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100 anos do prémio Pulitzer

Premeia jornalismo e artes. No próximo ano, marcará o centésimo aniversário desde o primeiro que foi atribuído, mas por textos publicados em Outubro e Novembro de 1916. Eram sobre a Primeira Guerra Mundial. Joseph Pulitzer sonhou premiar quem faz a diferença, e até quem muda o mundo. E conseguiu.

21 de Outubro de 2016 às 12:00
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O Pulitzer não é o Óscar do jornalismo. Isso mesmo disse Michael Pulitzer, neto do criador do prémio, a propósito das origens do galardão. E explicou: "Este prémio tem uma origem muito mais profissional e intelectual do que os galardões do cinema."

Tudo terá começado numa ilha do estado de Maine. Na pequena cidade de Bar Harbor, na sua mansão Chatwold (demolida em 1945), Joseph Pulitzer - o avô de Michael - terá sonhado com a ideia de premiar o jornalismo americano, em 1902. Um ano antes tinham começado a ser atribuídos prémios para a Química, a Literatura, a Paz, a Física e a Medicina, de acordo com a vontade do inventor sueco Alfred Nobel. Pulitzer sonhou com um prémio para o jornalismo. Um sonho que se realizaria após a sua morte. Joseph Pulitzer morreu em 1911 e, seis anos após a sua morte, o primeiro desses prémios foi anunciado pela Universidade de Columbia, que o próprio tinha escolhido para administrar o galardão.

O primeiro Pulitzer foi entregue em 1917 por uma história escrita precisamente há 100 anos, em Outubro de 1916. No testamento, redigido em 1904, Pulitzer deixou legado para os prémios, mas também para a educação e formação em jornalismo. O prémio deveria ser para o reconhecimento do "mais de-sinteressado e meritório serviço público alcançado no ano anterior por qualquer jornal americano". Por esse trabalho seria entregue uma medalha de ouro de 500 dólares, sem qualquer componente monetária. Mas também se previa a atribuição ao "melhor artigo editorial", com clareza de estilo, propósito moral, e com poder de influenciar a opinião pública na direcção certa; assim como ao melhor exemplo do trabalho de um jornalista durante o ano. Os prémios foram evoluindo e este ano anuncia-se já o reconhecimento às revistas impressas e digitais, mas as televisões e as rádios estão ainda excluídas. Actualmente, o Pulitzer tem 14 categorias. Premeia o jornalismo e as artes, mas tem resistido a entrar no cinema. Já entrou, no entanto, pela música, como esta acabou este ano por entrar no Nobel. E pela mesma pessoa. Bob Dylan não é apenas um nobelizado, como, antes, já tinha recebido um Pulitzer. Também ele polémico. Foi em 2008. E, segundo o júri, o agora Nobel da Literatura conquistou o Pulitzer pelo "profundo impacto na música popular e na cultura americana, marcada pelas composições líricas e pelo seu extraordinário poder poético".

O conselho está, no entanto, habituado às críticas. Isso mesmo é dito no site dedicado ao Pulitzer. E até dá como exemplo: muitas vezes, os livros premiados não estão na lista dos mais vendidos...

O primeiro Pulitzer

Outubro de 1916. O mundo estava mergulhado na Primeira Guerra Mundial. Herbert Bayard Swope, jornalista e correspondente de guerra, entrara no New York World em 1909. A guerra começaria em 1914. Swope escreveu da Alemanha no seu início. Quando regressou aos Estados Unidos, em 1915, passou a editor do World. No ano seguinte, voltou à linha de fogo para, em 1917, passar de repórter a soldado. Quando os Estados Unidos entraram no conflito, em 1917, Swope foi chamado ao serviço militar, destacado para a Marinha. Foi nesse mesmo ano que lhe foi atribuído o Pulitzer pelos textos sobre a Primeira Guerra Mundial que tinha escrito no ano anterior. E, como é descrito no site do Pulitzer, o prémio - por textos escritos há 100 anos (a 10 e 15 de Outubro e de 4 a 22 de Novembro de 1916) - chegou numa era em que "avião ainda era referido como aeronave e os pombos eram os transportadores de informação de alta velocidade".

O trabalho resultaria num Pulitzer. "A escolha dos primeiros vencedores pouco foi notada em 1917. Dois meses antes, o Presidente Woodrow Wilson tinha declarado guerra à Alemanha", conta Roy J. Harris Jr, no livro "Pulitzer's Gold", que conta a história dos vários premiados, em particular na categoria de serviço público, que, no entanto, não foi atribuída em 1917. Swope ganhou o Pulitzer na área da reportagem. Mais tarde, daria origem ao livro "Inside the German Empire" (que significa 'dentro do império alemão', livro que não foi editado em português). Nesse ano, só houve dois candidatos ao prémio. E só no ano seguinte, em 1918, é que foi atribuído, pela primeira vez, o prémio pelo serviço público. E quem ganhou foi o The New York Times, justificando-se a referência pelo "seu serviço público na publicação integral de vários relatórios, documentos e discursos oficiais por estadistas europeus, respeitante o progresso e a condução da guerra".

Roy J. Harris Jr, no livro referido, sugere que, por essa altura, o conselho nomeado para distinguir os jornalistas ter-se-á debatido com a dúvida do que se poderia destacar como serviço público.

Pioneiro na imprensa sensacionalista

Joseph Pulitzer, mentor do prémio, nasceu em 1847 numa cidade a 200 quilómetros de Budapeste, capital da Hungria. A família chegou a Boston tinha Joseph 17 anos, depois da morte do pai e falido o negócio que tinha criado. Chegou ainda a tempo de ingressar fileiras na guerra civil norte-americana, no âmbito da qual estrangeiros eram levados para os Estados Unidos para combaterem nessa guerra interna. Depois da guerra, andou por várias cidades no outro lado do Atlântico e foi tendo diversas profissões. Até que, em St. Louis, encontrou o seu futuro. Por acaso. Foi defraudado na promessa de um bom salário numa plantação de açúcar em Louisiana, o que se demonstrou ser uma fraude. Escreveu um artigo que foi publicado no Westliche Post, o que, segundo se conta na Wikipédia, terá sido a sua primeira reportagem publicada. Mais tarde, ficaria nesse jornal. Tornou-se cidadão americano quando, em 1867, renunciou ao Império Austro-Húngaro. Inscrever-se-ia no partido republicano, do qual saiu em 1872 para passar para o democrático. Nesse mesmo ano, comprou uma posição no jornal que o tinha contratado por três mil dólares, vendendo-a com lucro depois para comprar o St.Louis Dispatch e o St. Louis Post, criando o St. Louis Post-Dispatch. Pulitzer tornava-se um empresário de media, americano, casado com uma proeminente mulher de Washington, e, por essa altura, já com um domínio considerável do inglês. O seu biógrafo, James Wyman Barrett, conta a história de um "workaholic" que trabalhava de sol a sol, envolvendo-se em todos os pormenores da produção do jornal. A sua saúde era, no entanto, a principal prejudicada. E foi com a desculpa de embarcar num navio para uma viagem de descanso à Europa que, em 1883, viajou para Nova Iorque. Mas a viagem resultaria num outro destino: a compra do New York World, em dificuldade financeira.

A revolução começou. No The World, empreendeu cruzadas contra a corrupção pública e privada, começou a utilizar ilustrações, e, segundo conta a história, enveredou por aquilo que hoje se designa de jornalismo sensacionalista. O jornal era um espaço de causas. Fica a si associada a campanha para permitir que a Estátua da Liberdade entrasse no porto de Nova Iorque. Chegou a tirar um milhão de exemplares. O sucesso levou a uma luta acérrima com o rival The Sun. Mas a saúde traiu-o. Em 1890, com 43 anos, deixou a redacção, mas seguia todos os seus passos à distância. Demasiado, o que levou a algumas batalhas com o editor Frank Cobb. Cobb acabou por ganhar a sua independência. Pulitzer teve a oportunidade de fazer uma declaração histórica. Quando questionado, numa reunião de administração, porque falava de forma tão suave dos jornalistas e de forma tão severa dos editores, Pulitzer explicou: "Porque cada jornalista é uma esperança, e cada editor é um desapontamento."

Pulitzer morreu em 1911, deixando dinheiro para que a Universidade de Columbia pudesse iniciar uma escola de jornalismo, e instituir os prémios. O primeiro foi para um jornalista do seu próprio "filho", que voltaria a ser consagrado nos Pulitzer pela exposição das operações do Ku Klux Kan em artigos publicados em Setembro e Outubro de 1921. Neste ano, o prémio foi atribuído ao Boston Post por artigos escritos, no ano anterior, que denunciaram o esquema fraudulento de Charles Ponzi e que levaram à sua prisão.

Como se pretende, os Pulitzer visam destacar quem marca a sociedade norte-americana. Mas acabam por deixar marcas no mundo.

A divulgação dos Papéis do Pentágono (documentos secretos da Administração norte-americana sobre a Guerra do Vietname) ou a investigação do Watergate (que levou à renúncia pelo então Presidente dos Estados Unidos, Richard Nixon) valeram ao The New York Times (1972) e ao Washington Post (1973) o Pulitzer. Jornais repetentes e que já têm várias medalhas pelos seus trabalhos. O Washington Post repetiu o reconhecimento, novamente, em 2014, quando, juntamente com o Guardian US, revelou os esquemas de vigilância da NSA, a agência nacional de segurança, revelação permitida pelos documentos retirados da agência por Edward Snowden.

O Óscar para melhor filme em 2016 foi para... "Spotlight". A história já tinha garantido ao Boston Globe, em 2003 um Pulitzer, pela "corajosa e alargada cobertura" de casos de pedofilia por parte de padres da Igreja católica. O Pulitzer não é o Óscar, mas os dois até sabem andar associados.


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