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Embora tenham sido feitos progressos significativos na consciencialização e aceitação da agenda da sustentabilidade por parte dos conselhos de administração, os desafios em termos de capacidade e uma autodeclarada falta de conhecimentos revelam uma lacuna entre as intenções e a prática da agenda ambiental, social e de governação (ESG, na sigla em inglês), conclui o estudo "A Sustentabilidade Agita o Conselho de Administração", realizado pela Heidrick & Struggles em parceria com a BCG e o Centro de Governança Corporativa do INSEAD.
De acordo com o relatório, embora cerca de 80% dos diretores afirmem que o seu conselho de administração tem uma compreensão muito clara das oportunidades estratégicas e dos riscos apresentados pela sustentabilidade, apenas 29% têm conhecimentos suficientes para desafiar ou monitorizar a sua implementação.
Existe também, em alguns casos, uma atitude onde os elementos relacionados com ESG representam pouco mais do que uma "checklist" a preencher, destaca o inquérito global realizado junto de 19 indústrias de 45 países. "Existe ainda uma dispersão entre visão de curto prazo, mais focada em analisar riscos, e visão estratégica, mais focada nas oportunidades que a sustentabilidade pode aportar às empresas. Em parte, esta visão é ditada pelas competências e conhecimentos dos "board members", que podem travar ou acelerar o desempenho das organizações que estão a servir", refere Stefano Salvatore, partner da Heidrick & Struggles, ao Negócios.
O inquérito revela também que dois em três administradores consideram que a sustentabilidade tem pouco impacto no desempenho financeiro das empresas. Mais de metade dos diretores inquiridos afirmam que a sua principal motivação para incluir a sustentabilidade no conselho de administração é o facto de ser "a coisa certa a fazer" (52%) ou devido aos crescentes requisitos legislativos e regulamentares em matéria de sustentabilidade (51%). "Essas pressões são frequentemente positivas como alavancas para a mudança. Tanto as recomendações como as obrigações legais são sempre um motor muito forte, se não o mais poderoso, da transformação da empresa. O mesmo se aplica à pressão exercida pelos acionistas das empresas ou pelos grandes fundos de investimento", ressalta Stefano Salvatore.
Também o desempenho e a composição dos conselhos de administração são cada vez mais determinados por questões de sustentabilidade. Nesta linha, o estudo Board Monitor 2023 já havia revelado que 25% dos diretores que entraram para as empresas do PSI-20 no último ano têm experiência em sustentabilidade, em comparação com os 3% em 2022. Em 2021 nenhum dos novos administradores tinha qualquer experiência neste domínio.
"A agenda da sustentabilidade requer um maior exercício de autodisciplina, trabalho de introspeção e de questionar constantemente se o "board" realmente tem as qualificações e experiência adequadas", alerta o partner da H&S. Esta parte também aparece nos resultados do estudo: 35% dos elementos do "board" reconhecem desconhecer as implicações da sustentabilidade a longo prazo e como esta impacta verdadeiramente o negócio das empresas. Assim, menos de um quarto dos conselhos de administração afirma que a sustentabilidade terá um grande impacto na forma como a sua empresa é gerida e apenas um décimo acredita que afetará negativamente o desempenho financeiro da sua empresa a médio e longo prazo. "Isto implica um maior esforço na hora de analisar e apreender os fatores relacionados com ESG", acrescenta Stefano Salvatore.
De salientar que o estudo indica que, em geral, a fonte de informação sobre sustentabilidade, para 80% dos membros do conselho de administração inquiridos, é a própria equipa de gestão da empresa. Pelo contrário, o conselho de administração dedica muito pouco tempo ao que vem do exterior e apenas 18% dos membros inquiridos utilizam especialistas em sustentabilidade como fonte de informação. "Desta maneira, a visão desse "board" pode chegar a ser míope quando na realidade deveria ser muito mais progressiva", salienta o responsável.
No que respeita às indústrias, existe diferenças na abordagem da sustentabilidade. O estudo apurou que a lacuna de conhecimentos é considerável em quase todos os setores, embora seja mais pequena no setor da energia, onde 44% dos diretores inquiridos consideram ter conhecimentos suficientes para gerir as questões de sustentabilidade. O estudo mostra que nos setores da energia e financeiro a dedicação dos seus conselheiros aumentou consideravelmente devido aos novos riscos e oportunidades decorrentes da crescente procura de energia provocada pelas alterações climáticas.
As questões ambientais e de sustentabilidade são a principal prioridade (por oposição às questões sociais e de governança) para os conselhos de administração dos setores da energia, indústria, finanças e manufatura, ressalta a análise.
Para Stefano Salvatore, a primeira dificuldade das empresas para integrarem a sustentabilidade decorre do facto de estarmos perante uma nova cultura empresarial que implica aceitar a mudança de paradigma, as exigências ESG e interiorizá-las como parte intrínseca do desempenho das organizações. "A sustentabilidade é uma das chaves para este novo pensamento estratégico e a maioria das empresas ainda não começou com essa nova forma de atuar. Como dissemos, alguns setores estão mais avançados na sustentabilidade do que outros, mas para a integrar de forma eficaz ao longo do tempo é necessário dar um passo em frente", refere.
Por isso, tendo em conta que apenas 13% dos conselhos de administração consideram a sustentabilidade como um fator crítico para a sobrevivência da empresa a médio e longo prazo, "as empresas e os seus órgãos de governança devem ter uma vontade clara de querer implementar esta mudança estratégica e também uma visão de longo prazo que oriente as decisões que estão a ser tomadas hoje", destaca.