, em detalhes como uma medalhinha da Senhora da Assunção ou a queda do Muro de Berlim.

Não há vertigens nesta deslocação por diferentes estados de alma. Os problemas são os típicos da adolescência, apresentados com urgência e novidade. De algum modo, todos nós já passamos por aquela etapa. Voltamos, agora, a passar nesta Montanha-Russa, metáfora clara desses dias passados. Vemos, rimos, relativizamos.

Anabela Almeida, Carla Galvão e Miguel Fragata são os cúmplices dos adultos neste jogo de aparências e essências. Já Bernardo Lobo Faria, por estar ainda próximo da adolescência, acaba por ser um aliado dos mais novos. À sua personagem, de uma forma intencional, falta uma certa profundidade. Porque, conclui-se, este rapaz ainda não teve tempo para reflectir sobre esses anos em que tudo "é velório ou carnaval".

Sai-se desta Montanha-Russa com uma sensação de bem-estar, sem "a alma do avesso" ou o "corpo noutro endereço". É tudo embalado na música de Hélder Gonçalves e na voz de Manuela Azevedo - ambos dos Clã, lembre-se. A banda em palco e a sua música acabam por funcionar como uma figura paternal, sem conflito, antes apaziguadora das ansiedades normais de quando se é jovem. Com uns certos despiques à mistura, obviamente.

Tudo se mantém simples: do texto ao movimento, passando pela iluminação ou pelo cenário. E, é por isso, que a mensagem passa de uma forma tão bonita. Fomos felizes nesses tempos, por muito que a tendência natural seja negá-lo.

Ao nosso jeito, subimos 26 metros, até ao topo da Ciclone, vivemos a tempestade do desconhecido a partir do seu epicentro. A nossa voz mudou, o nosso corpo mudou, as nossas paixões passaram. Debruçámo-nos para o abismo, por mais que nos dissessem para não o fazer. E foi espectacular!


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